quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Da Fonte Santa às Devezas (como então se escrevia) - Adenda

Feito e descrito o sumário peregrinar de saudade por ruas de entre a Fonte Santa e as Devesas e procurando mais esclarecer o que foi visto, torna-se oportuno trazer - para benefício próprio e de a quem o assunto interesse - a notícia de duas excelentes referências existentes sobre o tema da azulejaria, da ornamentação cerâmica e das cerâmicas, incluindo certamente - e com justo desenvolvimento - as de Vila Nova de Gaia e, de entre estas, a Companhia Cerâmica das Devesas. Encontram-se ambas no portal do Doutor Francisco Queiroz 
chamando-se especial atenção para os artigos "Fábrica Cerâmica das Devesas" e "A Ornamentação Cerâmica na Arquitectura do Romantismo em Portugal" (este correspondente à Tese de Doutoramento em História da Arte da Doutora Ana Margarida Portela) e que podem ser acedidos, com adequada extensão, a partir desse endereço geral. 

Em complemento do primeiro artigo (e sendo de observar a advertência que o precede) é citada a seguinte publicação documentada e para cuja bibliografia também o portal remete:

  • PORTELA, Ana Margarida  e QUEIROZ, Francisco:  A Fábrica das Devesas e o Património Industrial Cerâmico de Vila Nova de Gaia, Famalicão, 2008 (separata de "Arqueologia Industrial", 4ª Série, Vol. IV, n.º 1-2), 47 páginas.

Igualmente vem expressa, no mencionado portal, a proposição "Para um Museu Nacional das Artes Industriais na antiga Fábrica de Cerâmica das Devesas" [1] - proposição essa que, a todos os títulos, se gostaria fosse recebida e praticada, mas que, pelo abandono e desmantelamento que se apreciou no local, se teme que fique dia após dia mais longe. [2]

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[1] Propositura que funciona como “link” e que, uma vez clicada, conduz precisamente ao primeiro dos referidos artigo
[2] Adverte-se no portal quanto a uma breve migração deste para outro domínio, com mais publicações disponíveis e outras novidades...que desde já interessadamente se aguardam.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Em Vila Nova de Gaia: da Fonte Santa às Devezas (como então se escrevia) - Parte 3: O mapa dos sítios



“Pois isso de Gaia pode ser giro, mas nós não conhecemos os sítios”. Paguei o café ao amigo de longa data, como se tivesse perdido a aposta e no reconhecimento de quanto tinha razão. Abri o jornal, fiz rápida leitura das desgraças locais, nacionais, europeias e, voltando a Gaia (agora ao planeta a que chamamos Terra), azuladamente esferoidais. Manuel Augusto Pina, inteligentemente, põe na sua habitual coluna uma perspectiva interessante, ainda pouco referida: de como a existente “crise” tem dado uma faceta nova e muito palacianamente tranquila a um modelo atípico de golpe de estado, ao fazer com que governos democraticamente eleitos (e qualquer que tenha sido à nascença o seu posicionamento ideológico) acabem substituídos por governos tecnocráticos, que ninguém elegeu. Entramos na conversa por aí – e pela dimensão e motivações da repulsa ao referendo grego, vistas nas duas faces da moeda. Uma interessante associação de ideias levou a comentar um “caso do dia” muito local: num prédio em propriedade horizontal os proprietários do 1º e 2º direitos ignoraram a assembleia de condóminos e começaram, abusivamente, a falar pelo prédio e a dar instruções, que passavam por um despudorado assédio aos restantes vizinhos para que apoiassem as perspectivas e diligências que lhes eram próprias.  Uma questão de elevadores, dizia-se. E então o Florêncio, trazendo a “bica”, pôs a malta a coçar a moleirinha: "Eh, gente! Isso não é novo! Se o gajo do primeiro usar saias e se chamar Ângela e o do segundo - ambos do lado direito direitinho, notem bem!- se chamar Nicolau tendes aí a tenda europeia toda armada e o Zé Manel a caminho de ascensorista!" Eh, eh, eh! Risada geral (ainda pode haver risadas gerais, mas daqui a algum tempo já se não sabe, pois ou serão tributadas ou poderá haver razões de não mais as haver, o que é muito mais sério). Nova leitura semi-silenciosa de jornais, e sai outro ovo galado: “Vocês já pensaram como é que, numa comoção não democrática, o Facebook e essas invenções de redes sociais se podem tornar verdadeiras armadilhas?” A mesa, então, dividiu-se sobre as vantagens e inconvenientes da diluição das privacidades na “net” e no valor das relações nelas anunciadas (e até fotografadas) se postas ao serviço de “inteligências” perversas. Alguém mandou vir um pastel de nata: oitenta cêntimos. “Eh pá, lá vou eu gastar cento e sessenta paus para comer um pastel de nata! Com cento e oitenta escudos no JN, que é o mais barato, estamos mas é feitos de todo”. Dobrei o jornal e, aproveitando a entreaberta com algum sol, preparei-me para me pôr a milhas. À saída disse: “Pois se querem o guia de Gaia, daquela zona de Gaia, terão um mapa. Visitem o blog logo, que até dá para eu me animar com mais  presenças registadas no contador de visitas.  Bom dia e bom almoço, k’ísto é mesmo segunda-feira!”.

Entre gente séria, que é o caso, pacta sunt servanda (mesmo que em termos de oferta unilateral) – ipurisso aí ides ter o mapa. Mas antes de vo-lo dar, fastidiar-vos-ei (hoje é mesmo segunda-feira, vê-se!) com umas palavrinhas explicativas:

a)     Ao começar, na postagem de 4 do corrente, por trazer aqui algumas fotografias (três, aliás) sobre o desmantelamento do que foi uma das representativas cerâmicas nacionais – a Companhia Cerãmica das Devezas (como então se escrevia) -. E de outras instalações na área  não pensava mais que afinfar uma renovada catilinária no lombo daqueles que contribuíram durante decénios (eu escrevi DURANTE DECÉNIOS) para diminuir a Indústria, para fechar unidades sem as substituir em “upgrading” e assim contribuíram com a sua parte para o generalizado enrascanço em que, por esses motivos e outros, todos nos acabamos metendo e todos acabamos metidos. Foi o “não é preciso pensar nisso agora, que a Europa pensará por nós!”,“a minha política industrial é a ausência de uma política industrial”, o que é preciso é “grande comércio, pequena indústria!”, o “se você pensa que esse projecto tem interesse, porque é que outros não o terão proposto antes?” (frases todas datadas e autoradas, embora infelizmente algumas delas já órfãs). Passado ao blog  esse primeiro apontamento, que poderia chamar de parte 0 (Zero), comecei a escrever sobre outras coisas – dentro dos chamados “passos em volta”. Surgiram encontros e memórias. E alarmes. Escrevi sobre isso, até porque a descrição do que encontrei na zona da Fonte Santa às Devesas (em Gaia) é um reflexo do que poderia ser encontrado em muitos outros sítios deste País, mas aqui com o acicate  de ter sido onde vivi a minha meninice. Surgiu assim uma Parte 1, sobre património azulejar em perigo, e uma parte 2, sobre o que eu designei de “casas cerâmicas” – que é uma forma diferente de dizer o mesmo.


b)     Um acidente informático singular e grave (aliás é a segunda vez que me sucede em “Blogger”) “não carregou” e fez-me perder totalmente a Parte 2 já concluída e ter de a reescrever de princípio, o que mortifica qualquer mortal. Confirmando um receio que me persegue desde o tempo do “Mirc” e que é a fragilidade e efemeridade de contributos com certo interesse que, colocados na “net”, perdem oportunidade, entre perdidos & esquecidos, esta ocorrência incómoda levou-me a rever a minha orientação e a só publicar textos mais longos e "conteúdosos", mesmo que experimentais, a partir de  ficheiro. Dir-me-ão que os ficheiros são ou podem ser igualmente inseguros, mas a verdade é que não são a mesma coisa, em termos de classificação e manuseamento. Tornam-se peças soltas, transmissíveis em separado e classificáveis e "se não entram" permitem novamente tentar e retentar sem o ploff! de se sentir nu em frente ao écran – e há nisto uma certa diferença. Idêntica preocupação levou a que, nos ficheiros que reproduzem as postagens de 4 e 10 de Novembro, e de forma diferente do que consta no blog, as imagens surjam numeradas e referenciadas aos ficheiros fotográficos originais.

c)     Um terceiro ponto diz já respeito à elaboração do mapa, Com o Norte apontado, grosso modo, para o topo da página, e retirando a parte que interessa de um outro mapa da cidade de Vila Nova de Gaia (Michelin?) localizaram-se, de A a O, os sítios representados e/ou mencionados nas postagens dos dias 4, 10 (Parte 1) e 12 (Parte 2) do corrente mês de Novembro de 2011, a que se juntaram dois pontos de localização X1 e X2 com coordenadas geográficas recolhidas no Google Earth.

Segue-se portanto “o mapa dos sítios”,  acompanhado da respectiva legenda:

Mapa Fonte Santa / Devesas - Fregª de Santa Marinha - V.N. de Gaia



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sábado, 12 de novembro de 2011

Em Vila Nova de Gaia: da Fonte Santa às Devezas (como então se escrevia) - Parte 2: As "casas cerâmicas"


I. 
 Com pouco tempo mas muita chuva decidi orientar os meus passos na redescoberta de algo que, pela sua apresentação singular e austera, olhei na minha meninice com algum respeito, muita curiosidade e uma parcela de temor e que sempre para mim mesmo fui chamando como “as casas cerâmicas das Devesas”. Designo assim um conjunto de edificações que, ou influenciadas pela proximidade da Fábrica e a disponibilidade cerca dos seus produtos ou mesmo pela influência desta na sua construção, evidenciavam de forma expressiva a incorporação de elementos cerâmicos na sua arquitectura. – desde o revestimento a mosaico das fachada até à concepção fantasiosa (e amouriscada) de portas e janelas, com introdução de elementos decorativos nas fachadas e telhados. Servindo propósitos habitacionais, sociais ou funcionais, tinham também – como se verá - desenvolvimentos diferentes de caso para caso, mas sempre sem prejuízo de um “denominador comum” que permitia distingui-las. Encontrei algumas velhas conhecidas, nesse meu excurso. Outras ou ficaram fora do itinerário escolhido, necessariamente breve, ou terão mesmo já desaparecido, absorvidas pelo intensivo processo de invasão urbana que modificou arruamentos, abriu outros, levando à frente os corredores de ruralidade que, nos anos 40, ainda separavam “a vila” da área industrial-ferroviária das Devesas [1]. Por essas razões o que vi poderá não fazer um levantamento completo desta espécie, em manifesto risco de extinção. Mas fica certamente a notícia (e, para mim, mais que isso). Se é verdade que o fenómeno não é singular  e que outros centros cerâmicos poderão ter induzido exercícios arquitectónicos próximos, o exemplo das Devesas, na zona circundante da “homónima” Cerâmica, impunha-se-me para o trazer aqui.

II.
Logo ao deixar o vale da Fonte Santa, prosseguindo para poente a descida da Rua Conselheiro Veloso da Cruz , nos nºs 318 a 326, fazendo esquina com a rua Almeida da Costa surge o primeiro exemplo. É uma ampla edificação de dois pisos (rés-do-chão e primeiro andar) que seguidamente se mostra (figs 1 e 2), não deixando de se notar, na fig. 1, a “presença” – afastada mas dominadora – da grande chaminé de tijolo que (ainda) marca o quarteirão. As figs. 3  mostra  pormenores das janelas do rés do chão e primeiro andar: 
Fig. 1 [DSCF3347]
Fig. 2 [DSCF3349]
Fig.3 [DSCF3348]
III.
 De concepção mais imponente é o edifício construído para albergar instituições assistenciais para a primeira idade e a velhice promovidas sob as designações “Creche Emilia de Jesus Costa” (hoje “Creche e Jardim de Infância D.Emília de Jesus Costa”) e “Asylo António Almeida da Costa” (hoje “Lar António Almeida Costa”) e que prosseguem activamente a sua missão no elenco dos equipamentos sociais da Misericórdia de Gaia [2]. Hoje com remodelações, aumentos e ampliação de instalações, o edifício é o único que no estilo sobrevive do lado nascente do 1º troço (norte-sul) da rua Almeida da Costa, correspondendo aos números de porta 151 a 153 (figª.4) No corpo central da fachada os beneméritos patrocinadores estão ambos representados de perfil em medalhão (figª 5) e dois significativos relevos, que evocam a infância e a velhice a que tais obras foram destinadas, ocupam as respectivas abas (figªs 6 e 7). O edifício é encimado por uma reprodução da obra “A Caridade”, do escultor António Teixeira Lopes (1899). A figªs 8 mostra o pormenor das duas portas gémeas [3].
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Fig.4 [DSCF3354]

Fig,5 [DSCF3356]

Fig.6 [DSCF2436]

Fig.7 [DSCF3425]


Fig.8 [DSCF3424]

IV.
A rua Almeida da Costa, junto ao edifício descrito, “acotovela” para poente, num segundo troço que  terminará ao entroncar numa outra rua Norte-Sul, a rua Mouzinho de Albuquerque, que me permiritá regressar à rua Conselheiro Veloso da Cruz. . Mas é ainda neste segundo troço da rua de Almeida da Costa que se abre um portão com arco, de arranjo mais recente (nº191; Figª 9),
Fig.9 [DSCF3423]
frente ao qual,  com maior sobriedade de incorporação cerâmica, se encontram as três moradias  dos  nºs 152, 154 e 158 (Figª 10), que se podem incluir no mencionado estilo.


Fig.10 [DSCF3421]

V.
Voltando agora para Norte e descendo a rua de Mouzinho de Albuquerque [4], depara-se-me um “correnteza” de moradias térreas e idênticas, do nº 153 ao nº 59,  em que a componente cerâmica está presente nos 6 diferentes revestimentos a azulejo que apresentam, como se igualmente constituíssem um mostruário da variedade da oferta fabril, neste particular. Destas casas, o azulejar da primeira (Figª 11) apresenta diferença das restantes, como se verá, ficando por esclarecer se essa diferença veio de origem ou resultou de modificação posterior. A inclusão de uma coluna de ferro fundido na separação de portas geminadas, já que cada revestimento abrange 3 portas, uma isolada e duas geminadas (Figª 12) [5] é ainda uma característica de época. Por dificuldades diversas (chuva, trânsito, estacionamento, rua estreira) não se fotografou casa a casa, registando-se apenas, para além da pormenorização da primeira casa (nº de porta mais alto) os 5 outros revestimentos do conjunto (Figs 13, 14, 15, 16 e 17).:

Fig.11 [DSCF3429]
Fig.12 [DSCF3418]
Fig.13 [DSCF3417]
Fig.14 [DSCF3416]
Fig.15 [DSCF3433]
Fig.16 [DSCF3434]
Fig.17 [DSCF3435]

VI.
O regresso à rua  Conselheiro Veloso da Cruz levar-me-ia à última casa desta visita: o número 149, do lado do portão da Companhia Cerâmica e pouco depois deste, na esquina com a rua de Alexandre Braga, quem vai para a Estação de CF. Nesse edifício, a julgar pela publicidade nas janelas, está hoje instalada uma actividade educativa. Mantem-se o estilo, com alguns pormenores a reparar, como a realização das janelas e a ornamentação cerâmica dos espigões no telhado. Vd. Fotos 18 a  21.

Fig.18 [DSCF3382]
Fig.19 [DSCF3387]

Fig.20 [DSCF3386]

Fig.21 [DSCF3385]
VII.
A fechar:
Antes de sair para o Sul – e relendo em pensamento o final d’ “A Montanha Mágica” – voltei a um dos locais em que estas três postagens tiveram início: a chaminé da Companhia Cerâmica das Devezas. Com o céu já mais aberto esperei que uma núvem passasse. Fotografei-a quando passou, como se os fornos pudessem ressuscitar ao não sei quantésimo dia e a indústria renascesse com isso nesta terra.

Fig.22 [DSCF3439]

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 [1]  Da Rua Conselheiro Veloso da Cruz ou melhor, da linha de caminho de ferro (grosso modo paralela àquela), em descida íngreme até à margem do Douro, a Norte,  predominam  ( tipologicamente distintas quanto ao edificado), as actividades afectas à etape final da saga do Vinho do Porto, com as suas caves e armazéns que marcavam a área do Entreposto. Diversas actividades associadas se desenvolveram, como os estabelecimentos de tanoaria que cresceram em diversos locais de Vila Nova de Gaia, nomeadamente no extremo Norte da Rua da Fonte Santa.
 [2] A Misericórdia de Gaia, não tendo a antiguidade de muitas Misericórdias, tem no entanto uma história muito interessante e uma obra a todos os títulos relevante num concelho extenso, exigente e diversificado. O exemplo destes benfeitores e de outros que se envolveram na sua constituição, funcionamento e dotação patrimonial que, no seu início, adoptou uma denominação simples mas suficiente: “Misericórdia de Gaia”.
[3] Lamenta-se a má qualidade destas e de outras fotografias, motivada pelas más condições atmosféricas. Há quem diga que isto é uma habitual e ardilosa escapatória para a imperícia do bloguista e talvez tenha razão. Uma alternativa muito em uso seria a de dizer que, também aqui, a culpa foi do Sócrates (o filósofo grego, claro).
[4] Com algum desgosto abandonei aqui a extensão da caminhada até ao “castelinho” que já se lobrigava relativamente perto, a Sul, por entre a chuva e o nevoeiro. Este “castelinho” era um modelo de “palacete” (denominação que para alguns pode parecer pretensiosa mas que, no Norte, era usada para designar uma casa isolada e com um relativo aparato em que vivia normalmente uma família com certas posses, ligada geralmente à indústria ou aos “Brasis”, se destes com afortunado retorno  – ou seja um sucessor do solar para gosto burguês “fin-de-siécle” ou por aí. 

Fig.23 [DSCF3384]
Pois este “castelinho”, nos anos 40 e para quem o via da Fonte Santa, surgia ao cimo de uma colina-campo  que em declive suave descia dos já referidos altos da Barrosa, seara na primavera-verão, marchetada de pequenos bosques onde cantavam cucos (raras vezes depois disso ouvi tão perfeitos cucos canoros!), destacando-se da mancha urbano-industrial das Devesas. Visitei-o de calções curtos e uma coisa que nele me impressionou e que certamente já não existe, até porque já então estava a estragar-se, foi um lago, um pequeno lago, com uma ilha. O curioso é que a ilha era uma fortaleza cercada e atacantes e defensores eram rãs em faiança, cada uma aí para uns 15 cm de altura ou equivalente, por detrás de canhões e outros utensílios bélicos, baluartes e contrafortes tudo também em cerâmica. Havia rãs generais e rãs soldados, rãs vivas e rãs mortas como naqueles soldadinhos de chumbo “made in Germany” que relembravam a guerra de 70 e em que feridos e mortos eram sempre zuavos franceses e “jamais” prussianos do “Gott mit uns”. Alguns motivos da fachada e do telhado e o estilo das portas e janelas, permitiriam colocar o “castelinho” entre as “casas cerâmicas”(p.ex. o torreão tinha ameias, que já não tem!) e levantam outras questões:  Seriam fabricos ou inspirações provenientes da vizinha Companhia Cerâmica? Ou de outras? Ainda haverá disso, rãs de faiança em manobras de assédio incluídas? Ou os assédios já são outros? O “castelinho”, perguntando  memórias, veio porém fazer prova daquilo que já se disse i.e. do quão incompleto foi este mais-passeio-que levantamento. E se se passeasse até ao Fojo, até à outra chaminé alta que (ainda) está visível para o lado de Coimbrões, ou para outras muitas ainda, o que se poderia encontrar?
[5] O que levanta dúvidas quanto ao número de fogos  nesta “fileira” de casa. A questão ainda pode associar-se (ou não) ao aproveitamento dos forros de algumas, que não de outras. No entanto esclarecer isto não era propósito deste meu peregrinar.


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quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Em Vila Nova de Gaia: da Fonte Santa às Devezas (como então se escrevia [1]) - Parte 1 : Azulejaria em risco

Na minha mensagem anterior apresentei três fotografias que, de certa forma, antecipavam já a presente. Saindo da Bifurcação, no extremo da rua Álvares Cabral, onde - como o nome indica - os "eléctricos" das linhas 13 e 14, chegados do Porto por um traçado comum,  divergiam respectivamente para Santo Ovídio e para Coimbrões (e é interessante recordar um importante político deste País, de calções curtos, a pedir ao guarda-freio que lhe confiasse o ferro para mudar a agulha) chega-se, descendo para poente, ao vale da Fonte Santa, cavado por uma das diversas linhas de água que descem das colinas da Barrosa para desaguar no Douro. Ora este vale da Fonte Santa é para mim particularmente importante até porque, no seu extremo Sul, onde passa a Rua Conselheiro Veloso da Cruz, ainda resiste, de tronco carcomido, um dos dois plátanos gigantes que aí cresciam  e que provavelmente contariam hoje um século,  porque eram já gigantes quando eu, que ali nasci, formei conhecimento do que me rodeava. O plátano-irmão morreu, vítima do tempo, como também morreu o que foi o meu primeito tecto, que ficava na homónima rua, do lado nascente do vale, sobre o Bairro da CP que então fervilhava de gente e em que vim encontrar hoje algumas casas entaipadas. Numa visão para Norte, a imagem seguinte mostra o vale, com o extremo da plataforma da estação de CF e o viaduto que lhe sucede;. A segunda imagem mostra aquele amigo-árvore, que teimosamente sobrevive a coroar o outro extremo do vale num até-quando de todos os dias.

 


O plano do vale completa-se com a primeira foto da mensagem anterior, que mostra  as ruínas de instalações que foram da Companhia Mineira do Norte de Portugal, empresa controlada por interesses alemães durante a II Grande Guerra - e por onde passava muito do negócio do volfrâmio e do estanho nessa conturbada época. Recordo-me do clarão nocturno que, dali partindo, iluminava o vale [2]. As duas outras fotografias dessa postagem mostravam já, mais para o lado da estação da CF de Vila Nova de Gaia -  Devezas (como então se escrevia), a chaminé e a estrutura de fornos da Companhia Cerâmica das Devezas, hoje em manifesto campo de desmonte. E aqui surge um primeiro problema: esclarecido que fui sobre a obrigatoriedade de qualquer entidade demolidora registar por fotografia a situação prévia do imóvel demolido, nada me esclarece que, no caso de instalações industriais, se deva proceder ao registo histórico do "miolo" das construções desmontadas. Sem valorização da perspectiva arqueológica industrial, ficamos, como em muitas outras coisas, pelas fachadas - e tranquilizamo-nos com isso. As fachadas e os muros de janelas tapadas chegam  - e, por isso, aqui vão alguns, daquela Companhia Cerâmica. ou de instalações que lhe eram próximas [3].



Saindo agora da Fonte Santa e continuando a descida pela rua Conselheiro Veloso da Cruz, no sentido da estação de caminho de ferro de Vila Nova de Gaia - Devezas (como então se escrevia), o primeiro encontro a registar é dado pela lápide existente no nº 353, celebrando naquela casa modesta, de um só piso, o nascimento de Teixeira Lopes - um dos nomes grandes da escola de escultores de Gaia.



Duzentos metros mais adiante fica o portão da já referida Companhia Cerâmica das Devezas, hoje aberto, devassado, com os dois leões de ferro fundido reduzidos à impotência de guardarem apenas recordações, enquanto não inventarem a forma de os levarem de noite para um "passeio" até qualquer sucateiro clandestino:

 E aqui surge um outro problema: de uma forma original a "Cerâmica do Costa", como era então designada, revestiu a parede do lado sul da rua Conselheiro Veloso da Cruz com arranjos de azulejos que fabricava e comercializava...

 


e com dois grandes paineis de azulejos, que, em reprodução que se diria fotográfica, representam o interior da parte artística da referida fábrica - como se pode observar seguidamente, apesar das péssimas condições atmosféricas em que decorreu a toma de imagens


Estes grandes paineis acompanham mais pequenas representações polícromas de paisagens de corte clássico, demonstrando as capacidades e qualidades da oferta daquela unidade fabril.



 Reparando nas deteriorações que já se verificam no referido mostruário e nestas representações polícromas e até no leve abaulado que se julga detectar na superfície de suporte, teme-se a deterioração de toda a azulejaria assim exposta e muito em especial dos  referidos paineis, que têm incontornável valor histórico - a nível concelhio e mesmo nacional.

Certo de que a Presidência da Câmara de Gaia e a Vereação da Cultura estarão na generalidade atentos ao contributo histórico da indústria cerâmica para a estrutura industrial do concelho (e não apenas da Cerâmica das Devezas, mas igualmente do Fojo, do Carvalhinho, da Electro Cerâmica e outras), resta solicitar que, na especialidade representada por este caso particular, se acautelem as referidas reproduções históricas antes que se percam. E que, para já, motivem um trabalho de descrição e identificação dos conjuntos e dos personagens neles representados.

(a continuar)
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[1] Escrevi "Devezas" por mera motivação sentimental, já que não sou em nada contra a evolução de uma língua na sua forma escrita. Vi escrito "prohibi", escrevi "proïbi" (com trema), tal como "europea" e "europeia", "tão" e "tam", etc. etc. Apoiaria at´+e uma escrita mais fonética que acabasse com os lixívia, axiologia e exemplo.
[2] Ainda, ligeiramente mais velhinho,  me pergunto o que lá fariam. Metalurgia do volfrâmio é duvidoso, embora possível mas incipiente. Fundição de minério de estanho e lingotagem é talvez a hipótese mais provável. Porque separadoras havia-as em todos os cantos... e não careciam nem provocavam chama.
[3] O fenómeno tem exemplos muito recentes. E quase sempre para o lado errado. Como diria um meu compadre, alentejano de cepa, e levaria vários adeptos dos "ancien regimes" quando esses passaram a "anciens" a abanar a cabeça (e também há exemplos muito recentes disso), "o passado é uma porra". Daí a que a solução muitas vezes preconizada seja a de matá-lo. Outro exemplo pode ser dado pela da subestima dos arquivos empresariais em sede de legislação de falências e liquidação de empresas: feitos "res nulius" acabam dispersos, soltos ao vento. E muito do passado, que nos poderia ensinar o futuro, perde-se com isso. Bastaria uma destinação de salvaguarda e uma alínea na legislação que o impusesse. Muito boa gente já levantou esta maldade escondida - mas, pergunta-se, algum dos governos que arrotam excelências quando estão no poleiro já alguma vez tentou "pôr o guizo ao gato"?
[4] Repete-se este facto: a maioria das imagens fotográficas desta postagem e da que se lhe seguirá foram captadas em péssimas condições atmosféricas. Lamenta-se certamente este facto.

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Já houve Indústria neste País



Ruínas de instalações fabris entre o Vale da Fonte Santa e as Devesas, freguesia de Santa Marinha, Vila Nova de Gaia (Nem o Friedman nem a Carlson se lembrariam que uma chaminé só pudesse ser útil quando estivesse coberta por trepadeiras!)