quinta-feira, 31 de julho de 2008
quarta-feira, 30 de julho de 2008
O regresso de Pequim
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O Barreiro tem as suas anedotas. Umas com pernas, outras não. Mas a referência feita na postagem anterior a mais um monumento desaparecido leva a recordar esta historieta mesmo em blogue, para que fique.
Tudo começa quando um cidadão barreirense, daqueles que se reclamam de genuínos [1], decidiu, em plenos anos 60 do século passado, ir de comboio para Pequim [2]. Saiu de casa, tomou o autocarro que dizia "Av.Sapadores", apeou-se junto à muralha (com cuidado para não cair pelos intervalos ainda não "travados" a tubo de ferro [3]), entrou na estação, foi ao guiché e zás, eu queria um bilhete de segunda classe para Pequim.
O digno funcionário coçou a cabeça e respondeu logo, oh amigo, um bilhete para Pequim não temos. Tem de ir ao Rossio...
E o bom do homem foi para o Rossio, donde o mandaram para Santa Apolónia, sendo remetido para a Calçada do Duque e daí outra vez para Santa Apolónia, com a recomendação de tirar um bilhete para Paris e daí, via Moscovo, resolver o assunto candente do bilhete para Pequim.
Ultrapassando, de Anás para Caifás, todos os problemas logísticos, diplomáticos e políticos suscitados pela desejada viagem de comboio para Pequim, o ilustre barreirense chegou a QianMen, estação velha da capital da China, e, instalado na cidade, encontrou tempo para tratar devidamente de todos os assuntos que lá o tinham levado.
Recordando as complicadas peripécias da ida, punha-se-lhe agora a angustiante questão do regresso. Muito mais complicado certamente iria ser... e assim, preparado para explicar onde ficava o Barreiro, munido de um mapa da Europa e da ultima edição da carta de estradas do ACP, que levara consigo, pensou qual a melhor forma de, na China e em Chinês, abordar a questão, responder a todas as perguntas e explicar para onde, frente a Lisboa, em Portugal, na Europa queria exactamente viajar.
Tinha verificado, à chegada, que na enorme estação velha de Pequim havia imensos guichés, mas todos incaracterísticos. Arranhando Inglês, chegou-se a um dos atendimentos, ao acaso, e - timidamente - pediu "a second-class ticket to Barreiro!". Do outro lado, o bilheteiro chinês, limitou-se a profissional e secamente perguntar, sem sinais de qualquer hesitação: "Barreiro or Barreiro-A"?
Com o estacionicídio do Barreiro-A, esta anedota hoje já não tem sentido. Fica para a memória. [4]
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[2] Ainda se não escrevia Beijing e outras modernices.
[3] É que (não tem graça alguma!) consta que houve mesmo quedas - e com consequências graves.
[4] Com um especial cumprimento ao "Rip Kerby", que foi quem me contou esta!
terça-feira, 29 de julho de 2008
As flores do cobre... - 4
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Como já foi dito, a plantazinha floresce durante um curto período - pouco mais que duas semanas - e seguidamente (como mostra a fotografia) as pétalas ficam descoloridas e caem.
Conhecida em Portugal como "sapinho-roxo" ou "sapinho-roxo-das-areias", recolheu-se de pessoa nascida e criada em Santa Clara Nova, Almodovar a estranha denominação de "pernaranha" . Em Espanha conhecem-se as designações "arenaria roja", "hierba de la golondrina", "esparcilla encarnada", "rabaniza de los soseros" e "vermella", e na Catalunha "espergularia vermella", "herba vermella" e "herba pasarella".
Encerra-se assim este capítulo, mas não sem acrescentar um apontamento curioso. A postagem de 2 de Maio último concluía com as seguintes frases:
"Mas há ainda outros sítios... enquanto há. Depois ficará a memória, para a guardar. Nos anos 60/70 e até /80 formavam tapetes extensos p.ex. junto à estação ferroviária do Barreiro-A. Recordam-se disso?"
Pois bem: se a Spergularia purpurea, ainda que diminuída na área dos tapetes extensos e roxos que formava, irá certamente reflorescer para anunciar a próxima estação estival, a estação ferroviária do Barreiro-A já não terá a mesma sorte. Amostra do que aconteceria, e sem aviso, se fosse a Dona Refer a mandar também nas estações do ano?
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segunda-feira, 28 de julho de 2008
domingo, 27 de julho de 2008
Um "caso de direito galáctico" (texto de Mário-Henrique Leiria)
(Trig contra o dartiano)
Trig, globo pensante natural de Deneb-6, cultivador de cristais cantantes, apresentou-se rebolando excitadamente na sede do Comando da Polícia Judiciosa de Zintiol (Beta Lyra-3), cidade onde residia temporariamente traficando os famosos cristais do seu planeta. Abrindo um vacuolo vocal, apresentou queixa no seguinte teor:
- Fui roubado no mês que vem. Peço com insistência que não intervenham policialmente em tal assunto nem detenham o futuro ladrão que me roubou, caso contrário perderei toda a minha fortuna cristalina, que é exactamente o que já aconteceu.
Posta a queixa neste termos, convem esclarecer o estudante menos informado que os globos pensantes de Deneb-6 possuem a faculdade de «cuimar», isto é, de se deslocarem nas coordenadas paralelas espaço-temporais durante períodos progressivos e regressivos que podem atingir até 45 rotações denebianas periódicas, o que lhes permite viajar no passado e no futuro dentro da latitude abrangida por esse mesmo período de rotações (para mais informações consultar a Grande Enciclopédia Galática Universal, vol. 95.°, letra C, verbete «cuimação denebiana, A»).
Prosseguindo, Trig informou o inspector de serviço que um dartiano, cumprindo os seus deveres de cidadão de Dart (ver «Dart ou o conceito de Estado-Quadrilha» do prof. Granf-Rog), lhe deveria roubar no mês seguinte - mês de Zintiol, é evidente - um cristal cantante dos que se encontravam em exposição no seu estabelecimento alveolar. Mas nesse mês a vir, a Polícia Judiciosa interveio e deteve o latrocinador dartiano Trig nesse momento - o da detenção - cuimou duas rotações para o futuro e verificou que o roubo se tinha realmente dado. Portanto, tendo a polícia detido o gatuno e não permitindo o roubo, o passado tinha sido alterado arbitrariamente.
Em consequência, e como para não haver roubo no futuro isso só poderia acontecer se não existissem, no passado, os objectos roubados, todos os cristais cantantes de Trig tinham deixado de existir no momento em que a Polícia Judiciosa não permitira que os roubassem. Trig sentia-se tremendamente lesado e exigia que a mesma Polícia corrigisse legalmente a situação, caso contrário processaria o dartiano por roubo não efectuado, em aberta transgressão com as suas obrigações de cidadão de Dart.
Dito isto, apresentou a sua queixa registada em fono-papel contra o dartiano futuro não-ladrão e cuimou, desaparecendo da sede do Comando da Polícia Judiciosa de Zintiol.
A solução do caso, pela sua originalidade, embora tenha sido depois bastante discutida no foro da Comarca de Zintiol (Sector de Beta Lyra), proporcionou merecida promoção ao inspector Bromintignisestorig da Polícia Judiciosa. Tendo realmente que efectuar a prisão, sem a qual não teria havido queixa por parte de Trig, esperou o mês necessário até chegar a data indicada pelo cullivador de Deneb-6. No momento exacto em que o dartiano se apoderava do cristal cantante, uma brigada de homens-máquina de Adarta da Polícia Judiciosa deteve-o, como fora previsto. Logo após, o inspector Bromintignisestorig sacou do seu desintegrador e desintegrou «in loco» o dartiano e o cristal em seu poder, alegando resistência à autoridadc. O roubo dera-se, como indicava o futuro, mas tanto o objecto roubado como o roubador tinham desaparecido, tornando assim, como é óbvio, inoperante a alteração passado-presente. O paradoxo temporal fora anulado e os cristais cantantes que se encontravam no estabelecimento alveolar de Trig permaneceram inaiterados.
É evidente que Trig retirou a queixa, até porque já não havia contra quem.
De noro se pergunta ao estudante interessado e atento: Foi o método usado coerente com a casuística processual em vigor no Foro do Sector de Beta Lyra ou, como pretendem alguns juristas ortodoxos, houve perigosa alteração no processo espaço-temporal, sendo que a legalidade teria sido deixar a queixa contra o dartiano chegar às instâncias superiores? "
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sábado, 26 de julho de 2008
Uma Santa Bárbara grega (e minha)
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sexta-feira, 25 de julho de 2008
Gazetilha: ( Sul e Sueste)
O arquitecto que fez
A estufa da estação
Sem ter qualquer atenção
Ao calor que faz aqui
Devia, por punição,
Durante todo o Verão
Ser posto a viver ali!
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quinta-feira, 24 de julho de 2008
Reencontro - 1
quarta-feira, 23 de julho de 2008
Um alerta
Aqui próximo, e já em segundo caso, topei piscinas insufláveis em varandas! Tremendo perigo! Cada metro cúbico de água representa a carga duma tonelada! Os movimentos na piscina agravam essa situação pelas vibrações que criam e transmitem! E a impulsão de dentro da água da piscina pode permitir ultrapassar mais facilmente o peitoril da varanda! Aliás as varandas não foram feitas nem para "marquises" nem, sobretudo, para piscinas.
(Se passar novamente por qualquer dos locais referido, fotografarei a piscina respectiva. Mas o aviso fica, desde já e independentemente disso.)
terça-feira, 22 de julho de 2008
Blogue "Cientistas em tempo Real" e "Noite dos Investigadores 2008"
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"ASSUNTO: Blogue "Cientistas em Tempo Real"
A Equipa da "Noite dos Investigadores 2008
noiteinvestigadores08@igc.gulbenkian.pt"
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segunda-feira, 21 de julho de 2008
domingo, 20 de julho de 2008
sábado, 19 de julho de 2008
A carta de Eça de Queirós

Dois factores igualmente importantes para mim me levam a dirigir a V. Ex.ª estas humildes regras: o primeiro a tomada de Cuenca e as últimas vitórias das forças carlistas sobre as tropas republicanas, em Espanha; o segundo é a falta de água na minha cozinha e no meu quarto de banho.
Abundaram os carlistas e escassearam as águas, eis uma coincidência histórica que deve comover duplamente uma alma sobre a qual pesa, como na de V. Ex.ª, a responsabilidade da canalização e a do direito divino.
Se eu tiver a fortuna de exacerbar até às lágrimas a justa comoção de V. Ex.ª , que eu interponha o meu contador, Exmo. Senhor, que eu o interponha nas relações da sensibilidade de V. Ex.ª com o mundo externo! E que essas lágrimas benditas, de industrial e de político, caiam na minha banheira!
E, pago este tributo aos nossos afectos, falemos um pouco, se V. Ex.ª o permite, dos nossos contratos. Em virtude de um escrito, devidamente firmado por V. Ex.ª e por mim, temos nós – um para com o outro – certo número de direitos e encargos.
Eu obriguei-me para com V. Ex.ª a pagar a despesa de uma encanação o aluguer de um contador e o preço da água que consumisse. V. Ex.ª, pela sua parte, obrigou-se para comigo a fornecer-me a água do meu consumo. V. Ex.ª forneceria, eu pagava. Faltamos evidentemente à fé deste contrato: eu, se não pagar, V. Ex.ª, se não fornecer.
Se eu não pagar, V. Ex.ª faz isto: corta-me a canalização. Quando V. Ex.ª não fornecer, o que hei-de eu de fazer, Exmo. Senhor?
É evidente que, para que o nosso contrato não seja inteiramente leonino, eu preciso no caso análogo àquele em que V. Ex.ª me cortaria a mim a canalização, de cortar alguma coisa a V. Ex.ª... Oh! E hei-de cortar-lha!...
Eu não peço indemnização pela perda que estou sofrendo, eu não peço contas eu não peço explicações, eu chego a nem sequer pedir água! Não quero pôr a Companhia em dificuldades, não quero causar-lhe desgostos, nem prejuízos!
Quero apenas esta pequena desafronta, bem simples e bem razoável perante o direito e a justiça distributiva: quero cortar uma coisa a V. Ex.ª !
Rogo-lhe, Exmo. Senhor, a especial fineza de me dizer imediatamente, peremptoriamente, sem evasivas, nem tergiversações, qual é a coisa que, no mais santo uso do meu pleno direito, eu posso cortar a V. Ex.ª
Tenho a honra de ser
De V. Ex.ª
Com muita consideração e com umas tesouras
(a) Eça de Queirós”
sexta-feira, 18 de julho de 2008
Museus de Lisboa abertos à noite (de Verão)
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Mas alguma coisa felizmente sucede.
Quatro museus de Lisboa vão estar abertos às quintas-feiras até às 23h00 durante o Verão, com diversos eventos, no âmbito de um projecto-piloto do Instituto dos Museus e da Conservação (IMC).
Vem depois uma segunda frase, também muito útil, até porque indica os possíveis locais da operação e fornece o acesso por âncora (linque, dizem eles) ao site do IMC onde o programa vem detalhado (além de outros interessantes assuntos). Só que esta frase tem de ser lida habilmente, já que o "copie e cole" (cópi-peiste, dizem eles) fez das suas e colocou factos já passados, que nada têm a ver com este assunto. Aí vai:
O terceiro e quarto períodos são esclarecedores e não contém qualquer perturbação:
O projecto, designado "5.as à Noite nos Museus. Verão 2008", visa “oferecer nas noites de Verão, às quintas-feiras, de uma forma lúdica, descontraída e pedagógica outras vivências em espaços museológicos, através de actividades culturais diversificadas que visam atrair novos públicos, fidelizando os já existentes, mas também captar turistas em visita à cidade de Lisboa”, refere o IMC.
Durante os meses do Verão, o IMC oferece ainda a crianças e jovens um desconto de 50% na entrada dos museus.
Aos museus, pois!quinta-feira, 17 de julho de 2008
"Embuste" ou "embuste no embuste"? : a "fusão fria" [1]
Neste complexo período em que a "era dos combustíveis fósseis" (e limitados) oscila ao vento dos especuladores capitalistas (sejam quais forem as cores que arvoram) e em que a "guerra da energia" assume na realidade o papel que lhe é atribuído nos jogos informáticos, é por vezes altura de relembrar acontecimentos que marcaram experiências, abriram controvérsias, criaram dramas pessoais e caíram em situações verdadeiramente conflituais e ainda não sanadas no mundo científico.
Sem se entrara na "teoria da conspiração" tão no agrado dos nossos dias e que um video-documentário em 5 episódios patente no "youtube", em
(a ver com as reservas abaixo expressas) parece concentrar no título "The war against cold-fusion" (i.e. "A guerra contra a fusão-fria") poder-se-á dizer que tão badalado e vituperado assunto, que - parafraseando Langmuir - recebeu já o epíteto de "ciência patológica", não está de forma alguma morto. E isso prova-o o artigo "Cold Fusion" apresentado na "Wiki" em
Arriscando a consideração de "pestiferado" com que (uma parte d') o mundo científico parece atribuir aos que ousam sequer usar tão blasfemas palavras, ao ponto de os cientistas que mais recentemente sobre o fenómeno se debruçaram terem arranjado designações perifrásticas, relatarei muito sumariamente o que foi ou é isto: em 1989 dois cientistas séniores e de nomeada, professores universitários com um passado científico irrepreensível, anunciaram ao mundo, talvez cedo demais, terem feito na Universidade de Utah uma electrólise de água pesada numa célula aberta, ao ar livre, à pressão atmosférica, com eléctrodos de paládio. Nada de extraordinário nisto... salvo até informarem que a célula aqueceu demais, e bem demais, que o que seria de esperar. Voltas e mais voltas para explicar aquilo, os dois enunciaram uma teoria arrojada: ter-se-ia verificado a fusão de átomos de deutério (o isótopo do hidrogénio presente na água-pesada) como que à temperatura e ambiente de qualquer cozinha doméstica, reproduzindo na célula de vidro um processo algo similar ao das estrelas e que uma grande coorte de outros cientistas, com equipamentos pesadíssimos e complexos, em condições extremas, tentavam então e ainda tentam realizar pela chamada "fusão quente". O anúncio caiu como uma bomba: se não era ainda a descoberta da vida eterna, a porta da pedra filosofal ou o movimento perpétuo, tudo sonhos que o homem tem sempre acalentado lá muito no seu fundo de Prometeu-antes-de-agrilhoado, pelo menos era a descoberta da energia ao preço da uva mijona e adeus poços de petróleo, petroleiros, refinarias, minas de carvão, gasificações, centrais nucleares, poluições de qualquer tipo, gases de estufa, postes eléctricos de AT e BT e outras trampas que ensombram, directa ou indirectamente, a nossa vida diária. Imediatamente o anúncio de Pons e Fleischmann - tais os nomes dos dois cientistas - mostrou um enorme calcanhar de Aquiles: muitos dos ensaios efectuados apressadamente para a reprodução do fenómeno noutros (e muitos) locais do Globo não trouxeram confirmação da descoberta [4] e isso fez cair sobre aqueles dois até então reputados professores de Química uma série de acusações graves relativamente à sua própria idoneidade científica. Séculos atrás teriam sido certamente queimados em praça pública, e ninguém mais se chateava com aquilo, como esteve para suceder com Galileu e fez Copérnico esconder o que sabia para que só se divulgasse tudo depois de morto (Brahe era rico, dinamarquês e protestante e estava-se nas tintas para o fogueirame).
Outro ponto de ataque ao anúncio de Pons e Fleischmann foi a inconsistência (para muitos mas também não para todos) da interpretação proposta, relativamente aos conhecimentos então considerados firmes e adquiridos.
Desde aí o mundo dividiu-se e a polémica continua. Há quem diga ter duplicado a experiência descrita, há quem tenha enunciado novas teorias, há quem tenha registado patentes, mas há quem publicamente mantenha a tese da inviabilidade, há quem tenha abandonado cátedras e sido corrido de outras posições académicas, há quem defenda que o "pilim" está atrás disto tudo e que o possível progresso está pura e simplesmente travado e desejavelmente esquecido. Outros - os da inviabilidade - dizem que se persiste no sonho, que tudo são hipóteses míticas, que não é por aqui que se vai ao Eldorado. Finalmente há os que caem em cena com discursos políticos e religiosos que, como seria de esperar, não vêm desanuviar o ambiente (vide o caso da co-incineração, em que até juristas, autarcas, ecologistas e deputados mostram saber interpretar processos químicos e minimizam, com anunciadas razões, o parecer de uma comissão de "notáveis"... e ainda não chegamos ao segundo apito do comboio do nuclear, como veremos e ouviremos a breve trecho! [5] ). Ponto final.
Não defendo aqui nenhum ponto de vista, só por ser ponto de vista. Os conhecimentos de hoje certamente não são os conhecimentos de amanhã, as descobertas surgem de onde menos se espera (não é, Max Planck?) e tanto a apresentação como a rejeição de factos científicos e com tão elevados potenciais técnicos exigem, ambas, um grande critério e disciplina. Neste aspecto, o filme indicado parece-me ter os seus perigos. Para começar, não é novo (mas eu também continuo a gostar de ver o "Tudo o Vento Levou"); para continuar, infunde - pela sua exposição quase apologética - um sentido de acessibilidade expectante ao âmago do problema. Mas também, na outra face da moeda (quando inventarem moedas tetragonais eu quero ver como se dirá!), apresenta os muitos personagens do drama, desde a intervenção do presidente dos EUA (pai do actual, que certamente sugeriria a "fusão morna" para, entre "quente" e "fria" simplificar a questão) até aos "sim" e aos "não" a chamarem nomes (e dólares) uns aos outros.
Vale a pena estar atento ao assunto ou, pelo menos, seja ele embuste ou traga ele embuste no embuste, conhecê-lo. No filme cita-se a frase de Arthur C. Clarke: "Quando um distinto cientista sénior afirma que algo é possível, ele estará muito provavelmente certo; quando, porém, afirma que algo é impossível, ele corre o risco de poder estar errado." Ambas as afirmações estão correctas, ao abrir uma curial frincha-de-porta estatística para se poder verificar o contrário - mas uma coisa é absolutamente certa: se a experiência de Pons e Fleischmann se comprovasse, se na realidade existisse a "fusão fria", que grande volta que este mundo, em todos os seus povos e culturas, acabaria mesmo por dar. [6]
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[1] Não se confunda com o programa "ColdFusion" da Adobe (mas esta designação pode ter sido inspirada por aquela aspiração!)
[3] Em Português e pqrq demonstrar quão avisados estamos há uma pequena notícia de "fusão a frio" em
mas é também aconselhável visitar o local seguinte do Centro de Fusão da Universidade de Lisboa em que se explicam os processos de fusão em geral e as suas vantagens comuns e se dedicam as três ultimas linhas (uma e meia de facto) a um comentário algo condescendente sobre o processo da fusão fria.
Existe também uma digna firma de soldadura de tubos plásticos algures no distrito de Leiria, que até dá o número de telefone, mas não é disso que estamos a tratar.
[4] Mas outros, de início uma minoria, declararam logo ter obtido resultados similares - facto que se tem vindo a anunciar num sucessivo mas abafado "crescendo".
[5] Não obstante os "nuestros hermanos" já por aí andam há muito tempo e se houvesse algum azar naqueles "chismes" podem estar certos que teríamos por tabela todos os inconvenientes e sem quaisquer vantagens.
[6] Ou então verificar-se-á a pessimista citação brasileiro que fala em "valer dinheiro" e em "pobre nascer-sem" etc. mas que me abstenho de melhor explicitar aqui.
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quarta-feira, 16 de julho de 2008
terça-feira, 15 de julho de 2008
Uma conclusão excelente
Manuel António Pina brindou-me com uma outra conclusão excelente, no seu apontamento "Por Outras Palavras" do JN de ontem. Tendo sumariamente analisado, com a sua ironia habitual, o confronto das propostas duma oposição quando se torna governo (a que reciprocamente há que juntar o confronto das teses de um governo quando se torna oposição), fecha brilhantemente: "Pensando bem, deveria ser sempre a Oposição a formar Governo". Ou, para não ser tão radical, eu diria antes: "Deveria ser sempre a Oposição a escrever (e a defender) o programa do Governo". E olhem que, pensando bem, já houve disfarçadamente disso! Onde estará o Wally?
Ora isto ficaria por aqui, se não andassem por aí a aparecer acordes distintos duma mesma música celestial - que tem qualquer coisa a ver com o dito Wally. A primeira versão é a manifesta e sistemática recusa da política e dos políticos por parte de pseudo-apolíticos ou de políticos arrependidos a sonhar com a ribalta perdida e com afirmações que, noutras eras, marcaram o País. É o discurso de "os políticos são todos etc e tal" e de "a minha política é o trabalho", que, com passinhos de lã e umas benzeduras pelo meio conduz ao tal - e já aqui falado - "se soubesses o que custa mandar, gostarias de obedecer toda a vida" que andava em forma de cartaz e com assinatura do consagrado Autor pelas paredes de muitos liceus desta santa terrinha. A segunda versão é parecida, mas com um conteúdo mais febricitante: "há que dar lugar aos outros, aos que ainda não foram eleitos para um qualquer Governo". Para começar, não é rigorosamente verdade (ainda que alguns não tenham sido eleitos); para continuar, vem o argumento-chave do meu amigo Manel, que ao caso se aplica: "Se os gajos, de um lado ou de outro, são tão maus e a malta, ao fim de tantas bolas ao cesto, continua a votar neles e não em "vózes", então é porque continua a ver-vos como ainda piores que eles." Coisas da democracia...
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segunda-feira, 14 de julho de 2008
Edward Luttwak e... uma previsão feita em 1968
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A primeira observação, a pag. 44, insere-se no capítulo 2 da obra e é uma pequena referência, partilhada com a Espanha e, por outras razões, com o Vietnam do Sul e a Alemanha Oriental, que necessariamente demonstra, pelo concreto, que qualquer movimento eficaz tenha de decorrer na proximidade da sede do poder e nunca numa área deste afastada ou politicamente dependente:

Este critério leva o Autor a excluir as colónias portuguesas, espanholas e outras das áreas em que poderia ser provável um golpe local (pag. 45) - no que as alinha com os países de Leste (com algumas reservas premonitórias para a Polónia) e outros casos. Porém, mais adiante, já no capítulo 3, o "caso português" é amplamente desenvolvido, expondo-se mesmo a "situação das Forças Armadas Portuguesas em 1967" nos termos que seguem e que são desenvolvidos em três páginas (p. 68 a 70):
p.68:
p. 88
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[1] Como por exemplo "Alemanha Oriental", "Alemanha Ocidental", "Mongólia Exterior"
[2] Tradução tentativa dos textos apresentados como imagens:
p.44. (cap. 3 When is a Coup d’Etat Possible?)
As poucas colónias que restam, principalmente espanholas ou portuguesas, estão, obviamente, numa posição de dependência total. Aí também, como no Vietnam do Sul e na Alemanha Oriental, nenhum golpe [de Estado] poderá ter sucesso “in situ”, mas terá de ser conduzido em Lisboa ou em Madrid.
p.45
A aplicação destes critérios exclui muitos locais que, de outra forma, seriam potenciais alvos: (a) as colónias espanholas, portuguesas e outras; (b) a Alemanha Oriental, Hungria, Mongólia Exterior e, talvez, Polónia; (c) …
p.68. (cap. 3 The Strategy of the Coup d’État)
Quando tivermos definida a verdadeira dimensão operacional das várias formações [militares] do país em análise, poderemos passar à próxima fase, identificando quais as formações que têm capacidade para intervir – a favor ou contra o golpe. Seguiremos dois critérios principais: a natureza da unidade considerada e a localização dessa mesma unidade. Estes [critérios] são usados para o estudo do caso das forças armadas portuguesas.
As Forças Armadas Portuguesas: Situação em 1967
O presente regime em Portugal pode razoavelmente descrever-se como uma associação entre as classe dos grandes agrários, os interesses industriais e comerciais recém emergentes e a classe média burocrática (de onde provém os funcionários públicos e o nível do oficialato das forças armadas). Como em Espanha, a força aérea e a marinha contém elementos que são tradicionalmente menos conservadores que os oficiais do exército; como em Espanha, estes ramos mantém-se “emagrecidos” em efectivos e em recursos.
EXÉRCITO: Conta com um efectivo total de cerca de 120.000 homens (excluindo pessoal administrativo), com a seguinte distribuição:
(a) Uma divisão de infantaria, com alguns tanques médios, que é parcialmente usada como unidade de treino e que está por metade da sua capacidade teórica. Do número total de homens desta unidade, só 2000 têm qualquer transporte, fora o pequeno número equipado com blindados. Em qualquer momento, muitos dos militares terão sido recentemente incorporados, com treino e disciplina reduzidos.
Localização: centro de Portugal
(b) Uma divisão de infantaria: esta unidade está muito abaixo da sua força, com talvez 3000 homens com algum grau de preparação. É suficiente o transporte para talvez metade destes efectivos.
Localização: norte de Portugal
(c) Restante exército: o maior número de efectivos, cerca de 100 000, com o maior nível de preparação e o melhor equipamento, está distribuído pelos territórios africanos: Angola, Moçambique e Guiné.
MARINHA: Embora os portugueses tenham uma grande tradição naval e embora as “províncias” ultramarinas pudessem justificar uma maior marinha (que o programa de assistência militar dos Estados Unidos poderia ter parcialmente pago), foi mantida relativamente fraca pelas razões acima referidas: um destroier, catorze navios de combate mais pequenos, três submarinos e trinta e seis navios de outras classes. De maior interesse para nós: doze navios de apoio, quatro unidades de desembarque e meio batalhão de fuzileiros. Dada a distância das províncias africanas, mesmo que a marinha fosse particularmente leal ao regime, não poderia rapidamente trazer daí muitas tropas. Os fuzileiros costumam estar em águas distantes e, em qualquer caso, o seu número é pouco significativo.
FORÇA AÉREA: cerca de 14 000 homens. Está equipada com um conjunto de equipamento americano velho e italiano. Os seus 3 000 paraquedistas estão estacionados nas províncias africanas, enquanto a frota de transporte apenas seria capaz de trazer para Portugal cerca de 1 000 homens em cada 24 horas.
No caso português, portanto, embora com 150 000 homens nas forças armadas, apenas uma pequena fracção deste total se mostrará relevante em caso de um golpe. A sua maior parte estará impedida de fisicamente intervir na área de Lisboa devido à sua localização e à falta de adequado equipamento de transporte. Outros intervirão apenas de forma ineficaz, devido a preparação e a equipamento insuficientes. Assim, de todas as forças armadas, só três ou quatro batalhões (talvez 3 000 homens) teriam uma efectiva capacidade de intervenção. A pequena dimensão desta força reduz a capacidade de o golpe ser derrotado, mas também limita a potencial área de recrutamento.
Se a Força Aérea e a Marinha trouxessem para Portugal algumas das tropas estacionadas em África, nós [i.e. os autores do golpe] já seremos governo ao tempo da sua chegada e essas forças estarão, pois, sob as nossas ordens. Se então falhássemos em impor-lhes a nossa autoridade, então o golpe já teria falhado e a chegada destas não iria alterar a situação. A menos que, nesse caso, tivéssemos subvertido as tropas em África, o que representaria uma prática bem mais complicada de conduzir as coisas.
Esta análise demonstra o principal critério para definir as forças relevantes para um golpe, sejam militares ou não:
As forças relevantes para um golpe são as que, por razões de localização ou de equipamento, podem intervir no local da acção (geralmente na cidade capital) dentro do período de tempo de 12 a 24 horas que precede o estabelecimento do seu controle spbre a máquina governamental.
p.88
QUADRO 8.
Infiltração das Forças Armadas em Portugal (conceptual)
Total das Forças Armadas (Exército, Marinha e Força Aérea) 150 000
Intervenientes como participantes activos: 3 000
Neutralizados pela subversão de técnicos “chave” 12 000
Neutralizados por treino e equipamento impróprios 45 000
Neutralizados por localização
Angola 45 000
Moçambique 25 000
Guiné Portuguesa 20 000
Total 150 000
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domingo, 13 de julho de 2008
A SN1987A

Se se ampliar mais vê-se a estrutura anular à volta do que resta.
(Foto auto-identificada)
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sábado, 12 de julho de 2008
Uma prosa quase fantástica de um poeta que hoje faria 104 anos: Pablo Neruda [1]

"Um inventor de estrelas
Um homem dormia no quarto de um hotel em Paris. Como era noctívago convicto, não se admirem se lhes disser que era meio-dia e que o homem continuava a dormir.
Teve de acordar. A parede da esquerda caiu subitamente, demolida. Depois ruiu a da frente. Não se tratava de um bombardeamento. Pelas aberturas das ruínas entraram operários de grandes bigodes, com a picareta na mão, que apostrofavam o dorminhoco :
- Eh, lève-toi, bourgeois! Bebe um copo connosco!
Abriu-se o champanhe. Entrou um edil, com a fita tricolor ao peito. Soou uma fanfarra com os acordes d'A Marselhesa. Qual o motivo de factos tão estranhos? Acontecia que no subsolo do quarto daquele sonhador, precisamente, se situava o ponto de ligação de dois tramos do metro de Paris, naquela época em construção.
Desde o momento em que o protagonista da aventura me contou esta história, decidi ser seu amigo, ou, antes, seu adepto, ou seu discípulo. Como lhe aconteciam coisas tão estranhas e eu não queria perder nenhuma delas, segui-o através de vários países. Federico García Lorca tomou uma atitude semelhante à minha, cativado pela fantasia daquele fenómeno.
Federico e eu estávamos sentados na cervejaria dos Correios, ao lado da Cibeles madrilena, quando o dorminhoco de Paris irrompeu na reunião. Embora pomposo e rotundo na aparência, apareceu-nos descontrolado. Sucedera-lhe, mais uma vez, o inenarrável. Estava então instalado num modestíssimo esconderijo de Madrid e quis pôr em ordem os seus papéis musicais. Porque me esqueci de dizer que o nosso protagonista era um compositor mágico. E que aconteceu?
- Um carro parou à porta do meu hotel. Ouvi alguém subir as escadas, escutei atento os passos no quarto contíguo ao meu. Logo em seguida, o novo hóspede começou a roncar. A princípio era um sussurro. Depois fez estremecer o ambiente. Os armários, as paredes, moviam-se sob o impulso rítmico do grande ressonador.
Tratava-se, sem dúvida, de um animal selvagem. Quando os roncos se desataram numa imensa catarata, o nosso amigo já não teve qualquer dúvida: era o Javali Cornúpeto. Em outros países, o seu estrondo tinha abalado basílicas, obstruído estradas, enfurecido o mar. Que ia acontecer com este perigo planetário, com este monstro abominável que ameaça a paz da Europa?
Todos os dias ele contava novas peripécias espantosas do Javali Cornúpeto, a Federico, a mim, a Rafael Alberti, ao escultor Alberto, a Fulgencio Díaz Pastor, a Miguel Hernández. Todos o recebíamos ansiosos e nos despedíamos dele, anelantes.
Até que um dia chegou com o seu antigo riso globular. E disse:
- O pavoroso problema foi resolvido. O Graaf Zeppelin alemão aceitou transportar o Javali Cornúpeto. Vai deixá-lo cair na selva brasileira. As grandes árvores o alimentarão. Não há o perigo de beber o Amazonas de uma só vez: de lá continuará a atroar a Terra com os seus roncos terríveis.
Federico ouvia-o a estalar de riso, com os olhos cerrados pela emoção do cómico. Então o nosso amigo contou-nos um caso: quando quis mandar um telegrama, o telegrafista convenceu-o a nunca mais mandar telegramas, mas só cartas, porque as pessoas se assustam muito ao receber aquelas mensagens aladas e até havia quem morresse de enfarto antes de as abrir. Referiu-nos que, de outra vez em que assistiu, como curioso, a um leilão de cavalos puro sangue em Londres e levantou a mão para cumprimentar um amigo, o leiloeiro lhe adjudicou por dez mil libras uma égua que o Aga Cão tinha puxado até nove mil e quinhentas.
-Tive de levar a égua comigo para o hotel e devolvê-la no dia seguinte - concluía.
Agora, o efabulador já não pode contar a história do Javali Cornúpeto, nem nenhuma outra. Morreu aqui, no Chile. Este chileno orbital, músico escancarado, esbanjador de histórias inigualáveis, chamou-se em vida Acario Cotapos. Coube-me falar no funeral deste homem insepultável. Disse apenas: «Entregamos hoje às sombras um ser resplandecente que todos os dias nos oferecia uma estrela.»" [2]
in "Confesso que Vivi - Memórias", 2ª ed.,
trad. de Arsénio Mota
Ed. Europa América, Lisboa, 1979,
pp.267 e 268
[2] Sobre o também notável vulto da cultura chilena que foi Acario Cotapos, merecedor da memória de Neruda acima transcrita, ver o artigo que lhe é dedicado em http://www.memoriachilena.cl/temas/index.asp?id_ut=acariocotapos(1889-1969). Muito, mesmo,se aprende na "net"!
sexta-feira, 11 de julho de 2008
quinta-feira, 10 de julho de 2008
A zona ribeirinha do Tejo da Península de Setúbal, na descrição de Link; a "mina de azougue" de Coina
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Pois a tal contra-capa diz o que, com a devida vénia, seguidamente se transcreve:
Não se vai arrastar por muito mais tempo a análise de referências específicas de Link. Por razões meramente pessoais (nada faccioso sou!) voltei-me especialmente para as referências, aliás elogiosas, ao Porto, Vila Nova e Gaia (separando correctamente as duas povoações) e igualmente para os aspectos descritivos que se ligam à Península de Setúbal. São estes últimos os que referirei, e apenas em parte: Link refere-se à zona ribeirinha do Tejo no capítulo XXI ("Arredores de Lisboa, Queluz, a Residência Real"), pp.143 e 144 da edição portuguesa, e à zona sul da Península, com um certo desenvolvimento, no capítulo XXIII ("Viagem a Setúbal, Alcácer do Sal e Grândola. Descrição da Serra da Arrábida. Setúbal"), pp.153 a 161, ambos do designado "Volume I" da sua obra original - fixando-me eu apenas na primeira descrição. Existem outras referências pontuais de interesse, que serão apontadas pela utilidade que possam ter para a descrição que se pretende - e um dos tais "desconfortos" com autoridades locais, verificado em Sesimbra, é descrito na parte final do capítulo X do "Volume 2" ("Da Serra da Estrela a Lisboa. A Justiça Portuguesa"), a pp. 247 e 248.
O que nos diz, pois, Link sobre a frente ribeirinha sul do Tejo [destacando-se intencionalmente a negrita uma parte da descrição, que assim não está no original]?
Barcos postais partem diariamente para a Aldeia Galega, Moita, Coina, Cacilhas e Porto Brandão, nos quais se pode fazer a travessia por uma bagatela. A travessia do rio é aliás muito perigosa quando há ventos fortes pois a corrente é muito impetuosa e a incúria dos barqueiros extraordinariamente grande. As desgraças não são de modo nenhum raras. Em Novembro de 1798, numa manhã de tempestade, uma barca de Santarém com 40 pessoas a bordo foi embater nas amarras de um navio, voltou-se e de toda aquela gente só se salvaram quatro pessoas. Apenas os grandes desastres são conhecidos do público, os mais pequenos não se repara neles porque a vida de um português é um pormenor insignificante.
A margem norte do rio ... "
Dir-se-á ainda que a mina de mercúrio de Coina interessou vivamente Link. Volta a referir-se a ela na pag.234 da tradução portuguesa, no cap. IX ("Viagem à serra da Estrela. Descrição desta serra") ao escrever:
"Em vez da feira [de Viseu], menciona-se normalmente nos livros estatísticos as minas de estanho de Viseu. Ficámos aqui para examinar este interessante assunto. O Corregedor disse-nos que nada iríamos encontrar e que no entanto ouvira que outrora tinha havido umas minas. Por fim conseguimos um guia que nos levasse às minas abandonadas, mas vimos apenas que tinham sondado à procura de água. Ele indagou então junto de muitas pessoas idosas uma das quais nos levou a um sítio chamado Buraco de estanho. Mas aqui também não vimos quaisquer vestígios de estanho, Andamos por ali todo o dia em vão. O planalto compõe-se de granito que de facto tinha vestígios de minério, mas só de pirite arsénica. Tenho aqui, a propósito, de observar que em Portugal não é explorada absolutamente nenhuma mina, com a excepção da prospecção de mercúrio perto de Coina e da extracção de carvão mineral perto da Figueira, que no entanto nem sequer podem ser consideradas minas. É severamente proibido procurar minérios, também tivemos para isso uma autorização especial nos nossos passaportes, porque senão não poderíamos ter procurado minerais. Quero por isso sinceramente aconselhar todos os negociantes de minerais a não vir para Portugal, porque senão poderiam cair nas mãos da justiça portuguesa, com a qual adiante se travará conhecimento." [Destaque a negrita intencionalmente adicionado].
e, mais adiante, num "Segundo Apêndice" a pag. 297:
"Disse que não existiam minas em Portugal, com excepção daquela que se começou a construir em Coina, para extracção de mercúrio. Entretanto está também agora em actividade uma exploração de ferro em Mós, na província de Trás-os-Montes. [3] Esta província é rica em minério. Vi quantidades consideráveis de galena de Mogadouro e o minério de ferro encontra-se em muitos locais. O director das minas é um biscainho e parece ter uma cabeça brilhante. Além disso trabalha o ferro à maneira biscainha. Como não estive no local, não posso dizer mais que isto de acordo com cartas de Portugal." [Novo destaque adicionado]
No restante, a obra de Link, relativamente à região considerada, refere ainda uma segunda passagem pela Moita (pp.249) e, dentro da temática dos recursos minerais, menciona o carvão mineral procurado no Calhariz (p.155), encontrado nos cumes perto de Sesimbra (p.155) e também no Cabo Espichel (pp. 156 e 193), que se dá como semelhante ao existente entre Buarcos e Figueira [i.e. na área Cabo Mondego], pp.193.
De toda esta descrição fica "pendente" a questão da "mina de mercúrio de Coina". Quem a agarra?
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[1] Quanto à Real Fábrica de Vidro de Coina, existe a excelente obra de Jorge Custódio, editada pela Câmara Municipal do Barreiro e que pode ser adquirida nas Reservas Museológicas dessa Câmara. Muito se aconselha. Aliás neste blogue fez-se já referência a essa obra e ao "descalabro da Real Fábrica de Coina", em 11 postagens sucessivas colocadas em Junho de 2006.
[2] Outra matéria prima natural para a produção de vidro era a "barrilha", planta portadora de alcalis que se desenvolve na orla marítima, onde cresce bravia. Link admira-se com o facto de não ser cultivada em Portugal, em contraste com o que sucedia em Espabha (pag.158).
[3] Muito provavelmente Mós, actual freguesia de Torre de Moncorvo.
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