sexta-feira, 31 de março de 2006

"Nacional" perto de ser comprada por espanhóis

(Título na pag. P4 do "Diário Económico" de hoje!)
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Proposta de adaptação de "slogan", caso se concretize o "perto":
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"Lo que es Nacional es bueno!"
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quinta-feira, 30 de março de 2006

Como postar uma tabela (ou um documento Word) ...

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Segundo parece e a experiência o diz, o "Blogger" não simpatiza com tabelas. A solução é, pois, postá-las como imagens! Para isso convém saber, por exemplo, como se passa de um documento Word a uma imagem postável. O itinerário é o seguinte!
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1. Fazer a tabela (ou o documento) em Word e salvar. Temos, assim, um documento Word!
2. Colocando o indicador do rato sobre o documento Word, carregar no "Print Screen" (que está no teclado)
3. Procurar agora o "Paint" nos programas e abri-lo.
4. Carregar em Control + V. O documento deve aparecer (já como imagem)
5. Salvar o documento como imagem.
6. Abrir a imagem com... o Microsoft Office Picture Manager.
7. Com as ferramentas desse programa, ajustar margens e dimensões, etc. Salvar a imagem ajustada de acordo com as instruções do programa.
8. A gravura está pronta para ser blogada!
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Não se pretende que esta seja a única forma de se obter o efeito nem sequer se ensaiaram outras. Os programas envolvidos podem também ser diferentes. Mas a verdade é que esta dá!
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Certo?

História breve do reencontro do "Prelúdio"

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Je ne vous dirai pas, changez de caractère ;
Car on n'en change point, je ne le sais que trop ;
Chassez le naturel, il revient au galop.
(Le Glorieux, p.385, in Le Théâtre Choisi du XVIIIe siècle,
tome 1, Librairie Garnier Frères) Philippe Néricault dit
Destouches 1680-1754
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A primeira vez que ouvi o "Chassez le naturel, il revient au galop", foi precisamente ao professor-orientador do "nosso jornal", Dr. Cruz Malpique, nas suas aulas de Filosofia. Passaram-se anos e, no fundo, é bom relembrar essa citação (quem se recorda da também força simbólica que a expressão "Splendor in the Grass" de William Wordswoth e o poema em que está presente têm no desenrolar do excelente homónimo filme de Elia Kazan, de 1961, dado entre nós como "Esplendor na relva"? [1]), é bom saber que muito da nossa natureza teimosamente permanece e que, no reencontro com o passado, rebenta vigorosamente o verde das folhas surgidas na estaca que, espetada na terra para servir de guia, se teria pensado estar morta.
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De certo modo, foi o que sucedeu relativamente ao Prelúdio, o jornal dos alunos do Liceu de Alexandre Herculano, do Porto, cujo primeiro número "saiu" a 31 de Janeiro de 1953. E será interessante fazer a cronologia de factos recentes relativos a esse jornal, porque há coincidências tão clamorosas que até parecem não o serem e sucessões de factos que trazem novamente a memória, não num ciciar macio mas em verdadeiros gritos que reclamam o reconhecimento da sua presença e da sua forma de viver revivendo. Como a estaca guia que se julgava morta mas que aspira a ser árvore e acaba mesmo por o ser. O açude não mata a corrente, apenas a retém.
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Em Dezembro do ano passado, na Biblioteca Municipal de Arouca, onde eu procurava coisas bem diferentes, um pormenor de circunstância veio recordar-me o Prelúdio e as condições em que tinha nascido. A noção subjacente de que o Centenário do "nosso Liceu" decorria pode ter influenciado o sentir desse pormenor.
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Regressado ao Barreiro, procurei o Prelúdio na "net" e, joeirando entre uma multidão de informações musicais e filosóficas, fui conduzido a duas referências importantes, que se citam por ordem cronológica: a) o relato do José Pacheco Pereira sobre vicissitudes sofridas quando director do dito, na 2ª série do mesmo, como consta do do blog "Abrupto"[2] de 7 de Julho de 2003; b) a referência de AEF (que eu deduzi ser Ângelo E. Ferreira) no blog "Pantalassa" [3] ao mesmo dito Prelúdio, postada a 14 de Dezembro de 2005 com reprodução do cabeçalho do número 1, a indicação de que aquele achado pertencia ao Pai do Eng. Miguel de Oliveira, um interventor no mesmo blog, e prometendo divulgar mais.
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E mais AEF divulgou! A 20 de Dezembro, cumprindo o prometido, trazia para o referido blog Pantalassa dois poemas retirados desse número 1 - o que me levou a escrever algo sobre a fundação do jornal, como aqui deste blog consta em postagem de 14 de Fevereiro de 2006. Declarava aí eu não ter ficado com nenhuma das minhas prosas de menino e moço, incluindo um número sequer do referido Prelúdio. E não mentia!
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E tudo ficaria por aqui se...
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... se não fossem as tais "casualidades".
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Algures na semana de 13 a 18 de Março, o meu colega "alexandrino" Eduardo David telefonou-me, referindo-me dispor de uma 1ª série completa do Prelúdio, 14 números, cedido pelo também "alexandrino" Delfim Moura. Combinamos para o dia 22 um almoço, no "Napolitano", rua de S.Paulo, Lisboa, para examinarmos "o material". E assim fizemos, trocando também longas impressões e dando e recebendo notícias, boas e más. Constatamos haver já demasiados ausentes-mesmo e muitos outros de paradeiro desconhecido. Coisas da vida! Mas o texto estava ali... e era altura de o reproduzir por forma a permitir o seu mais alargado (re)conhecimento e inclusive o seu trabalho, tendo em conta que o estado dos originais não se compadeceria com um manuseamento prolongado e frequente. Tratei eu disso, em redução a 82% para compatibilizar a página com o formato A4.
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Essa útil "recuperação" permitiu-me, a 24 de Março e como comentário à ultima postagem de anterior série do Pantalassa [3], datada de 21 de Março, estabelecer contacto com AEF, informar da minha blogada de 14 de Fevereiro e referir a informação entretanto obtida. AEF respondeu rapidamente, através do novo Pantalassa, a 24 de Março, com também intervenção (em comentário) do Eng. Miguel de Oliveira, e adopção da ideia de obtermos a 2ª série, i.e. a de que José Pacheco Pereira foi director.
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Traçando a seguinte tabela [4] dos "corpos sociais" da primeira série do Prelúdio, abrindo o dossier finalmente construído e viajando um pouco no tempo e na memória, concluo o seguinte:
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O "episódio macabro" do conflito com a reitor (Dr. Francisco Sena Esteves) e com o que, mais até que a própria reitoria, representava na docência do LAH a situação política então vigente (abreviadamente "a situação") e tinha o Prelúdio e, por tabela, a reitoria debaixo de olho - episódio que mencionei "en passant" na nota 5 da minha postagem de 14 de Fevereiro -, sucedeu logo no nº 2 do jornal, através do artigo de 1ª página "Um menino pequenino fala do Cinema - O que penso da proibição da entrada de menores nas salas de espectáculo" que censurava uma legislação muito recente e que, por muito restritiva, até veio a determinar uma nota oficiosa da presidência do conselho.
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Era de facto melindroso para o professor orientador (calculo o que lhe terá cabido de chatice... mas a verdade é que não nos fez qualquer censura nem deixou transparecer qualquer azedume) e para o próprio reitor o facto de, num órgão liceal obrigatoriamente tutelado pela Mocidade Portuguesa nos termos da lei, sair um texto que nos jornais diários levaria certamente o lápis azul da censura! Por isso ouvimos um furioso raspanete do próprio reitor (nem o professor-orientador, nem o director de ciclo, nem o chefe do Centro da M.P. estavam presentes), fomos ameaçados de penas disciplinares raiando a expulsão e, liminarmente, do encerramento do jornal e sujeitos, dali em diante, a diversas atitudes que me ensinaram muito, nomeadamente em termos de exercício do poder por uns (eles), e de "registo escondido" por outros (nós).
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Atendendo a que o jornal nunca encerraria no 3º número, pois seria demasiada "bronca" que ultrapassaria os muros do Liceu, mas que poderia sair por mãos de outros (e certamente que os havia), decidimos prosseguir e "limitar avarias". Houve, no entanto, três consequências que são visíveis e que me vieram à memória: a "Entrevista com o Sr. Reitor do Liceu - O Cinema e a Miudagem" que saiu no nº 3, que nunca como entrevista foi feita e nos foi entregue imposta e dactilografada [5], a própria discursata laudatória do aniversário [6] do Presidente do Conselho no jornal nº 5 (era para ter saído no nº 4, basta ver as datas, mas houve "razões técnicas" à Jim Scott que o impediram) e o reforço do grupo de redactores logo no nº 3 (que em nada nos afectou, pois o quarto elemento então acrescido foi sempre um excelente colega, que ao nascimento do Prelúdio dera continuado apoio e em cuja designação há que ver, sob um aparente processo adicional de controle, uma hábil protecção de facto aos três ameaçados redactores [7]). Uma outra consequência, com a fleugma, a autoridade e um toque de saber "malpiquiano", pode ser encontrada [8] no excerto da biografia de Kant que o professor-orientador incluiu nas pags. 4 e 5 do "martelado" Prelúdio nº 3 sob a epígrafe: "... Mas o que eu nunca direi é aquilo que não penso" - Uma biografia de Kant".
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Passada a tormenta, o Prelúdio aguentou 10 números na mão do grupo inicial, contentor de "os fundadores". Quando saímos do Liceu, entrou afinal uma direcção bastante forte, mas que não passou do número 14. A nossa má experiência (renovada aliás no 7º ano com o "clube de cinema" e a carta ao Senhor Reitor de um zeloso papá que achava termos uma certa queda para o neo-realismo italiano, queda que eu confesso ainda ter) leva a crer que o Prelúdio, já com uma orientação não inteiramente igual e na medida em que o próprio regime se ia azedando no tempo, possa aí ter morrido de "morte macaca" e quase que apostaria que o artigo sobre a Françoise Sagan e o "Bonjour Tristesse" no número 14 se não a motivou, pelo menos pode ter "ajudado à festa". Seria interessante tirar isso a limpo, com os redactores da época. Fica mais um bocadinho de história e também essa sugestão!
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Há certamente outras coisas a lembrar e apreciações a fazer. Outros que venham! Graças ao Pantalassa e aos colegas que propiciaram a colecção (o Delfim e o David, como acima referido), temos matéria para mais estudo e mais revisitante memória. Ainda bem!

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Notas:
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[1]Que eu gostosamente transcrevo no poema original de William Wordsworth, lembrando-o também à minha filha Leonor Miguel que gosta tanto desse filme (e desse poema) como eu:
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"What though the radiance which was once so bright
Be now for ever taken from my sight,
Though nothing can bring back the hour
Of splendour in the grass, of glory in the flower;
We will grieve not, rather find
Strength in what remains behind;
In the primal sympathy
Which having been must ever be;
In the soothing thoughts that spring
Out of human suffering;
In the faith that looks through death,
In years that bring the philosophic mind."
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[2] http://www.abrupto.blogspot.com , um exemplo excepcional de qualidade e verdadeiramente um blog de referência em Portugal. O Autor do mesmo sabe-o e demonstra ostentosamente que o sabe.
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[3] Ainda acessível através de http://www.purprazer.blogger.com.br . A verdade é que essa série do Pantalassa encerrou entretanto e iniciou-se uma nova série, que pode ser obtida por "link" (porque raio não dizemos "gancho", que é tão expressivo?) a partir deste blog. E dessa série um outro gancho (estão a ver como resulta?!), na área "Paleontologia", leva mesmo lá! Mas para quem queira ir directo, aqui fica o próprio endereço do novo Pantalassa que também tem gancho neste blog: http://www.pantalassa3.blogspot.com
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[4] Notarão que é a primeira tabela que publico neste blog. Sabendo que o blog "não gosta de tabelas" há que as introduzir como imagens. Na postagem seguinte, ainda deste dia, eu explicarei como se faz - até em atenção a outros blogs amigos que lutam para vencer idêntica necessidade. A seu tempo falaremos de mais coisas importantes e cuja solução ainda busco, como por exemplo a gravação ou "backup" funcional de um blog.
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[5] Muitos anos depois e com a democracia já rodada, em Portugal, assisti por puro acaso a uma cena idêntica, que ainda hoje me afasta da leitura de um determinado periódico. Certos hábitos perduram...
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[6] Aniversário da assunção das primeiras funções governativas, como ministro das Finanças, a 27 de Abril de 1928, véspera aliás do seu aniversário (28 de Abril) - dia em que toma posse e brinda o País com um discurso bastante esclarecedor do seu pensamento:
"[...] Sei muito bem o que quero e para onde vou, mas não se me exija que chegue ao fim em poucos meses. [...] No mais, que o país estude, represente, reclame, discuta, mas que obedeça quando se chegar à altura de mandar. [...]"
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[7] Poderei explicar mais esta leitura, que até tem consigo algo de bíblico (Jacob / Isaac). E lembrar um outro poema que se perdeu, de título "Ó Sena, põe-te à frente!" que celebrava uma questão das chamadas "guerras pílicas" com o então professor de FQ, o Dr. Luís Gonçalves da Silva, e em que a turma A toda acabou sequestrada na sala do cinema. Por isso, para mim, "engagé" no processo e apreciados os personagens à distância no contexto da época (o que leva aos visíveis e aos invisíveis), esta é uma interpretação contra a corrente, mas surpreendentemente possível - pelo que não a excluo.
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[8] Se não foi assim, pelo menos pareceu ser!

quarta-feira, 29 de março de 2006

"Baghdad Burning"

Na pag 62 do meu "velho companheiro" das manhãs, o JN, de hoje, encontro uma notícia que. com a devida vénia, reproduzo. Diz ela, a notícia:
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"Blog iraquiano entre nomeados para prémio
Um blog iraquiano encontra-se entre os 19 nomeados para o prémio Samuel Johnson, para não-ficção, atribuído anualmente pela BBC. Esta é a primeira vez que uma publicação em suporte informático do género é candidata ao prémio e concorre com obras literárias sobre a Guerra Fria e William Shakespeare, entre outros.
Uma outra particularidade sobre a nomeação prende-se com o facto de o blog "Baghdad Burning" ser escrito (em inglês) por uma mulher que se identifica como "Riverbend", que desde 2003 descreve a história do país.
"Sou mulher, iraquiana e tenho 24 anos. Sobrevivi à guerra. É tudo o que precisam de saber. Aliás, é a única coisa que importa hoje em dia", pode ler-se na primeira entrada, citada por "El Mundo".
Fim de transcrição.
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Visitei o blog. Gostei (pela adição do real que faz ao que nos chega longínquo e depurado e certamente diluido entre outras coisas do mundo) ao ponto de o colocar entre as minhas "ligações", como se pode ver. Mas, para quem quiser ir lá no original, aqui fica o "endereço":
http://riverbend.blogspot.com
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terça-feira, 28 de março de 2006

O que dá por em causa axiomas (2)


Max Planck, físico alemão (1858-1947)
criador (em 1900) da física quântica
ou sacador do "non" na frase de Leibnitz que assim ficou a ser
"Natura facit saltus!"


segunda-feira, 27 de março de 2006

O que dá por em causa axiomas (1)


Nicolai Ivanovitch Lobatchevski (1792-1856),
matemático russo:
construiu uma geometria não-euclidiana.

domingo, 26 de março de 2006

Força de adjectivo

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É útil recordar que, numa contenda eleitoral entre duas listas para um orgão colegial impar, uma vitória, nem que seja por um voto, dá sempre lugar... a uma maioria absoluta!
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Subir para cima e descer para baixo são expressões do mesmo estilo. Mas há quem goste!

sábado, 25 de março de 2006

Um cartaz da 2ª GG

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Rosie, a rebitadeira ("Rosie, the riveter")

sexta-feira, 24 de março de 2006

Pensamento mural no Paris 2006

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Nous n'aurons que ce que nous saurons prendre!
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(Só teremos o que soubermos conquistar!)
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(citação em Francês na capa do "Courrier International" de hoje)

quinta-feira, 23 de março de 2006

A "Arte da Prudência" nº 145 (cantiga de maldizer)

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Em 1647 e em Huesca, na oficina de Juan Nogués, Baltasar Gracián (Belmonte, 1601 - Tarazona, 1658) publicou um pequeno livro com o título original "Oraculo manual y arte de prudencia" que as Edições "Temas da Actualidade" publicaram em tradução portuguesa, com o título acima, em 1994. Contém a obra 300 pequenos textos cheios de sageza e que poderão, sem problema, ser transpostos para a nossa vida actual em que uma geral baralhação nos ocupa tempo e quase que justifica uma pergunta "à la Marcuse" que vem dos anos 60: "Produtividade para quê?". Ou então, como a do aldeão que viu a mulher de lábios pintados [1], "se é para sermos mais felizes, por que é que não somos?"
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Registando agora o exemplo de um senhorito que esconde todos os seus males e doenças e que nos cada vez mais curtos intervalos entre escondidas mas sucessivas visitas aos médicos vai afirmando, ufano, ter "uma saúde de ferro" e não precisar da medicina para o que quer que seja, encontro no pensamento 145 exactamente uma razão também recôndita para isso!
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"Não mostrar o dedo doente, pois receberá todas as pancadas.
Não devemos queixar-nos dele, porque a malícia fere sempre onde mais dói, na parte mais débil. Não servirá de nada aborrecer-se, mas sim estimular a distracção alheia. A má intenção vai procurando o pretexto para fazer que te reveles: lança insinuações para encontrar o lado débil e fará a prova de mil maneiras até atingir o âmago. O prudente nunca se dará por achado nem revelará o seu mal, pessoal ou herdado, pois até a Fortuna às vezes desfruta ferindo onde mais dói, na carne viva. Por isso não se deve revelar nem aquilo que mais mortifica, nem o que mais vivifica; o primeiro para que acabe e o segundo para que dure."
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Concluindo: com aquele evidente esconder-se por detrás de uma fleugma escandinava que lhe adveio de um tetravô húngaro (como ele diz!) [2], o tal parceiro é mesmo um "sabido".
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De qualquer forma, ludicando para quem não gosta de ludicar, fica aqui a sugestão para uma leitura que se quer grão a grão (para que não chateie, como usam chatear todas as leituras morais) mas interessante.
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[1] Para os poucos que ainda não conheçam o chiste: e então diz ele à mulher: Eh, Maria, para que esborratastes a boca? Oh homem, é para ficar mais bonita! Ai é, e atão por que é que não ficas?
[2] Não sabemos se de Buda, se de peste.

quarta-feira, 22 de março de 2006

Santa Bárbara (a um pedido sobre "atributos da Santa"):

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Aqui está: a torre (com 3 janelas), a espada, o cálice com a hóstia. Faltam o livro, a palma do martírio (mas temos de concordar que a Santa não poderia segurar tudo) e, por vezes, os raios de uma trovoada ao longe.

terça-feira, 21 de março de 2006

21 de Março: Dia da Poesia

CANTIGA, PARTINDO-SE

Senhora partem tam tristes
meus olhos por vós, meu bem,
que nunca tam tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.

Tam tristes, tam saudosos,
tam doentes da partida,
tam cansados, tam chorosos
da morte mais desejosos
cem mil vezes que da vida.

Partem tam tristes os tristes
tam fora d'esperar bem,
que nunca tam tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.

João Roiz de Castel-Branco (sec. XV),
em Cancioneiro Geral, III, 134

segunda-feira, 20 de março de 2006

Ditado simples & fácil de lembrar:


"Espera-se... lá!"

domingo, 19 de março de 2006

August Macke - A chapelaria (1914)

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August Macke (1887-1914) - A Chapelaria, óleo sobre tela, 1914

"[...] A 8 de Agosto de 1914. Macke foi chamado para cumprir o serviço militar. A 20 de Setembro, recebeu a «Cruz de Ferro» como oficial-cadete. Durante a madrugada de 26 de Setembro, foi morto em combate a sul da aldeia de Perthes-les-Hurles, em Champagne. Tinha vinte e sete anos. Foi sepultado juntamente com outros camaradas num cemitério militar, em Souain. Por baixo de muitos nomes desconhecidos, gravados no monumento aos mortos de guerra, encontramos estas simples palavras:

«(...) 26.9.1914 Macke August Feldwebelleutnant (...) »

[...] O seu trabalho ficou por acabar. A interrupção abrupta do seu desenvolvimento deixou a sua promessa por cumprir. E, todavia, existe algo de típico no destino de Macke. A sua obra inacabada é sintomática de uma arte do sec. XX que o próprio Macke ajudou a criar. Existe, de facto, uma tendência inerente para o fragmentário na arte do sec. XX, uma tendência a que não são estranhas duas guerras mundiais! É uma arte destinada a encontrar a sua perfeição máxima naquilo que permanece inacabado."

Anna Meseure, "August Macke 1887-1914", Taschen/Público, 2004, pp.92-93

sábado, 18 de março de 2006

Blaise Cendrars: Posfácio à "Prose du Transibérien"

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Pouco se fala hoje deste suíço de Chaux-de Fonds, nascido em 1887 como Fréderic-Louis Sausser, mas que, sob o pseudónimo de Blaise Cendrars, se tornaria um dos autores de referência da literatura francesa. Com uma vida tumultuosa, cidadão do mundo e corredor de continentes, morre em Paris, que tanto amou, em 1961. A sua última palavra terá sido "Construire..."

Da sua obra poética a Assírio & Alvim editou, sem data, mas com introdução marcada de Fevereiro de 1974, a obra "Poesia em Viagem" que reune, em versão bilingue com tradução de Liberto Cruz, a "Prose du Transibérien (...)" e ainda "Les Paques à New-York" e "Le Panama ou les Aventures de Mes Sept Oncles". O volume encontra-se ainda por aí, em saldos de fundos de edição, a um preço surpreendentemente módico. Insta-se quem isto leia a, se encontrar um exemplar, lhe dar devido abrigo. Eu já abriguei vários, um na minha estante e outros nas estantes de bons amigos (que tiveram a sorte de estar perto ou de aniversariar cerca do achamento) - pois é um livro que se dá a quem também se dá uma garrafa escolhida de Porto Velho. Vale bem esse cuidado, quer com bons livros, quer com uma garrafa de velho Porto, quer, sobretudo, com bons amigos - preciosidades estas cada vez mais estimáveis em apreço e inestimáveis em valor!

sexta-feira, 17 de março de 2006

Blaise Cendrars: Prose du Transsibérien et de la petite Jeanne de France (5/5)

(conclusão)

À Tchita nous eûmes quelques jours de répit
Arrêt de cinq jours vu l'encombrement de la voie
Nous le passâmes chez Monsieur Iankéléwitch
qui voulait me donner sa fille unique en mariage
Puis le train repartit.
Maintenant c'était moi qui avais pris place au piano
et j'avais mal aux dents
Je revois quand je veux cet intérieur si calme
le magasin du Père et les yeux de sa fille
qui venait le soir dans mon lit
Moussorgsky
Et les lieder de Hugo Wolf
Et les sables du Gobi
Et à Khaïlar une caravane de chameaux blancs
Je crois bien que j'étais ivre
durant plus de cinq cents kilomètres
mais j'étais au piano et c'est tout ce que je vis
Quand on voyage on devrait fermer les yeux
Dormir
J'aurais tant voulu dormir
Je reconnais tous les pays les yeux fermés à leur odeur
et je reconnais tous les trains au bruit qu'il font
Les trains d' Europe sont à quatre temps
tandis que ceux d' Asie sont à cinq ou sept temps
D'autres vont en sourdine sont des berceuses
et il y en a qui dans le bruit monotone des roues
me rappellent la prose lourde de Maeterlinck
J'ai déchiffré tous les textes confus des roues
et j'ai rassemblé les éléments épars d'une violente beauté
Que je possède
Et qui me force.

Tsitsika et Kharbine
Je ne vais pas plus loin
C'est la dernière station
Je débarquai à Kharbine comme on venait de mettre
le feu au bureau de la Croix - Rouge.



O Paris
Grand foyer chaleureux avec les tisons entrecroisés
de tes rues et tes vieilles maisons
qui se penchent au-dessus et se réchauffent
Comme des aïeules
Et voici des affiches, du rouge du vert

Multicolores comme mon passé bref
Du jaune
Jaune

La fièvre couleur des romans de la France à l'étranger.
J'aime me frotter dans les grandes villes
aux autobus en marche
Ceux de la ligne Saint Germain - Montmartre
m'emportent à l'assaut de la Butte
Les moteurs beuglent comme les taureaux d'or
Les vaches du crépuscule broutent le Sacré - Cœur
O Paris
Gare centrale débarcadère des volontés
Carrefour des inquiétudes
Seuls les marchands de couleurs
ont encore un peu de lumière sur leur porte
La compagnie internationale des Wagons-lits
et des Grands Express Européens
m'a envoyé son prospectus :
C'est la plus belle église du monde


J'ai des amis qui m'entourent comme des garde-fous
Ils ont peur quand je pars que je ne revienne plus
Toutes les femmes que j'ai rencontrées
se dressent aux horizons
avec les gestes piteux et les regards tristes
des sémaphores sous la pluie :
Bella, Agnès, Catherine
et la mère de mon fils en Italie
Et celle, la mère de mon amour en Amérique
Il y a des cris de sirène qui me déchirent l'âme
Là-bas en Mandchourie un ventre tressaille encore
comme dans un accouchement
Je voudrais
Je voudrais n'avoir jamais fait mes voyages
Ce soir un grand amour me tourmente
Et malgré moi je pense à la petite Jehanne de France.
C'est par un soir de tristesse
que j'ai écrit ce poème en son honneur
Jeanne
La petite prostituée
Je suis triste je suis triste


J'irai au " Lapin agile "
me ressouvenir de ma jeunesse perdue
Et boire des petits verres
Puis je rentrerai seul

Paris

Ville de la Tour unique
Du grand Gibet
Et de la Roue.


Blaise Cendrars

Paris 1913.

R

quinta-feira, 16 de março de 2006

Blaise Cendrars: Prose du Transsibérien et de la petite Jeanne de France (4/5)

(continuação)

Elle dort
Et de toutes les heures du monde
elle n'en a pas gobé une seule
Tous les visages entrevus dans les gares
toutes les horloges
L'heure de Paris l'heure de Berlin
l'heure de St Pétersbourg et l'heure de toutes les gares
Et à Oufa, le visage ensanglanté du canonnier
et le cadran bêtement lumineux de Grocho
Et l'avance perpétuelle du train
Tous les matins on met les montres à l'heure
Le train avance et le soleil retarde
Rien n'y fait, j'entends les cloches sonores
Le gros bourdon de Notre - Dame
La cloche aigrelette du Louvre qui sonna la Barthélemy
Les carillons rouillés de Bruges - la - Morte
Les sonneries électriques de la bibliothèque
de New - York
Les campagnes de Venise
Et les cloches de Moscou, l'horloge de la Porte - Rouge
qui me comptait les heures quand j'étais dans un bureau
Et mes souvenirs
Le train tonne sur les plaques tournantes
Le train roule
Un gramophone grasseye une marche tzigane
et le monde, comme l'horloge du quartier juif de Prague,
tourne éperdument à rebours.

Effeuille la rose des vents
Voici que bruissent les orages déchaînés
Les trains roulent en tourbillon sur les réseaux enchevêtrés
Bilboquets diaboliques
Il y a des trains qui ne se rencontrent jamais
D'autres se perdent en route
Les chefs de gare jouent aux échecs
Tric - trac
Billard Caramboles Paraboles
La voie ferrée est une nouvelle géométrie
Syracuse Archimède
Et les soldats qui l'égorgèrent
Et les galères et les vaisseaux
Et les engins prodigieux qu'il inventa
Et toutes les tueries
L'histoire antique

L'histoire moderne
Les tourbillons

Les naufrages
Même celui du Titanic que j'ai lu dans le journal
Autant d'images - associations
que je ne peux pas développer dans mes vers
Car je suis encore fort mauvais poète
Car l'univers me déborde
Car j'ai négligé de m'assurer
contre les accidents de chemin de fer
Car je ne sais pas aller jusqu'au bout
Et j'ai peur.
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J'ai peur
Je ne sais pas aller jusqu'au bout
Comme mon ami Chagall
je pourrais faire une série de tableaux déments
mais je n'ai pas pris de notes en voyage
" Pardonnez-moi mon ignorance
Pardonnez-moi de ne plus connaître
l'ancien jeu des vers "
comme dit Guillaume Apollinaire
Tout ce qui concerne la guerre
on peut le lire dans les Mémoires de Kouropatkine
ou dans les journaux japonais
qui sont aussi cruellement illustrés
A quoi bon me documenter
Je m'abandonne
aux sursauts de ma mémoire...

À partir d'Irkountsk le voyage devint
beaucoup trop lent beaucoup trop long
Nous étions dans le premier train
qui contournait le lac Baïkal
On avait orné la locomotive de drapeaux
et de lampions et nous avions quitté la gare
aux accents tristes de l'hymne au Tzar.
Si j'étais peintre
je déverserais beaucoup de rouge,
beaucoup de jaune sur la fin de ce voyage
car je crois bien que nous étions tous un peu fous
et qu'un délire immense ensanglantait les faces énervées
de mes compagnons de voyage
Comme nous approchions de la Mongolie
qui ronflait comme un incendie.
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Le train avait ralenti son allure
et je percevais dans le grincement perpétuel des roues
les accents fous et les sanglots d'une éternelle liturgie.
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J'ai vu
J'ai vu les trains silencieux les trains noirs
qui revenaient de l'Extrême-Orient et qui passaient en fantômes
Et mon œil, comme le fanal d'arrière,
court encore derrière ces trains
À Talga

cent mille blessés agonisaient
faute de soins
J'ai visité les hôpitaux de Kranoïarsk
et à Khilok nous avons croisé un long convoi
de soldats fous
J'ai vu dans les lazarets
des plaies béantes des blessures
qui saignaient à pleines orgues
Et les membres amputés dansaient autour
ou s'envolaient dans l'air rauque
L'incendie était sur toutes les faces dans tous les cœurs
Des doigts idiots tambourinaient sur toutes les vitres
Et sous la pression de la peur
les regards crevaient comme des abcès
Dans toutes les gares on brûlait tous les wagons
Et j'ai vu
J'ai vu des trains de soixante locomotives
qui s'enfuyaient à toute vapeur
pourchassés par les horizons en rut
et des bandes de corbeaux qui s'envolaient
désespérément après
disparaître
dans la direction de Port - Arthur.

(continua)

quarta-feira, 15 de março de 2006

Blaise Cendrars: Prose du Transsibérien et de la petite Jeanne de France (3/5)

(continuação)

"Dis, Blaise, sommes-nous bien loin de Montmartre ?"

Mais oui, tu m'énerves, tu le sais bien, nous sommes bien loin
La folie surchauffée beugle dans la locomotive
la peste, le choléra, se lèvent comme des braises ardentes
sur notre route
Nous disparaissons dans la guerre en plein dans un tunnel
La faim, la putain, se cramponne aux nuages en débandade
et fiente des batailles en tas puants de morts
Fais comme elle, fais ton métier...

" Dis, Blaise, sommes-nous bien loin de Montmartre ? "

Oui, nous le sommes, nous le sommes
Tous les boucs émissaires ont crevé dans ce désert
Entends les sonnailles de ce troupeau galeux
Tomsk
Tchéliabinsk Kainsk Obi Taïchet Verkné Oudinsk
Kourgane Samara Pensa-Toulone
La mort en Mandchourie
est notre débarcadère est notre dernier repaire
Ce voyage est terrible
Hier matin
Ivan Oulitch avait les cheveux blancs
et Kolia Nicolaï Ivanovitch se ronge les doigts
depuis quinze jours...
Fais comme elles, la Mort la Famine, fais ton métier
Ça coûte cent sous,
en transsibérien, ça coûte cent roubles
En fièvre les banquettes et rougeoie sous la table
Le diable est au piano
ses doigts noueux excitent toutes les femmes
La Nature
Les Gouges
Fais ton métier jusqu'à Karbine...

" Dis, Blaise, sommes-nous bien loin de Montmartre ? "

Non mais... fiche-moi la paix... laisse-moi tranquille
Tu as les hanches angulaires
ton ventre est aigre et tu as la chaude-pisse
c'est tout ce que Paris a mis dans ton giron
C'est aussi un peu d'âme...
car tu es malheureuse


(continua)

terça-feira, 14 de março de 2006

Blaise Cendrars: Prose du Transsibérien et de la petite Jeanne de France (2/5)

(continuação)

Et pourtant, et pourtant
J'étais triste comme un enfant
Les rythmes du train
La " moëlle chemin-de-fer " des psychiatres américains
Le bruit des portes, des voies, des essieux grinçant sur
les rails congelés
Le ferlin d'or de mon avenir
Mon browning, le piano et les jurons des joueurs de
cartes dans le compartiment d'à côté
L'épatante présence de Jeanne
L'homme aux lunettes bleues qui se promenait nerveusement
dans le couloir et qui me regardait en
passant
Froissis de femmes
Et le sifflement de la vapeur
Et le bruit éternel des roues en folie dans les ornières
du ciel
Les vitres sont givrées
Pas de nature !
Et derrière, les plaines sibériennes, le ciel bas et les
grandes ombres des Taciturnes qui montent et qui
descendent
Je suis couché dans un plaid
Bariolé
Comme ma vie
Et ma vie ne me tient pas plus chaud que ce châle
Écossais
Et l'Europe tout entière aperçue au coupe-vent
d'un express à toute vapeur
N'est pas plus riche que ma vie
Ma pauvre vie
Ce châle
Effiloché sur des coffres remplis d'or
Avec lesquels je roule
Que je rêve
Que je fume
Et la seule flamme de l'univers
Est une pauvre pensée...

Du fond de mon cœur des larmes me viennent
Si je pense, Amour, à ma maîtresse ;
Elle n'est qu'une enfant, que je trouvai ainsi
Pâle, immaculée, au fond d'un bordel.

Ce n'est qu'une enfant, blonde, rieuse et triste,
Elle ne sourit pas et ne pleure jamais ;
Mais au fond de ses yeux, quand elle vous y laisse
boire,
Tremble un doux lys d'argent, la fleur du poète.

Elle est douce et muette, sans aucun reproche,
Avec un long tressaillement à votre approche ;
Mais quand moi je lui viens, de-ci, de-là, de fête,
Elle fait un pas, puis ferme les yeux - et fait un pas.
Car elle est mon amour, et les autres femmes
N'ont que des robes d'or sur de grands corps
de flammes,
Ma pauvre amie est si esseulée,
elle est toute nue, n'a pas de corps - elle est trop
pauvre.

Elle n'est qu'une fleure candide, fluette,
La fleur du poète, un pauvre lys d'argent,
Tout froid, tout seul, et déjà si fané
Que les larmes me viennent si je pense à son cœur.
Et cette nuit est pareille à cent mille autres quand un
train file dans la nuit
- Les comètes tombent -
Et que l'homme et la femme, même jeunes, s'amusent
à faire l'amour.

Le ciel est comme la tente déchirée d'un cirque pauvre
dans un petit village de pêcheurs
En Flandres
Le soleil est un fumeux quinquet
Et tout au haut d'un trapèze une femme fait la lune.
La clarinette, le piston, une flûte aigre et un mauvais
tambour
Et voici mon berceau
Mon berceau
Il était toujours près du piano quand ma mère comme
Madame Bovary jouait les sonates de Beethoven
J'ai passé mon enfance dans les jardins suspendus
de Babylone
Et l'école buissonnière, dans les gares devant les
trains en partance
Maintenant, j'ai fait courir tous les trains derrière moi :
Bâle-Tombouctou
J'ai aussi joué aux courses à Auteuil et à Longchamp
Paris-New York
Maintenant, j'ai fait courir tous les trains tout le long
de ma vie
Madrid-Stockholm
Et j'ai perdu tous mes paris
Il n'y a plus que la Patagonie, la Patagonie, qui convienne
à mon immense tristesse, la Patagonie,
et un voyage dans les mers du Sud
Je suis en route.
J'ai toujours été en route
Je suis en route avec la petite Jehanne de France
Le train fait un saut périlleux et retombe sur toutes
ses roues
Le train retombe sur ses roues
Le train retombe toujours sur toutes ses roues.

" Blaise, dis, sommes-nous bien loin de Montmartre ? "

Nous sommes loin Jeanne, tu roules depuis sept jours
Tu es loin de Montmartre, de la Butte qui t'a nourrie,
du Sacré-Cœur contre lequel tu t'es blottie
Paris a disparu et son énorme flambée
Il n'y a plus que les cendres continues
La pluie qui tombe
La tourbe qui se gonfle
La Sibérie qui tourne
Les lourdes nappes de neige qui remontent
Et le grelot de la folie qui grelotte comme un dernier
désir dans l'air bleui
Le train palpite au cœur des horizons plombés
Et ton chagrin ricane...

" Dis, Blaise, sommes-nous bien loin de Montmartre ? "

Les inqiétudes
Oublie les inquiétudes
Toutes les gares lézardées obliques sur la route
Les fils télégraphiques auxquels elles pendent
Les poteaux grimaçants qui gesticulent et les
étranglent
Le monde s'étire s'allonge et se retire comme un
accordéon qu'une main sadique tourmente
Dans les déchirures du ciel, les locomotives en furie
S'enfuient
Et dans les trous,
Les roues vertigineuses les bouches les voix
Et les chiens du malheur qui aboient à nos trousses
Les démons sont déchaînés
Ferrailles
Tout est un faux accord
Le broun-roun-roun des roues
Chocs
Rebondissements
Nous sommes un orage sous le crâne d'un sourd...

(continua)

segunda-feira, 13 de março de 2006

Blaise Cendrars: Prose du Transsibérien et de la petite Jeanne de France (1/5)

Dediée aux musiciens
.

~En ce temps-là j'étais en mon adolescence
J'avais à peine seize ans et je ne me souvenais déjà
plus de mon enfance
J'étais à seize mille lieues du lieu de ma naissance
J'étais à Moscou, dans la ville des mille et trois
clochers et des sept gares
Et je n'avais pas assez des sept gares et des mille et
trois tours
Car mon adolescence était si ardente et si folle
Que mon cœur, tour à tour, brûlait comme le temple
d' Éphèse ou comme la Place Rouge de Moscou
Quand le soleil se couche.
Et mes yeux éclairaient des voies anciennes.
Et j'étais déjà si mauvais poète
Que je ne savais pas aller jusqu'au bout.

Le Kremlin était comme un immense gâteau tartare
Croustillé d'or,
Avec les grandes amandes des cathédrales toutes blanches
Et l'or mielleux des cloches...
Un vieux moine me lisait la légende de Novgorode
J'avais soif
Et je déchiffrais des caractères cunéiformes
Puis, tout à coup, les pigeons du Saint Esprit
s'envolaient sur la place
Et mes mains s'envolaient aussi, avec des bruissements
d'albatros
Et ceci, c'était les dernières réminiscences du dernier
jour
Du tout dernier voyage
Et de la mer.

Pourtant, j'étais fort mauvais poète.
Je ne savais pas aller jusqu'au bout.
J'avais faim
Et tous les jours et toutes les femmes dans les cafés
et tous les verres
j'aurais voulu les boire et les casser
Et toutes les vitrines et toutes les rues
Et toutes les maisons et toutes les vies
Et toutes les roues des fiacres qui tournaient en
tourbillon sur les mauvais pavés
j'aurais voulu les plonger dans une fournaise de
glaives
Et j'aurais voulu broyer tous les os
Et arracher toutes les langues
Et liquéfier tous ces grands corps étranges et nus sous
les vêtements qui m'affolent...
Je pressentais la venue du grand Christ rouge de la
révolution russe...
Et le soleil était une mauvaise plaie
Qui s'ouvrait comme un brasier.

En ce temps-là j'étais en mon adolescence
J'avais à peine seize ans et je ne me souvenais déjà
plus de ma naissance
J'étais à Moscou, où je voulais me nourrir de flammes
Et je n'avais pas assez des tours et des gares que
constellaient mes yeux
En Sibérie tonnait le canon, c'était la guerre
La faim le froid la peste le choléra
Et les eaux limoneuses de l'Amour charriaient des
millions de charognes
Dans toutes les gares je voyais partir les derniers
trains
Personne ne pouvait plus partir car on ne délivrait
plus de billets
Et les soldats qui s'en allaient auraient bien voulu
rester...
Un vieux moine me chantait la légende de Novgorode.

Moi, le mauvais poète, qui ne voulais aller nulle part,
je pouvais aller partout
Et aussi les marchands avaient encore assez d'argent
Pour aller tenter faire fortune.
Leur train partait tous les vendredis matin.
On disait qu'il y avait beaucoup de morts.
L'un emportait cent caisses de réveils et de coucous
de la Forêt-Noire
Un autre, des boîtes à chapeaux, des cylindres et un
assortiment de tire-bouchons de Sheffield
Un autre, des cercueils de Malmoë remplis de boîtes
de conserve et de sardines à l'huile
Puis il y avait beaucoup de femmes
Des femmes, des entre-jambes à louer qui pouvaient
aussi servir
Des cercueils
Elles étaient toutes patentées
On disait qu'il y avait beaucoup de morts là-bas
Elles voyageaient à prix réduits
et avaient toutes un compte-courant à la banque.

Or, un vendredi matin, ce fut enfin mon tour
On était en décembre
Et je partis moi aussi pour accompagner le voyageur
en bijouterie qui se rendait à Karbine
Nous avions deux coupés dans l'express et trente quatre coffres
de joaillerie de Pforzheim
De la camelote allemande " Made in Germany "
Il m'avait habillé de neuf, et en montant dans le train
j'avais perdu un bouton
- Je m'en souviens, je m'en souviens, j'y ai souvent
pensé depuis -
Je couchais sur les coffres et j'étais tout heureux
de pouvoir jouer avec le browning nickelé qu'il
m'avait aussi donné

J'étais très heureux insouciant
Je croyais jouer aux brigands
Nous avions volé le trésor de Golconde
Et nous allions, grâce au transsibérien, le cacher
de l'autre côté du monde
Je devais le défendre contre les voleurs de l'Oural qui
avaient attaqué les saltimbanques de Jules Verne
Contre les khoungouzes, les boxers de la Chine
Et les enragés petits mongols du Grand-Lama
Alibaba et les quarante voleurs
Et les fidèles du terrible Vieux de la montagne
Et surtout, contre les plus modernes
Les rats d'hôtel
Et les spécialistes des express internationaux.

(continua)



domingo, 12 de março de 2006

O marsúpio familiar

.
Há exactamente uma semana, na sua secção de abertura "Porque hoje é domingo" do "Notícias Magazine" nº 719, Isabel Stilwell, directora dessa revista que é suplemento do jornal que desde os meus 16 anos venho lendo [1] i.e. do "Jornal de Notícias", escrevia um interessante artigo sobre a recente "acomodação de gerações" que, com novas formas moluscoides (de ambos os lados), veio substituir os anteriores e muito mais dinamizantes "conflitos de gerações" e levar a perspectivas de corrosão familiar verdadeiramente surpreendentes [2]. Tão interessante é este artigo que, com a devida vénia, não resisto a transcrevê-lo na íntegra [3]:
.
"Decididamente a tradição já não é o que era.
Quem agora bem precisava de um subsídio para compra de habitação eram os pobres pais, se tives­sem a ousadia de desejar um bocadinho de sossego. Por­que a deles está selvaticamente ocupada pelos filhos que não têm a menor intenção de a vagar tão cedo. Pois é, a ideia era que se criassem as criaturas até elas terem idade de se fazer á vida, para depois gozar um pouco de paz, pelo menos até â chegada dos netos. Mas os pais bem podem ti­rar o cavalinho da chuva, que já lá vai o tempo em que o jovem, acabado o curso, ou logo que conseguia o primeiro emprego, se punha a mexer para território próprio. Sair da casa paterna representava então possibilidades inimagi­náveis, uma liberdade até então desconhecida, nomeada­mente a de não ter de prestar contas a ninguém. Nesses tempos, ou seja, há pouco mais de uma dúzia de anos, os PROFETAS do optimismo diziam que os jovens portugueses iriam imitar os seus congéneres nórdicos, abrindo asas logo ali pelos 17 anos, partindo para universidades distantes, trampolim, por sua vez, para empregos que lhes garantis­sem uma existência autónoma. Coitados dos profetas! Es­queceram-se obviamente da crise e do desemprego, mas, sobretudo, deste nosso temperamento latino, dos filhos agarrados às saias das mães, das mãezinhas prontas a tirar o pão da boca para que não falte nada aos meninos, a so­mar a pais ansiosos pela segurança das suas princesas, que juraram proteger de todos os mânfios que por aí andam. Foram incapazes também de prever a mudança brutal de costumes e mentalidades, que a força das telenovelas brasileiras e de um mundo cada vez mais global foi ca­paz de alterar em apenas décadas, abrindo um mara­vilhoso mundo novo aos ADOLESCENTES e àqueles a quem antigamente chamávamos adultos, mas que agora fo­ram promovidos à categoria de eternos jovens. Ou seja, a uma pensão de cinco estrelas, com cama, roupa lavada e comida à discrição, de chave na mão, sem renda para liqui­dar ao fim do mês. Os resultados estão à vista. Pais queixo­sos, mas por dentro contentinhos da silva por não terem perdido acompanhia e o controlo dos seus filhos e prontos 'a avançar como dinheiro para pagar o privilégio; e filhos encantados e sem pressa nenhuma de se porem a milhas. Mais ainda, com o ordenado «livre», quando não acrescentado de uma mesada, para investimentos bastante mais di­vertidos do que o de pagar as contas da água e da luz. E tu­do isso sem terem de apanhar do chão a roupa que vesti­ram no dia anterior, quanto mais passá-la.Além do mais, esta opção não exige CONTRAPARTIDAS, nem sequer a «seca» de aturar os pais, porque há sempre a possibilidade de ir passar um fim-de-semana fora ou alternar a casa paterna com a dos amigos ou das/dos namoradas/os. E as estatísticas estão aí para garantir que isto não é tudo ficção:elas saem de casa, em média, pelos 27 anos, e eles pelos 29, mas uma percenta­gem cada vez mais significativa (e em crescendo) só sai mui­to depois disso. Ou seja, quando os pais, já cheios de ciática, terão uma média de idade entre cinquenta e sessenta anos.

O fenómeno tem um nome, dado pelos franceses, que nestas coisas nos servem sempre, infelizmente, de modelo: chamam-lhe a «geração canguru». Aqueles que cada vez mais tarde abandonam a bolsa mar­supial. E o fenómeno já tem subfenómenos, nomeadamen­te aquele a que os sociólogos deram o nome de «casais be­bés»: adolescentes que iniciam cedo uma RELAÇÃO estável, em reacção muitas vezes à agitada vida amorosa do pai e da mãe, e que se instalam em casa paterna, sem que estes di­gam nem ai nem ui. Colegas de liceu ou de faculdade fran­queiam com toda a naturalidade as resistências familia­res, perante progenitores mais ou menos atónitos, dividi­dos entre a perplexidade que a situação lhes provoca e a sensação de que talvez seja melhor assim, porque namo­rar no carro ou nos jardins é hoje tão perigoso ...É sobre es­ses adolescentes precoces, que são uma crescente maioria, e esses pais naturalmente angustiados, mas com uma difi­culdade imensa em traçar LIMITES, que fala o texto «A minha mãe, o meu pai, o meu namorado e eu», que encontra umas páginas mais à frente. Não há como ler e estar preparado. PS: que me desculpem todos aqueles miúdos que traba­lham no duro, têm casa própria e ainda sustentam os pais. Mandem morada e telefone, para possível adopção.
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Isabel Stilwell"
.
em Notícias Magazine, nº 719 (05.MAR.2006), pag. 3 e 4
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[1] Eu ainda tive a sorte de ser ensinado (e de poder ensinar) sobre o valor da leitura de um jornal diário. Antes deste, e desde a seguir ao soletrar, lia o jornal da família, que era "O Primeiro de Janeiro". Isso foi ainda no tempo em que a figura do pelicano a rasgar o peito mostrava a protecção na necessidade mas acompanhava, de forma também simbólica, a imagem dos pássaros a picar os filhos quando adultos para que definitivamente saíssem dos ninhos em que tinham sido criados.
[2] Que chegam, em alguns casos conhecidos, ao aplauso (para não dizer o fomento) da separação dos pais, para que ganhem a opção de dois casulos em ocupação alternativa, quando não de ver se, pelo decurso do conflito, poderão abichar carinhos repartidos ou mesmo, antecipadamente, alguma coisa mais. Razão tinha um pai mais que frustrado que me dizia que era lamentável que, no Código Civil e para descendentes já matulões/onas em termos de maioridade mas pertinazmente "colados" ao aboletamento familiar, não pudesse existir a singular figura de "divórcio de filhos".
[3] Com supressão de dois "subtítulos" à margem: "Pais reinvindicam independência" e ""Dormir com a namorada em casa dos pais, sim ou não?" - este remetendo para um artigo na mesma revista, também referido na parte final do texto.

sábado, 11 de março de 2006

Um dos enganos dos que aspiram ao poder...

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Victor d'Hondt (Gant,1841 - Gant,1901)

... é, num sistema democrático e com órgãos proporcionalmente colegiais, pensarem que vão viver sozinhos. Por isso, seja de que lado for, dever-se-iam coibir de agora abrir feridas que depois terão de lamber, evitar hoje lavrar insultos que amanhã terão de reparar e reduzir ao seu real valor quaisquer truculências (ou truculentos) que possam encontrar pelo caminho, para que o inevitável convívio democrático - em que, queiram ou não, irão coabitar - se torne o que exactamente deles se pretende, para o bem duma comunidade. Num regime em que os órgãos não serão unica e somente uma representação do voto maioritário, isso é essencial e esquecê-lo, seja qual for o lado ou os lados que atinjam o poder, é certamente ter o gosto amargo de dar tiros nos pés. Os verdadeiros adversários, de oferecido palanque, agradecê-lo-ão!

sexta-feira, 10 de março de 2006

Crustáceos são bichos de casca dura...(5)

Palinuros elephas (n.v. lagosta castanha)

(foto, com a devida vénia, de www.horta.uac.pt)


quinta-feira, 9 de março de 2006

O Leito e as Margens


Teve hoje (dia 9) lugar na Livraria Colibri, na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, o lançamento da obra assim epigrafada e que, com o subtítulo "Estratégias Familiares de Renovação e Situações Liminares em Seis Aldeias do Alto Trás-os-Montes raiano (1880-1986)", é assinada pela Professora Doutora Paula Godinho, daquela Faculdade, e editada por Edições Colibri.
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Texto retomado em 2005 da tese de mestrado defendida em Fevereiro de 2001 na UNL, a Autora, revisitou, por várias vezes até 2005, o teatro do seu trabalho de campo (no segundo lustro dos anos '90) e, em oportuno pósfácio, identificou (e procurou interpretar) o contexto de rápida mudança que ali teve entretanto lugar.
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Mais valor adquire pois a descrição que do passado é feita e sem a qual, ainda que oralmente transmitido, se iria necessariamente esbatendo no tempo até que só uma escassa memória pudesse marcar "o que se passou".

Crustáceos são bichos de casca dura...(4)

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Scylarides latus (o n.v. descubram-no, porque ele tem!)

quarta-feira, 8 de março de 2006

Local/data: San Fernando Valley, 27/7/81

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A felicidade
cai
no lado errado
da Sorte
.
A felicidade
cai
longe das minhas mãos
.
A felicidade
despenha-se
entre as árvores
toda a gente se queixa.
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Sam Sheppard
(trad. José Vieira de Lima)
in "Crónicas Americanas"
(Motel Chronicles)
ed. Difel, Lisboa, 1982, p.58

Crustáceos são bichos de casca dura... (3)

Maja brachydactyla (n.v. Santola)

terça-feira, 7 de março de 2006

Ali Farka Turé (Kanau, Mali 1939 - Bamako, Mali 2006)


Calou-se de manhã, dizem que durante o sono, vítima de doença prolongada que é a forma eufemística de dizer "cancro"). 7 albuns, pelo menos ("Ali Farka Touré", 1987/9; "The River", 1989; "The Source", 1992/3; "Talking Tombuktu",1994/5;"Niafunké", 2004; "Red and Green", reedição em 2005 de "La Drogue", 1984 e "Sidi Gouro", 1988; "In the Heart of the Moon", 2005/6 [1,2]), dois Grammys (1995, com "Talking Tombuktu", e 2006, com "In the Heart of the Moon") para além de uma designação (em 2004, com "Niafunké", album que recebeu o nome da cidade em que de há muito vivia). Uma voz de excepção na música africana, vindo de um País de músicos, poetas e escritores - verdadeira joia escondida do Além-Sahara, onde até o "grande rio" corre ao contrário - que é o Mali. A recordar. [3]
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[1] Referem-se comunmente dois outros albuns de que não possuímos elementos concretos: "Farka", 1976 - que terá sido o primeiro CD gravado no Mali (Radio Mali), talvez reaparecido como "Ali Farka Touré" na lista e gravura acima e "10 Songs from the Legendary - Songs from Mali" (?). "La Drogue" e "Sidi Gouru" terão sido (?)gravados em vinil, no início da carreira, aliás sem grande sucesso (?)
[2] As indicações de anos próximos correspondem a elementos divergentes constatados.
[3] Ver a biografia publicada no portal da "World record".
Adenda (em 8/3): Para uma notícia necrológica-biográfica muito completa ver http://www.essor.gov.ml de hoje, correspondente à publicada no diário de Bamako "Essor" nº 15657, também de 8/3.

Crustáceos são bichos de casca dura ...(2)

Clibanarius vitatus (n.v. Paguro)

segunda-feira, 6 de março de 2006

Procissão

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Se uma opa não faz a procissão,
os anjinhos ajudam certamente!
E a produção, Senhor, a produção?
O que fica, depois disto, para a gente?
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Mokando

Crustáceos são bichos de casca dura... (1)

Cancer bellianus (n.v. Sapateira dentada)

domingo, 5 de março de 2006

As personagens escondidas, os encontros desencontrados e as terras sonhadas

Prometi-me falar disto. É uma pequena nota, que resulta um pouco da reflexão do dia. ñada mais... Mas a verdade é que há, em muitas formas de expressão escrita (como há também em muitas vidas, personagens que não estão lá, que não aparecem e que têm uma presença verdadeiramente avassaladora, ruidosa no seu silêncio, violenta no seu simples insinuar. Não é a presença provocada, que se espera, que se adivinha, que está ali à espera, por detrás do reposteiro do enredo, o enfático "romeiro quem és tu?" que, no fundo, é a razão de tudo aquilo. Também não é a figura que vai sendo construída ao longo da narração, mesmo que ausente, como na "Lua e as Fogueiras", de Pavese, porque acaba por ser a parte essencial da narração. Estes, não. O essencial passa, e eles não estão no essencial a não ser através de uma alusão rapidamente deixada, um perfume, um ruído, uma mancha de sombra de que se não conhece o objecto, porque ele projecta-a do lado do quadro inexistente que é o que continua a cena por fora da moldura. Cito dois casos, ambos femininos: a Melissa do "quarteto de Alexandria", a Raquel dos Thibault. Curiosamente, desde que as pressenti, gosto de ambas. Não são exigentes, quase não precisam de as descobrir. A Melissa já está morta quando o Autor fala nela pela primeira vez; a Raquel essa aparece e, desaparecendo, permanece ali. Da Melissa vamos sabendo coisas... e a imaginação de Durrell refere-a no fim, na lista de continuações possíveis mas não necessáriamente sequentes sob o ponto de vista cronológico. A Raquel surge e manda longínqua e última mensagem através de um objecto simbólico (o colar), quando já é irreversível para a obra e para si própria. Mas são ambas da mesma natureza. Dou-lhes o prémio para as figurantes discretas, nesta noite de Óscares, já que ambas povoam também o meu imaginário. E, cereja puxa cereja, recordo outra, também mulher: é no "Citizen Kane", quando um personagem idoso relembra a mulher que viu uma vez e fixou para sempre. Deve pois ser doença de idade, mas tenho que concordar que quanto àquelas duas fui um doente precoce!
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Os encontros desencontrados são também situações que sucedem sem suceder, pessoas que se cruzam (uma vez, certamente) e que, por qualquer razão, sentem que há qualquer coisa que poderiam começar a contar com gosto, com alegria, com confiança - do género do "se algum desconhecido lhe oferecer flores". Redundam quase sempre em momentos perdidos, porque o risco permanece no chão e as coisas não se contam com miradas, e o tempo e a distância sempre acabam por estabelecer barreiras. Os dois ramos das hipérboles marcam essas trajectórias, descrevem-nas mesmo. O outro lado fica ali, junto das histórias não narradas, do fatalismo do jornal da manhã e dos dias de todos os dias. "Procurando viver", em suma.
.
O terceiro ponto representa um tema que já reflecti algures. É onde gostaríamos de ter estado, do qual reservamos as melhores memórias sem que nunca lá tivéssemos ido. Não é certamente o "déjà vu", que se descobre quando se vê, mesmo que em fotografia - é apenas o que se descobre quando se imagina e que, de longe, manda uma longínqua mensagem, um verdadeiro chamamento, um apelo subtil ao caminheiro que pendurou a capa e bateu as sandálias no cabide e na porta que cada um de nós, como realidades determinadas num determinado sistema e momento, representa.
.
De facto tenho de concluir quão mau, muito mau mesmo, é trabalhar num domingo. Pior ainda é, nesse domingo, fazer actas. A chuva, lá fora, impediu o casal de toutinegras de descer a escada de serviço. Refugio-me num outro "domingo à tarde na ilha da Grand Jatte" e na solução pontilhista para o processo da cor.
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Ah! e da caixa plástica dos refugos desencanto dois cadernos. Deixando de lado "os textos das conferências proferidas durante o Simpósio sobre Propriedades de Transporte de Fluidos realizadaõ em Março de 1982 em Lisboa" (a), porque hoje me dá para rejeitar textos mesmo que só vagamente eróticos, procuro encontrar no outro qualquer sinal que avive esta arquitectura luandesca da D.Luís I. Não vou muito longe:
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Um degrau mais
.
Um degrau mais. E o fôlego maduro.
Esforço da esperança dobrada pela fadiga.
Emoção íngreme.
Ao sol da circunstância derrete-se o beijo inútil.
O caminho tem cada vez mais portas
para o braço do impulso já céptico.
O olhar ergue o caminho agressivo
e o fôlego
faz ondas na raiva.
Mais um degrau.
e a esperança faz músculo
Mais um degrau.
Mais um degrau.
Mais um degrau.
.............................
A alma é um touro sem asas atrás do vento.
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António M. Meneses Rocha (b)
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Acabo a tarde (ou deixo-a acabar antes que acabe ela comigo) meditando na "morte de um blog". Cortam-se-lhe as palavras e eis que ele morre, dizendo adeus aos que nele confiavam e recebiam vozes com quem tinham essa maneira de falar. Muitas vezes só essa. Sendo o blog um sinal de solidão, o buraco no chão para onde se atiram berlindes e segredos (ou segredos em berlindes) quem fecha um blog diminui, de alguma forma, uma parte de si, dos seus berlindes e dos seus segredos, e daqueles que nele recebiam voz de quem tinha com eles essa maneira de falar, muitas vezes só essa. É pelo menos injusto e certamente triste.
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E que será feito amanhã do que lá estava? Perdido, como nos chats por vezes tão interessantes e nos "livros de visitantes" que traziam pendentes? Apagarei a luz, dentro de algum tempo, ainda e sempre a pensar no como fazer "backups" dos blogs. Alguém sabe disso?
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Vamos mas é aos Óscares, que amanhã, dentro de horas, voltam incessantes os degraus da escada. As pessoas, às pintinhas, estão a sair da Grand Jatte. Seurat, com a sua inconfundível barba, abre a porta.
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(a) in Revista Portuguesa de Química, vol. 25 nº 1, pp. 1-62, Lisboa, 1983
(b)in "Cadernos de Literatura", INIC, nº 7, Coimbra, Dezembro 1980, pag. 26

sábado, 4 de março de 2006

Donaciano Afonso Francisco...Marquês de Sade


Pois é ele, não tenham dúvidas, no seu "Retrato imaginado" por Man Ray (1938). E, para acesso a muitas das suas mais importantes obras, algumas delas com traduções em português (e castelhano e catalão), ou encontrarem excelentes biografias, de entre as quais destaco o surpreendente texto (em inglês) de Anthony Walker, sugiro - certo do apreço que um bom local merece - uma visita a http://desade.free.fr
A partir daí será só escolher...
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Mas que excelente blog este Donaciano não teria feito...

O portão inútil

Quinta das Palmeiras, Barreiro / Lavradio
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Aljustrel, 20 de Maio de 2001

Como estava então a "chaminé da Transtagana", em Algares
Hoje já nem assim está!

Há uma "lei de Murphy" que diz:
"As coisas deixadas a si próprias vão sempre de mal para pior".

Outra poderá dizer: "O tempo flui e empobrece"
Soube também que o Luta já não estava connosco.
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quinta-feira, 2 de março de 2006

Mina e poesia (3): Campeiro de Minas Gerais, Brasil

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Campeiro mulato de sol
Você que dormiu
sem medo de bruxos, sacís-pererês
botando a cabeça fervendo de amores
no couro estendido...
Você não ouve ali perto
de dia de noite
a barulheira da boca da mina?
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São filhos da nossa terra também.
Largaram a boiada no morro
serenatas nas ruas familiares
e foram pra noite de ferros tinindo
procurar a lua de metal
escondida nas montanhas duras
saltando depois nos cadinhos...
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Você não está ouvindo o ruído dos pilões na baixada
triturando a pedra que vem do fundo
nos vagonetes ligeiros ?
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E aquele suor que os companheiros estão suando...
A gente pensa que é sangue
mineiro campeiro!
Eles deixaram a casa sonhando riqueza
e agora estão magros e feios.
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Como você dorme bem
cansado das lidas campeiras.
Eles nem podem dormir sossegados:
a mina não fica sozinha um momento.
Mineiros que saem
mineiros que vêm
as máquinas sempre rodando.
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Campeiro queimado de sol
vai ver o trabalho dos seus companheiros
nas galerias de ar frio
na noite constante!
Mineiro das minhas Gerais
você não acorda?
Vai ver o trabalho dos outros mineiros
dos mineiros-mineiros enterrados na mina
ouvindo os patrões em fala estrangeira.



Guilhermino César
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Notas do bloguista:
1. Vale a pena visitar muita coisa na "net". Esta revista brasileira de cultura (com ligações a Portugal através do excelente portal "triplov") e portal http://www.revista.agulha.nom.br é certamente um exemplo do que vale a pena!
2. Se se procurar quem era "Guilhermino César" p.ex. no "Google" a nossa vida - e ainda bem que é assim - complica-se, pois vamos parar ao grupo de jovens modernistas de Cataguases que, nos passados anos 20, editaram a "Revista Verde", também completamente acessível na "net", e receberam de Blaise Cendrars (um dos meus autores favoritos, diga-se) a homenagem de um poema dedicado "aux jeunes gens de Cataguases".
Bastaria isto, n'é? Uma verdadeira mina aqui se abre... e a certeza de que sabemos tão pouco do Brasil como eles sabem de nós. Só que - e aqui está já uma diferença - o Brasil é mesmo, mesmo muito maior!
3.Quem quiser conhecer uma biografia de Guilhermino César, que nasceu mineiro (de Minas Gerais) em 1908 e morreu no Rio Grande do Sul em 1993, consulte http://www.ufrgs.br/jornal/dezembro2003/pag11.html.

Mina e poesia (2) : Lousal

Graças a um mui amigo aviso comprei na terça feira de Carnaval o último exemplar que estava nas prateleiras da FNAC - Chiado da obra de Paula Rodrigues "Vidas na Mina - Memórias, Percursos e Identidades", editada em Outubro de 2005 pela Celta Editora Lda, de Oeiras. Trata-se de um interessante e bem documentado estudo vertido sobre as minas de Lousal (também já se escreveu Louzal), a "peça" histórica mais ao Norte e a Ocidente, das minas de pirite exploradas da faixa piritosa ibérica. Parece que, finalmente, as ciências sociais e humanas se debruçam com insistência sobre o "fenómeno mina", tão cheio de características próprias que, fora mesmo das minas de carvão - em que esse aspecto é ainda mais arreigado -, se pode falar de uma "cultura mineira".
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Pois não é que, nas pags. 33 e 24 desta obra, vou encontrar mais um exemplo da poesia de mineiros que me apraz registar e, com a devida vénia transcrever. O Autor é Manuel João Vaz, lousalense, e a data é de 1994:
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Ó Lousal, terra sem par, foste a terra onde eu nasci,
ande lá por onde andar, eu não me esqueço de ti.
Lá dos tempos de menino, lembro o bairro da Estação,
os Quartéis, a Direcção, lembro o bairro do Serrinho,
São Jorge e o Barranquinho e o São Bernardo e as Oliveiras,
Salão, o bairro das Palmeiras e a Procissão a passar,
lembro as minhas brincadeiras.
Ó Lousal, terra sem par,
lembro eu os Quartelinhos, lembro o bairro dos Solteiros,
lembro os amigos mineiros que ficaram pelo caminho,
lembro também o carrinho puxado por um jumento.
Lembro-te a todo o momento, esteja aqui ou esteja ali,
não me sais do pensamento, foste a terra onde eu nasci.
Lembro o bairro de São João, lembro o bairro dos Carrascos,
lembro a erva, vejo os pastos, sinto grande comoção,
lembro no meu coração o edifício da escola,
lembro o campo da bola, lembro a malta a jogar.
estás sempre presente em mim, ande lá por onde andar.
Lembro a mina, lembro a ponte e lembro a trituração,
a oficina e a serração e as toldas ao pé da ponte,
lembro o minério e o monte, o escritório e o hospital,
o armazém e a Central.
Lembro tudo como vi, vou lembrar para toda a vida,
eu não me esqueço de ti.
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Manuel João Vaz, lousalense, 1994

quarta-feira, 1 de março de 2006

Março


Do missal antigo de Lorvão
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