domingo, 30 de abril de 2006

O "Darino"

Correspondendo a um amável comentário de Salvietta na postagem de 28, tentarei mostrar como de cada item listado se poderia fazer uma história... porque, para mim, cada item tem mesmo uma história. Começarei (e talvez, por agora, não vá mais longe!) com a breve e seca referência ao "Darino" lá incluída, próximo do fim.
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O "Darino" de facto foram dois... e presumivelmente nenhum deles se chamaria "Darino" mas sim "Darinian", de que "Darino" era uma corruptela. Ambos ingleses, demandavam a barra do Douro e ficavam atracados do lado de Vila Nova, o primeiro mais a juzante da ponte de D.Luís , encostado aos cais que então aí havia, para assegurar uma fácil descarga (de carvão?) ou carga (de portwine?).
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O primeiro "Darinian" era negro e sinistro, comprido, de chaminé alta. Nele ficara para sempre o pai duma empregada de meus avós maternos (a Cândida?), esmagado no porão pelo pesado balde de ferro de um dos guinchos. Desse "Darinian", que já mal vislumbro no seu fato escuro e longo, coçado de anos, veio um dia a notícia de, durante a guerra, ter sido torpedeado. Certa ou errada a nova, facto é que o velho "Darino" nunca mais voltou ao Douro.
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Passado o conflito, uma nova remessa de barcos ingleses, mais pequenos e ágeis, regressou periodicamente ao ancoradouro de Vila Nova. Era o "Procian", o "Mercian" e ... o "Darinian". Aparentemente irmãos gémeos, estes mostravam-se de casco imaculadamente branco. O site http://www.ibiblio.org/maritime/photolibrary/thumbnails.php?album=6721 recorda o segundo "Darinian" na fotografia que se junta - e precisamente no rio Douro, com o perfil inconfundível do Porto a recortar-se na margem visível.
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Contei a história de uma linha. Outras existem, que nem da lista constam.
"Memories are made of this!"

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Adenda (em 2008.02.16): Parece-me deveras oportuno convidar à leitura dos comentários recebidos a esta postagem, e que desde já muito se agradecem. Ambos são importantes comentários à navegação de e para o Douro em tempo de guerra e em tempo de paz, muito acrescentando ao que acima foi dito.

sábado, 29 de abril de 2006

Kinderszenen (Cenas Infantis)


O título da postagem anterior foi de certa forma influenciado pelas sentidas recordações da infância que o compositor alemão Robert Schumann (Zwickau, Saxónia 8/6/1810 - Endenich, Bonn 29/7/1856) exprimiu no conjunto de 13 deliciosas pequenas peças para piano que denominou "Cenas Infantis".
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São, essas peças:
Cenas Infantis, Op. 15
  1. De Povos e Terras Distantes (Von fremden Ländern und Menschen), Sol maior
  2. História Curiosa (Kuriose Geschichte), Ré maior
  3. Criança Que Pede (Bittendes Kind), Ré maior
  4. Felicidade Perfeita (Glückes genug), Ré maior
  5. Grande Acontecimento (Wichtige Begebenheit), Lá maior
  6. Cabra-Cega (Hasche-Mann), Si menor
  7. Devaneios [Sonhando] (Träumerei), Fá maior
  8. À Lareira (Am Kamin), Fá maior
  9. Cavaleiro do Cavalo-de-Pau (Ritter vom Steckenpferd), Dó maior
  10. Quase Sério Demais (Fast zu ernst), Sol sustenido menor
  11. Meter Medo (Fürchtenmachen), Sol maior
  12. Criança Que Adormece (Kind im Einschlummern), Mi menor
  13. Fala o Poeta (Der Dichter spricht), Sol maior

... salvo erro ou omissão!

sexta-feira, 28 de abril de 2006

Kinderlieder

A poder um dia escrever sobre isto tudo

Fonte Santa, 31
O quintal-grande
O portão que fazia música
Os pipotes e a tanoaria
A fábrica de seixos rolados, formigas obreiras e chaminés de corneta
A Mãe que (ainda) cantava
A chegada do Pai, depois da chuva
A fuga ao ciclone: buracão e buraquinho
A menina-Rosalina
A ida ás Devezas buscar azeite na candonga
As primeiras notas
A chuva que fazia fumo nos telhados
O Sr. Amaral e a Dona Orísia
A cascata de recortes na escada
A louça de bordos amarelos
A festa de casamento dos ciganos
O "flecha-de-prata"
A "separadora" do volfro
Procurar "candeias" na Quinta do Colégio
A casa "arte nova" do Sr. Meireles
O castelo e o canto do cuco
A fonte dos sapos em grés
A Aninhas leiteira
O rancho para o Senhor da Pedra com a Quitéria à frente
As grandes manobras sob a chuva
A descarga de carvão
Esconder-se da Lua
As traineiras no "Ouro"
Os "adesivos" de papel nos vidros das janelas
A descoberta do jornal
A fábrica do Costa e as decorações em cerâmica
Fazer tatalitos
O verão
A Pedra-Moura
O fato-de-banho de comboio e o chapéu quase mexicano
O "Catitinha"
O Quinzinho-vende-bolos, vindo da Guiné, e a proibição de dizer "preto"
O "Darino"
O boicote às bolas-de-Berlim
Os avós
O mistério de em frente ao S.João
A surpresa de ouvir dizer "dous"
A venda do Sr. Costeira
As moedas de meio-tostão
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O mundo que ficou caído no caminho da outra casa

quinta-feira, 27 de abril de 2006

O número 100 da revista "Química"

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É rara a literatura química, científica ou técnica, em Portugal. Por isso é importante reconhecer que a revista "Química", boletim trimestral da Sociedade Portuguesa da Química, com a sua edição de Janeiro-Março de 2006, atingiu o número 100. Mais que o tempo que isso demorou, o que no momento interessa é registar o facto. E ele aí está. Cumprimentos à revista "Química" e à SPQ, cujo portal pode ser consultado em www.spq.pt.
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quarta-feira, 26 de abril de 2006

O sono (2)

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A postagem de "O Sono" de Dali, dois dias atrás, resultou de três factos interligados.
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O primeiro é eu gostar da obra desde que a vi. Eu, que não suporto praia, ousaria poder passear naquela praia, ver o barco, encaminhar-me para o mont-san-michel transposto para o sol mediterrânico e cadaqués certamente por perto, olhar na distancia a risca misteriosa do horizonte. Sentir-me-ia nela só e liberto, como me sinto só e liberto nas cidades vazias de Chirico, ou quando me deixo divagar sobre um mapa, ou quando me permito galgar quilómetros num itinerário à descoberta da terra que está para lá daquela colina ou "Over the rainbow", como cantava a Judy Garland menina num cenário clássico, com riscos no celuloide de filme multipassado, mas que, para mim, tem alguma conexão com isto tudo. Seja dito que me apaixonei pela Dorothy - Judy Garland logo que as vi juntas e quando, por pura atracção mecânica, eu me solidarizava com o "Homem de Lata".
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A segunda razão foi que, no momento, e por diversas razões que não vêm ao prato, eu ando cheio de sono. Odeio isto. Sono de cansaço mas também sono de idade, sono de caruncho. Vagueio sonolento, como se me faltasse mesmo o apoio dos característicos suportes dalianos. Coisas da vida! E nada melhor que "O Sono" para representar o sono no seu aspecto mais consolador, pelo menos num esteticamente belo!
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O terceiro motivo conduz-me a uma frase que leva a diversos preliminares explicativos (e que seria do mundo sem eles, mesmo quando não necessariamente explicativos) mas conduz, nos finalmentes, a uma reflexão muda e não escrita. Ora a primeira vez que encontrei a frase "hoje é o primeiro dia do resto da tua vida" foi nos Estados Unidos, muitos anos atrás. Talvez a ler Bradbury (que continua a fazer gostosa parte da minha selecção literária) ou outro autor de identico estilo. Achei a frase abominável, na sua agressiva realidade. Depois o Sérgio Godinho cantou-a em bom português,"Pano Cru" 78, no seu inconfundível estilo e toda a gente a conheceu e trauteou. Apareceu também em não menos abomináveis tantras (só uma vez pequei em dar-lhes seguimento, por o texto não ser abominável e sobretudo por me sentir silenciosamente contente ao notar, naquele caso concreto, que fui lembrado - mesmo que sendo um em dez ou cinco destinatários), tornou-se lema conhecido, "frase batida", como diz o poema do cantor - mas, muito significativamente, pouco usada. Entretanto, revestia-se para mim de novas cores, à medida que os anos passavam e uma análise gramatical lhe justificava o sentido: é, de facto, a única frase que, no presente do indicativo, pode afirmar uma certeza. O futuro é incerto: "amanhã a vida continua(rá)" pode ser uma frase consoladora, mas tem em si o pressuposto essencial de eu chegar lá. "Ontem foi o último dia do teu passado" (ou da tua "história de vida") é uma frase no passado mas errada, porque dizendo-a (ou pensando-a) eu estou voluntariamente colocado no "hoje", e portanto o "ontem" já não terá sido o ultimo dia, de qualquer modo. A frase torna-se pois fatalmente chata, tanto no presente com que é conjugada como no futuro incerto mas definitivamente limitado que implicita. Uma verdadeira porra, portuguêsmente falando! Não há que dar-lhe! Mas logica e até matematicamente correcta, nisto de limites abertos ou fechados!
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Mas não era esta a frase a que eu me queria referir. Era a uma prima dela, também incontornável, também agressivamente estuporada, mas que para mim tem a atenuante de nos envolvermos ambos, eu e a frase, no compartilho de uma certa hostilidade ao sono, ao sono que eu admiro em Dali e ao sono que eu me oponho em mim mesmo. E essa frase, lida também não sei onde, talvez na sombra perdida da latada que não mais existe em Gaia, é apenas a seguinte: "Desperta agora, pois terás uma eternidade para descansar".
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Segue-se a tal reflexão muda e não escrita. Mas, no meu registo escondido, zumbe um ligeiro murmúrio consolador para mim mesmo, como poderá ser a brisa do mar em Cadaqués, transposta por Dali para a estabilidade daquela figura sonolenta: "mas saberei levar os olhos cheios de visões e de desejos".
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terça-feira, 25 de abril de 2006

O içar da bandeira no Couço


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Passava das 11:00 horas...
Depois foi a abertura formal da exposição "A Reforma Agrária no Couço - Reencontro Com Uma História Portuguesa...Sob o Olhar de Fausto Giaccone". Cerca de 70 fotografias do reporter fotográfico italiano, de considerável valor histórico e artistico, das quais aprox. 50 pertencerão aos dias quentes de Agosto de 1975 e as 20 restantes se repartem por "revisitações" por aquele feitas, a última das quais em 2005.
Muito povo, todos se procurando, a si e aos seus pares - parentes, amigos, vizinhos, conhecidos - apontando-se a dedo no registo da História que são aquelas imagens nominadas.
Para algumas das mais representativas fotografias expostas, ver o "Notícias Magazine" nº 726, que - no último fim de semana - lhe dedicou a primeira página e mais 7, profusamente ilustradas e constituindo a secção "portfolio".

segunda-feira, 24 de abril de 2006

O sono

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O sono - Salvador Dali


domingo, 23 de abril de 2006

A inacção (ou deserção) política

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Isto de arquivar papeis pode ser fastidioso mas por vezes tem coisas úteis. Senão vejamos: com as eleições para a presidência chilena num horizonte próximo, encontrei em www.noticiasbolivianas.com um excelente artigo, subscrito por Enrique Bachinelo, que em 13 parágrafos e com data de 5 de Dezembro (de 2005, claro) me deu uma síntese clarificadora do processo, candidatos e seu enquadramento ideológico-político, forças em presença, objectivos eleitorais, etc. Imprimi e guardei. As eleições no Chile decorreram e eu referi-me a elas. Como também me referi à dos amáveis comedores de gorgonzola, aqui um bocadinho ao lado. E esqueci-me do texto e da razão que me levou especialmente a guardá-lo. Essa razão estava, sim, no 13º parágrafo e é de lembrar a muitos nos dias de hoje. Vai em castelhano mesmo, com depois uma tradução tentativa porque há lá um "sí" também "muito castelhano mesmo"! Vejamos:
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"El mayor castigo para quienes no se interesan por la política es que serán gobernados por personas que sí se interesan"
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"O maior castigo para os que se não interessam pela política é o de serem governados pelos que se interessam mesmo!"
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Correcta ou não correcta a tradução, correcta é a mensagem.
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sábado, 22 de abril de 2006

Da etérea qualidade do notificado

(clicar na gravura e usar o zoom para ler!)

sexta-feira, 21 de abril de 2006

A estátua de Joana d'Arc em Caen (França)

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Nada teria de muito extraordinário, esta estátua, se não fossem as inscrições gravadas no seu pedestal. A primeira, frontal, diz:
À
JEANNE D'ARC
ORAN 1931
CAEN 1964.
A segunda, lateral, por sua vez diz:
CETTE STATUE
A ETE ERIGEE À ORAN
EN L'HONNEUR DE JEANNE D'ARC
LE 10 MAI 1931.
Ou seja: levantada inicialmente na Argélia (em Oran) em 1931, enquanto domínio francês, foi transportada e re-erigida em França (em Caen), em 1964, , encerrado definitivamente o sonho da "Algerie Française" (a Argélia tornou-se independente em 1962).

Esta estátua é pois um bom exemplo: retirando tais memoriais de herois e faustos nacionais de novos países, que não os respeitam e mesmo 0s repudiam como símbolos de dominações passadas, e reimplantando-os novamente onde possam ser reconhecidos e celebrados, evitam-se dois embaraços: o primeiro, ao novo país, ao poupar-se-lhe o esforço e o custo de os guardar (ou não guardar) sabe Deus como, em velhas fortalezas ou espaços abandonados, sujeitos a todas as vicissitudes e danos; o segundo ao antigo colonizador por os ver desmantelados e aprisionados em tais localizações escusas, à espera de um qualquer uso menor ou da inevitável dispersão dos símbolos que não pode ou não quiz trazer consigo.
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quinta-feira, 20 de abril de 2006

Da garrafa meia-cheia e da garrafa meia-vazia ou como permanecer igual a si próprio

Transcrição na secção "Frases" do JN de hoje de uma das ditas, da autoria do sr. Vasco da Graça Moura, escritor / deputado europeu PSD, respigada de artigo de opinião no DN:

"O execrável Berlusconi não era afinal tão execrável como isso para nada menos de metade do eleitorado. Ia ganhando as eleições contra a criatura mais enfadonha e inoperante que existe hoje à face da terra, o sr. Prodi."
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Juan Miró


"Camponês catalão ao luar"
Juan Miró (Barcelona,20/4/1893 - Palma de Maiorca, 25/12/1983)

quarta-feira, 19 de abril de 2006

Assuntos de interesse para o Barreiro no último número do Boletim da Sociedade de Geografia de Lisboa

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No último Boletim da Sociedade de Geografia de Lisboa, agora publicado, Série 122ª, nºs 1-12 (Janeiro-Dezembro 2004), estão presentes dois artigos com potencial interesse para o Barreiro. São eles:

NETO, Maria Cristina Neto: "O Compromisso da Confraria de Nossa Senhora do Rosário da Palma (Alcácer do Sal)", pp.89-93

SEABRA, Maria Teresa da Silva Diaz de : "Transcrição Correcta da Visitação da Vila do Barreiro, de 13 de Dezembro de 1570", pp. 95-102.

Pela sua extensão não se verificou, no mesmo sentido, a lista "Publicações recebidas". Far-se-á isso proximamente, dando registo apenas de alguma obra que possa interessar.
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terça-feira, 18 de abril de 2006

"Uniendo puertos"

Clara Montes

segunda-feira, 17 de abril de 2006

Já há caracois!

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A notícia, trouxe-a a Inês, logo que chegou da Moita[1].
No jardim também já vi alguns!
Quero é vê-los na travessa! Helicídios [2], aí vou!
(Há trabalhos a fazer que são verdadeiramente desmancha-prazeres! [3])

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[1] Recordo com saudade a reacção franca de minha Mãe, nortenha convicta, quando soube que eu tinha levado a minha Filha mais velha, então aí com os seus 10 aninhos, a partilhar comigo uma travessa de caracois! Olhou-me com ar severo e disse: "Então foste dar isso a comer à menina??!"
[3]"Lesmas", que é termo menos erudito mas que, entre amigos, significa o mesmo.
[3] "Caracois à la Touraine" seria indigesto mesmo!

domingo, 16 de abril de 2006

Uma FELIZ PÁSCOA!

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Com a reprodução de um dos fabulosos "ovos de Páscoa" que Fabergé fez para a corte imperial russa, neste caso o "Azova" (ou "Couraçado Azov"), datado da Páscoa de 1891, envio a todos os que visitam este "blog" (e certamente a mim mesmo) os melhores votos de uma FELIZ PÁSCOA.
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Para os que estiverem interessados na história dos famosos ovos direi que terão muitas referèncias na web para se divertir. Indico no entanto a seguinte, que permite um bom início de navegação:
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http://gatchina3000.narod.ru/eggs/10/
(em Português, embora com algumas dificuldades na figuração das letras especiais)


sábado, 15 de abril de 2006

Lá como cá...

Da escritora Urda Alice Klueger, de Blumenau, estado de Santa Catarina, Brasil, recebi o seguinte e-mail que, como manifestação de solidariedade face à sujeição dos pobres pagantes a procedimentos automáticos, seguidamente divulgo:
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"De: urda

Enviada: sexta-feira, 14 de Abril de 2006 1:41
Para: Urda
Assunto: GVT-Quem já se incomodou com ela?

GVT – QUEM É QUE JÁ SE INCOMODOU COM ELA?

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Pois não é que me incomodei de novo? E desta vez não foi só com o 0800, como duma outra vez que aconteceu em 2005 – desta vez foi com a própria empresa e o 0800 juntos.

Vamos ver o que acontece: faz cinco décadas que vivo neste mundo de meu Deus, e tanto quanto saiba, até hoje não fiquei devendo nadinha de nada para nenhuma pessoa ou lugar, nem aqui no Brasil nem nos outros países por ando por aí afora. Paralelamente, sou cliente da empresa telefônica chamada GVT já faz um bocado de anos, já nem sei quantos: ela me fornece uma linha telefônica e uma linha para a Internet. Pago minhas contas em dia, diretamente em débito bancário, e não é muito pequena a conta que pago, não – juntando a Internet, dá lá em torno de uns 200,00 reais mensais, o que, acho, para uma pessoa física, não é uma conta pequena.

Daí, no dia 06 de março de 2006 a Associação Comercial do Paraná emitiu uma cartinha para mim, avisando que “por instrução do credor”, eu estava sendo incluída no SPC (lá do Paraná – eu moro em Santa Catarina, outro Estado). Se tivesse alguma dúvida, que ligasse para o nr. 0800 0522525. Muito intrigada, liguei, e uma moça bastante gentil explicou-me o que ocorria: que eu fizera 3 ligações telefônicas (gente, uma é de 0,49 reais!!!) usando o código 25 (que é da GVT) num telefone da Brasil Telecom.

Bem, desde que me lembro tenho também um telefone da Brasil Telecom , também pago através de débito bancário – que é que acontecera que as 3 ligaçõezinhas não tinham sido pagas? Duvidei bastante da coisa, mas a moça estava sendo muito gentil e prometeu mandar-me novamente as faturas, que chegariam em 7 dias.

Vou fazer um parêntesis para inserir aqui o que sei que esses monstros chamados Multinacionais fazem com os seus pobres atendentes das linhas 0800, e que já escrevi em outro texto.:

“(...)quando falo em tadinhos, não quer dizer que esteja a depreciá-los: estou é querendo dizer que são grandes vítimas de um Monstro chamado Capitalismo, que lhes paga um salariozinho de fome, lhes faz decorar algumas frases sempre iguais, lhes obriga a não cometerem nenhum ato de piedade ou de humanidade e lhes faz a aturar todos os estresses que o tal Capitalismo lança sobre os consumidores dos seus produtos. No caso da GVT não é diferente. Com a gentileza que são obrigados a terem para não serem colocados no olho da rua e serem incorporados às multidões de excluídos que o Capitalismo vem formando, sempre maior multidão destinada à morte pela desassistência e pela fome(...)[1]”... Pois é, taí o que penso daquelas centenas, milhares de jovens que ficam tentando ser gentis com a gente quando a empresa quer que eles nos matem e nos esfolem, o que nos causa as grandes revoltas e nervosismos que acabamos devolvendo a eles, e eu imagino que a maioria deles viva com dor de estômago, de cabeça, ou quem sabe até em depressão, de tanto levar bronca imerecida, broncas direcionadas aos seus nababos patrões desconhecidos, que decerto neste instante estão por aí refestelados em iates fabulosos ou vomitando champanhas cujo preço de uma garrafa é maior do que o dos salários mensais dos pobres atendentes que estragam sua saúde para mantê-los a jogar dinheiro fora em cassinos de luxo – e como tenho esta clareza quanto ao que é feito com os seres humanos que atendem o 0800, desde já peço a eles desculpas pelas vezes em que também me irrito e repasso para eles o que não tenho como repassar àqueles donos do Capital e do Poder que, como se fossem Santos do Céu, permanecem inacessíveis à nossa reles ira humana.

Ta, mas voltemos ao meu caso específico com a GVT. Passaram-se os 7 dias, passaram-se 14, e nada de as tais faturas chegarem. Voltei a ligar, então. Outra pessoa gentil atendeu, e diante do meu número de protocolo, achou ligeirinho as faturas que me tinham sido enviadas e devolvidas pelo correio com uma observação mais ou menos assim: “endereço não localizado”, ou algo equivalente. Confirmei o endereço: era exatamente o meu, com rua, número, apartamento, CEP, tudo. Estávamos, portanto, diante de uma falha do correio.

Como sou pessoa que recebe pilhas de correspondência por dia, aquilo me parecia uma brincadeira. Solicitei à atendente que voltasse a me mandar tais faturas com AR (Aviso de Recebimento), portanto, mas sabe como é, os escravos do Capital não podem falar uma palavrinha fora do que lhes é permitido, e ela não podia dizer alguma coisa assim: “Ta certo, vou repassar seu caso para meu chefe”, ou algo assim. Só podia me confirmar que receberia as novas faturas até o dia 11.04.2006. Voltei a esperar, portanto.

Hoje, olhando para o calendário, dei-me conta que já estamos a 13.04.2006 – cadê as faturas da GVT? Voltei ao 0800, tive um trabalhão mas consegui falar com uma supervisora – claro que a GVT iria resolver o meu caso! Resolveu? Uma ova! Por mais de uma hora penei ao telefone, sendo empurrada para um e para outro, contando minha história desde o começo seis (SEIS!!!) vezes de novo – sem a menor sombra de solução à vista, e então achei por bem começar a reclamar via a página da Internet www.gvt.com.br, onde há um espaço para reclamações. O caso é que a gente só pode reclamar um pouquinho, lá, passou de 800 toques (algumas linhas), eles cortam – e então fui mandando minha reclamação aos pedacinhos. Que fizeram? Lá pelo sexto pedacinho .... CORTARAM MEU ACESSO às reclamações. Tem dó, né, gente! Eu tinha prometido ao pessoal da GVT que botaria a história no sino grande, conforme teria dito a minha avó, e aí está, no sino bem grandão, nos muitos ouvidos pela Internet e outros veículos por aí. Tenho medo que me cortem a Internet – mas daí sempre se pode ir a um café cibernético e dar um jeito. O fato é que se eu souber que por causa de continhas mínimas de 2003 e 2004 (quando penso que já era cliente da GVT fazia tempo) estou hoje com o meu crédito estragado, a coisa não há de ficar barata, não. Da última vez que resolvi mesmo peitar uma briga, chegou-se a uma decisão do Supremo Tribunal Federal! Já aconteceu alguma coisa parecida com você? Não sei, mas sei que eu, cá, estou me sentindo uma palhaça.

Blumenau, 13 de abril de 2006.

Urda Alice Klueger

Escritora



[1] Da Crônica: Depois de Jeová e de Alá, o novo Deus, o 0800 – da mesma autora, escrito em 2005.


A tempo: lembra-me a visita formal e inspectiva a minha casa de dois funcionários das Finanças daqui do Puto, há uns anos, no âmbito da então badalada "Operação Locomotiva" porque eu tinha passado o ano com um crédito fiscal, no âmbito do IVA, correspondente a aproximadamente ... €12,5 Euros de hoje. Vejam lá! E tudo correcto, ainda por cima!

sexta-feira, 14 de abril de 2006

Em S. Bento

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Diálogo na escadaria:
- Achas que o Gama ainda aceita as justificações?

quinta-feira, 13 de abril de 2006

A centáurea e a papoila

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"Bleuet et coquelicot"
("A centáurea e a papoila")
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Já estão ambas lá fora, anunciando mais uma primavera que entrou. Elas e as malvas, as últimas azedas que ainda pensam estar a florir no fim do verão australiano, os tapetes vermelhos-púrpura da pequenina flor-do-cobre que também se encontra junto das minas e escoriais alentejanos e que aqui diz já ter havido uma unidade metalúrgica (que será do Barreiro quando ninguém mais veja ou mesmo recorde o que eram as flores-do-cobre?), as primeiras sálvias, as compósitas amarelas que simulam os dentes-de-leão, as aleluias brancas que, como o nome diz, são flores da Páscoa. Primavera de 2006, a única, de que mais nenhuma haverá pois a próxima será já a "primavera de 2007". Algo ao contrário da primeira metade do que diz a cantiga velhinha: "primavera vai e volta sempre, mocidade já não volta mais." A primavera volta, sim, mas já não é a mesma. Nunca mais, como dizia o corvo da história. Poe, onde estiver, dá um salto e grita "chamaram por mim?" A papoila ainda existe. Vi há pouco as primeiras. A centáurea, flor do trigo, desbastada pelas mondas químicas, flor nacional da Estónia, essa está já classificada em Inglaterra como "espécie em risco". Já não se vende em molhinhos no Chiado, como ainda vi. Por aqui cresce a variedade selvagem, menos azul e mais rosa-choque, espinhosa até mais não, que são os "loios" da quinta dos Loios ou os "fidalguinhos" da quinta dos Fidalguinhos, que nada têm a ver com antigas fidalguias, com numeradores de árvores ou com actuais lutas de classes.
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quarta-feira, 12 de abril de 2006

Os sussurradores (de Ray Bradbury)

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Gárgula (Alcobaça)
Um exemplo de prosa fantástica deste notável autor norte-americano, tantas vezes (erradamente) apontado como apenas autor de ficção científica[1]:
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"A lista era longa, a necessídade era óbvia.
As manifestações da necessidade tomaram muitas formas e formatos. Algumas eram de carne sólida, outras eram ambiências evanescentes que cresciam no ar, algumas tinham semelhanças com as núvens, outras com o vento, algumas apenas com a noite, mas todas precisavam de um lugar onde se esconder, um lugar onde serem enfiadas, em adegas de vinho ou em sótãos, ou transformadas em estátuas de pedra no alpendre de mármore da Casa. E entre todas as criaturas, encontravam-se meros sussurradores. Tinha de se escutar com atenção, para ouvir as necessidades.
E os sussurradores diziam:
- Baixem-se. Fiquem quietos. Não falem nem se levantem. Não prestem atenção aos gritos e aos sons dos canhões, pois aquilo que eles gritam é maldição e morte, sem a manifestação de fantasmas e sem darem a vida aos espíritos. Eles não nos dizem que sim, o grande exército dos temíveis ressuscitados , mas não, o terrível não, que faz com que o morcego tombe sem asas e com que o lobo caia por terra, aleijado, ficando todos os caixões rachados com o gelo e pregados com a geada da Eternidade, de onde nenhuma rspiração da Família pode suspirar para deambular pelo tempo em vapores e neblinas.
- Fiquem, oh, fiquem na grande Casa, durmam com corações que vos denunciam batendo no soalho de madeira. Fiquem, oh, fiquem todos em silêncio. Escondam-se. Esperem. Esperem."
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Ray Bradbury, "Os Sussurradores" ,
cap. 16 de "Regresso das Cinzas",
trad. de Maria João Freire de Andrade,
Publ. Europa-América, Mem Martins,
2004 (2001)
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[1] Apesar da mestria desta história duma casa assombrada posta no cimo da colina "antes do tempo de que há memória" e onde concorreu a gata, mais tarde o rato e finalmente a Família chamada pela casa, como recorda a contra-capa, eu continuo a achar que a melhor obra do autor é "O Mundo Marciano", também já publicado entre nós sob o título de "Histórias Marcianas" (ou similar), muito mais conforme ao título original de "Martian Tales".

terça-feira, 11 de abril de 2006

"Notícias da América"

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É a segunda vez que cito, com a devida vénia, a coluna "Por Outras Palavras" de Manuel António Pina no JN. Mas hoje não cito apenas, faço mais, transcrevo o que ontem foi publicado sob a epígrafe supra. E que leva a pensar na ressurreição de um tal Joseph McCarthy de triste memória e que até chegou a senador:

"Notícias da América
Uma reportagem de "The Guardian" dá conta da caça às bruxas que se vive hoje em universidades (Yale, Califórnia / UCLA, Columbia, Berkeley, Stanford...) e escolas (Pennsylvânia, Minnesota, Virgínia...) americanas, com professores acusados de "antiamericanismo" e suspensos por serem "progressistas" ou por criticarem Bush, alunos encorajados a gravar as aulas e a denunciá-los (uma fundação republicana oferece 100 dólares por cada denúncia), lista de professores "de esquerda" ou "amigos de gays", ou tão-só de usarem nas aulas "textos obscurantistas" de Habermas, divulgadas na Net, na TV (Fox News) e em livro, com títulos como "Os Dir-ty 30" ou "Os 101 mais perigosos professores da América", uma associação de "Pais Contra os Maus Livros na Escola", e até um movimento tendente a impor quotas de "professores conservadores", num verdadeiro furacão persecutório que, segundo Peter McLaren , da UCLA, revela uma assustadora "tendência para o fascismo". Ao menos (mas, como ensina Hannah Arendt, a aceitação de males menores significa a aceitação do mal em si mesmo) dir-se-ia que, entre nós, os problemas do ensino são ainda "apenas" do aproveitamento, dos manuais ou da data de início do ano escolar...

Manuel António Pina
em "Por Outras Palavras",
JN, 10 Abril 2006, última página"
Comentários breves do bloguista:
a) Em muitas escolas americanas ainda hoje é tabu ensinar a evolução. É apenas um complemento ao que vem acima e não vale mais que isso.
b) Quanto a nós, há pelo menos já olheiros (ou olhentos) e não apenas no espírito do "escolas versus escolas" que há uns anos campeava.
c) É oportuna, neste quadro de debate, uma atenta leitura do artigo de opinião de João Marques de Almeida, director do Instituto de Defesa Nacional, publicado na pag 3 do "Diário Económico" também de 10 de Abril, isto é, de ontem, sob o título "O anti-capitalismo na Europa" e que, como é óbvio, não deixa de se referir às escolas, ao que elas ensinam e ao que o A. também ensina.

segunda-feira, 10 de abril de 2006

Prevenção da doença de Lyme.

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1º Tirar os carrapatos [1] de dentro da bota
2º ...
3º ...
...
& etc.
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Bota? Qual delas?
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[1] ou carraças

domingo, 9 de abril de 2006

9 de Abril de 1918 (em memória do CEP [1] e da batalha do Lys):



Tondela: Grupo Escultórico do Monumento aos Mortos da I Grande Guerra [2]

Sobre a participação portuguesa na I Grande Guerra (1914-1918) [3]:
Em especial sobre a batalha do Lys [2], o depoimento vivido de Jaime Cortesão :
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Notas breves:
[1] CEP = Corpo Expedicionário Português
[2] Cortesia a Viriatus, fonte cit. supra, oferecendo de facto uma observação melhor que a facultada no portal da autarquia ( em http://www.cmtondela.com/). De facto são raros os monumentos aos combatentes da I GG que mereçam destaque especial pelo seu valor artístico - e esta opinião não é apenas a do signatário - pelo que se destaca este, aparentemente inspirado numa fotografia da época, pela sua expressividade.
[3] Apenas sugestão, entre outras diversas fontes disponíveis.

sábado, 8 de abril de 2006

Blogs do Barreiro

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Em http://blogsdobarreiro.blogspot.com "Atalaia" tem procedido a uma listagem que procura exaustiva dos "blogs" barreirenses. Considero este contributo para a blogosfera local como uma interessante manifestação de interesse. Fica o registo e o "gancho", que é o que eu insisto por chamar ao "link".
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O cinema e o Liceu de Alexandre Herculano (LAH), no Porto

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Quando, nas recordações sobre "O Prelúdio", relembrei eu neste blog a malfadada mas interessante experiência de um "clube de cinema" no LAH, mal eu sabia que já muitos anos antes (1944) - e até referida como um precedente relevante na história do cineclubismo portuense - tinha aí decorrido por iniciativa de Hipólito Duarte Cardoso de Carvalho (1927-2002) uma notável experiência na mesma área cultural. Pois vem tudo isto relatado em
Certamente que é de ir lá ver. Esta Internet!!! Este LAH!!! Sensass!
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sexta-feira, 7 de abril de 2006

Os "trabalhos dos portugueses" junto a minas em Marrocos (2)

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"[...] A mina de Bleida vem sendo explorada para o cobre, dado o afloramento próximo de jazigos conhecidos desde tempos remotos, como uma das origens tradicionais do cobre do sul de Marrocos.
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Importantes explorações devem ter sido feitas pelos Almohadas (secs. XII e XIII) e devem datar desse período as duas aldeias cujos restos (numa das localizações com mais de 500 casas) que se encontram no topo quase inacessível de dois penhascos tipo "mesa", a Norte e a Sul das explorações. Essas ruínas são atribuídas "aos Portugueses". O ONA [1] pensa dar uma bolsa de arqueologia para o desenvolvimento do tema das antigas explorações; não deixa de ser interessante averiguar o papel dos Portugueses na mineração e metalurgia desta zona de Marrocos, pelo menos no sentido comercial em que se deve ter verificado a penetração [2]. A localização "castreja" ou mesmo "super-castreja" (passe o termo...) das povoações é atribuída à presença nesse tempo dos "bandidos do deserto", de facto incontroláveis: Bleida, como Imiter, ficava no percurso das caravanas. [...]"

Excerto do capítulo "Visita à mina de
cobre de Bleida", cf. anterior postagem,
1984
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Notas actuais:
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{1] Omnium Nord Africain, um importante grupo privado marroquino e, quando da visita, participante maioritário da sociedade concessionária de Bleida. Não sabemos se essa posição se mantém, como parece provável, e se o estudo então referido sobre as impressionantes ruínas (ainda mais impressionantes quando vistas de avião) foi entretanto executado.
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[2] Se é que existiu... mas que, a existir, seria de qualquer forma sempre posterior aos Almohadas!

quinta-feira, 6 de abril de 2006

Os "trabalhos dos portugueses" junto a minas em Marrocos (1)

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"[...] A mina [de prata de Imiter] era conhecida desde tempos muito antigos, dando lugar a uma exploração de jazigos aflorantes por trabalhos ainda visíveis que foram intensificados no período dos Almohadas (sec. XII-XIII). Pela sua importância na produção de prata, Imiter tornou-se ponto de passagem das caravanas que levavam o metal para a África Negra. Encontramos aqui a primeira referência aos "trabalhos dos portugueses", que se acentuaria em Bleida. Cremos tratar-se de uma atribuição passada em tradição oral, como entre nós ficou (talvez até com mais razão) a figura dos "trabalhos dos mouros" ou mesmo das "mouras encantadas"que guardam tesouros no fundo de poços ou de galerias ("minas") [...]"
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Excerto do capítulo "Visita da mina de prata de
Imiter" nas "Notas de Viagem da Deslocação a
Marrocos do Director Geral de Geologia e Minas,
de 18 a 26 de Novembro de 1984"

quarta-feira, 5 de abril de 2006

O adeus a Hans Castorp no fim de "A Montanha Mágica"

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Hans Castorp, curado (?), desce penosamente daquele Olimpo para se misturar "aos da planície". O genial Autor, Thomas Mann, brinca com o destinos dos homens e fá-lo encontrar um dos cavaleiros do Apocalipse, a Guerra, naquela que marcou verdadeiramente os tempos. Estupora-o mesmo, na sua humana natureza ao ponto de, na lama, em contraste com o ambiente mortalmente séptico no asséptico do abrigo que deixara lá cima, assistir ao esmagamento de dois camaradas em defesa do conceito de uma pátria que, no alto, quase esquecia já ter tido. E, também olimpicamente, o genial Autor, vai despedir-se definitivamente dele, Hans Castorp, e da sua obra, com as seguintes palavras finais:
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"E assim, no tumulto, na chuva, no crepúsculo, perdemo-lo de vista.
Adeus, Hans Castorp, bravo menino mimado da vida! A tua história terminou. Acabámos de contá-la. Não foi nem breve nem longa, é uma história hermética. Contámo-la por amor a ela mesma, não por amor a ti, porque tu eras simples. Mas, afinal, era a tua história, como te coube em sorte. Deves ter certas qualidades porque a viveste, não dissimulamos a simpatia pedagógica que, ao narrá-la, nutrimos por ti, e que seria capaz de induzir-nos a tocar delicadamente o canto de um olho com a ponta do dedo, ao pensar que nunca mais tornaremos a ver-te nem ouvir-te.
Adeus! Agora vais viver, ou morrer! Tens poucas probabilidades. Este baile macabro a que foste arrastado durará ainda alguns anos criminosos e não queremos apostar muita coisa na tua capacidade de escapar. Para falar com franqueza, não sentimos grandes escrúpulos ao deixar esta questão sem resposta. Certas aventuras da carne e do espírito, que educaram a tua simplicidade, permitiram-te vencer no domínio do espírito aquilo a que não escaparás certamente no domínio da carne. Momentos houve em que nos sonhos que tu "governavas", viste brotar da morte e da luxúria do corpo um sonho de amor. Será que dessa festa da morte, dessa perniciosa febre que incendeia à nossa volta o Céu desta noite chuvosa, também o amor surgirá um dia?"
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Thomas Mann,
"A Montanha Mágica"
Ed. "Livros do Brasil", Lisboa

terça-feira, 4 de abril de 2006

Tchekhov, contado por Marcelo Mastroiani


"Uma grandeza submissa
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«Está bem, admitamos lá que às vezes pode ser até necessário cortar florestas, mas porquê destruí-las todas? Morrem milhares de árvores, são destruídos os ninhos das aves, os refúgios dos animais; desaparecem para sempre paisagens maravilhosas: e tudo isso para quê? É preciso sermos bárbaros insensatos para queimarmos tanta beleza, para destruirmos o que não somos capazes de criar. O homem possui razão e força criativa para fazer aumentar o que lhe foi dado; contudo, até hoje, não fez mais que destruir. As florestas estão cada vez mais pequenas, os rios secam, a fauna silvestre desaparece; e a terra, dia após dia, torna-se cada vez mais pobre e árida.
Eh, tu estás a olhar para mim com ironia; o que eu digo, não achas nada sério. Sim, talvez seja extravagante, mas quando passo juntio duma floresta que salvei do machado, ou quando oiço sussurar a jovem floresta que plantei com as minhas mãos, eu sei que a bondade do clima também depende um pouco de mim, e que se o homem - daqui a mil anos - for feliz, um pouco deste mérito também será meu. Quando planto uma pequena bétula, e depois a vejo verdejar e embalar-se ao vento, a minha alma enche-se de orgulho.»
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Este era um monólogo do Dr. Astrov, no primeiro acto do Tio Vânia [1] de Tchekov. Quando o interpretei (mas isso foi há tantos anos!), tive uma paixão assolapada por Tchekhov. Depois, com o passar dos anos, este amor foi-se tornando cada vez mais importante, mais profundo.
Se calhar amo Tchekhov de um modo assim tão especial porque as suas personagens, os seus contos, se parecem com a vida. Ou se calhar correspondem melhor à minha natureza, e até à minha natureza de actor.
Gosto daquele pequeno mundo submisso, feito de personagens perdedoras, sempre, e plenas de entusiasmo, de sonhos, de ilusões - «A Moscovo! A Moscovo!», aonde nunca irão. E Vânia que diz: "Trabalhar, trabalhar - é o único recurso que tem o homem».
As suas estreitezas, os seus ciúmes, o seu ridículo: porque, na minha opinião, Tchekhov é o autor da «comédia à russa». Com efeito, não foi em vão que sempre escrveu aos actores, às actrizes, a quem representava as suas comédias: « Lembrem-se de que são comédias». Afinal na Europa, deste outro lado, Tchekhov tem sido representado em termos acima de tudo dramáticos. Há drama, claro que há; mas é um drama que toca o ridículo, que até faz rir. E esta creio que é a grandeza deste autos submisso. Shakespeare é grande, é enorme - mas os meios tons de Tchekhov, ao menos para mim, são mais emocionantes.
Estas personagens fantasiosas, inconcludentes, mergulhadas numa eterna e cobarde indecisão; criaturas estranhas, ao mesmo tempo vítimas e cúmplices do mundo que as rodeia: e precisamentee por isso testemunhas cépticas e sarcásticas - ou seja, dignas."
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Marcelo Mastroiani, "Eu lembro-me, sim, bem me lembro!"
(tradução por José Colaço Barreiros de "Mi ricordo, sì, io mi
ricordo"), Editorial Teorema, Lisboa, 1997,pp. 40 e 41 [2]
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[1] "Tio Vânia" dá, em russo, uma expressão extraordinariamente eufónica: "Diádia Vânia", passe a não-convencional transcrição. Não nos esquecendo nunca que Vânia em russo é Guilherme (William), [como Ivan é João, Iuri é Jorge, etc.] é interessante explorar uma certa coincidência com o "Old Father Williams" (muitas vezes traduzido em português como "Tio Guilherme"), figura recorrente de diversos poemas ingleses em que, com intuitos morais, um parente mais velho (pai, tio) fala com um jovem e lhe relata a retribuição da boa condução da sua vida - o que não o impede de estar velho, como o jovem lhe faz notar. O local
... Old_Father_Williams/FatherandSon
lista 15 poetas, 25 poemas e 5 posters, entre os quais Leonard Cohen em "Towers of Song", em que este refere Hank Williams (o que dá uma certa aproximação a Oncle Williams). Lewis Carroll, no Cap. 5º da "Alice no País das Maravilhas", faz a Alice recitar à Lagarta do Narguilé uma versão parodiada (no fim a Alice e a Lagarta concordam que a poesia já não é o que era...) da versão de Robert Southey, tida como original ("The Old Man's Confort and How He Gained Them"); ambas se encontram em
http://home.earthlink.net/~lfdean/carroll /parody/william.html.
A ideia também não é alheia ao "Father and Son" do tempo em que o "Gato Esteves" cantava.
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[2] Ainda de acordo com a afirmação do editor, quando Mastroiani, Marcelo (1924-1996), filmou, em Portugal, escassos meses antes de morre (19 de Dezembro de 1996, em Paris) "A Viagem ao Princípio do Mundo", de Manoel de Oliveira, a sua companheira Anna Maria Tatò realizou um filme- confissão com o título italiano referido supra e em que o admirável actor, "com 72 anos e depois de mais de 170 filmes", deixou uma inesquecível memória de si mesmo. O texto correspondente, de que apenas se deu um pequeno excerto seleccionado por quem gosta de Tchekhov, é um magnífico testemunho de quem foi Mastroiani.
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segunda-feira, 3 de abril de 2006

Como (parecer) ser jovem,,,

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(capa the "Chemical Market Reporter" de 27 de Março 2006)

Nota 1 - E andou o Ponce de León, na Florida, a provar todas as fontes, rios e córregos à procura da "Fonte da Eterna Juventude"! Coitado!

Nota 2 - Note-se o neologismo "cosmeceutico".

Nota 3 - O problema continua a estar nos pulsos!

domingo, 2 de abril de 2006

Como ser rico...

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Ir ao ouro à Califórnia
(por vezes ficar por lá)

sábado, 1 de abril de 2006

Abril

(dos meses, no missal antigo de Lorvão)