segunda-feira, 30 de junho de 2008

Apontamento fotográfico - 5 ("Le visiteur du soir")

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no Parque Biológico de Gaia, 24 Junho 2008
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domingo, 29 de junho de 2008

"Carta ao Bradesco"

Gravura de http://www.olsn.ca

Amigos brasileiros fizeram-me chegar o texto delicioso e didáctico que segue e que foi escrito a uma entidade bancária brasileira (o BRADESCO), muito a propósito das tabelas de serviços que os bancos cobram aos clientes que lá chegam, para além da inenarrável vantagem que é ter e poder aplicar dinheiro com o conhecido diferencial de taxas para quem lá o coloca e para quem dele precisa. Sendo verdade que algumas das situações relatadas não são exactamente as que aqui existem, não deixam de ser válidos os reparos para atitudes homólogas com rótulos diferentes. Como nos medicamentos, estas apresentações são genéricas. E há ainda situações escondidas, que também deveriam sair da casca: o desenvolvimento e fomento do denominado "capitalismo popular" (só denominado), que sustenta o imobiliário e nele mantém inclusa a sua vertente efectivamente especulativa, o apregoar de empréstimos ao consumo e de acesso facilitado num momento em que a realidade não seria mais do que o fomentar o aperto dos cintos, as sucessivas jeremiadas que destoam da verdade ao serem acompanhadas por lucros chorudos, a ameaça de repercutir noutras tabelas os tímidos cortes de unhas que, por demasiadamente e imoralmente longas, a acção legislativa tenta realizar aqui e além. É mesmo de os mandar para a floresta de Sherwood, em rota de colisão com um Robin Hood qualquer, mesmo cheirando a Gorgonzolla! Mas vamos à carta ao Bradesco, mantida a introdução e a grafia com que a recebi:

"CARTA AO BRADESCO *

**Esta carta foi enviada ao Banco Bradesco e devido à criatividade com que foi redigida, deveria ser direcionada a todas as instituições financeiras e outras como Semae, Sabesp, CPFL, Telefonica etc.... Temos que tirar o chapéu à criatividade da população brasileira, que apesar de ser altamente explorada, ainda arruma menções de bom humor....

É fantástico!!!!!!!

* CARTA ABERTA AO BRADESCO *

Senhores Diretores do Bradesco,

Gostaria de saber se os senhores aceitariam pagar uma taxa, uma pequena taxa mensal, pela existência da padaria na esquina de sua rua, ou pela existência do posto de gasolina ou da farmácia ou da feira, ou de qualquer outro desses serviços indispensáveis ao nosso dia-a-dia.

Funcionaria assim: Todo mês os senhores, e todos os usuários, pagariam uma pequena taxa para a manutenção dos serviços (padaria, feira, mecânico, costureira, farmácia etc). Uma taxa que não garantiria nenhum direito extraordinário ao pagante. Existente apenas para enriquecer os proprietários sob a alegação de que serviria para manter um serviço de alta qualidade.

Por qualquer produto adquirido (um pãozinho, um remédio, uns litros de combustível etc) o usuário pagaria os preços de mercado ou, dependendo do produto, até um pouquinho acima.

Que tal?

Pois, ontem saí de seu Banco com a certeza que os senhores concordariam com tais taxas. Por uma questão de equidade e de honestidade.

Minha certeza deriva de um raciocínio simples. Vamos imaginar a seguinte cena: eu vou à padaria para comprar um pãozinho. O padeiro me atende muito gentilmente. Vende o pãozinho. Cobra o embrulhar do pão, assim como, todo e qualquer serviço. Além disso, me impõe taxas. Uma "taxa de acesso ao pãozinho", outra "taxa por guardar pão quentinho" e ainda uma "taxa de abertura da padaria". Tudo com muita cordialidade e muito profissionalismo, claro.

Fazendo uma comparação que talvez os padeiros não concordem, foi o que ocorreu comigo em seu Banco.

Financiei um carro. Ou seja, comprei um produto de seu negócio. Os senhores me cobraram preços de mercado. Assim como o padeiro me cobra o preço de mercado pelo pãozinho.

Entretanto, diferentemente do padeiro, os senhores não se satisfazem me cobrando apenas pelo produto que adquiri.

Para ter acesso ao produto de seu negócio, os senhores me cobraram uma "taxa de abertura de crédito" - equivalente àquela hipotética "taxa de acesso ao pãozinho", que os senhores certamente achariam um absurdo e se negariam a pagar.

Não satisfeitos, para ter acesso ao pãozinho, digo, ao financiamento, fui obrigado a abrir uma conta corrente em seu Banco. Para que isso fosse possível, os senhores me cobraram uma "taxa de abertura de conta".

Como só é possível fazer negócios com os senhores depois de abrir uma conta, essa "taxa de abertura de conta" se assemelharia a uma "taxa de abertura da padaria", pois, só é possível fazer negócios com o padeiro depois de abrir a padaria.

Antigamente, os empréstimos bancários eram popularmente conhecidos como "Papagaios". Para liberar o "papagaio", alguns gerentes inescrupulosos cobravam um "por fora", que era devidamente embolsado. Fiquei com a impressão que o Banco resolveu se antecipar aos gerentes inescrupulosos. Agora ao invés de um "por fora" temos muitos "por dentro".

- Tirei um extrato de minha conta - um único extrato no mês - os senhores me cobraram uma taxa de R$ 5,00.

- Olhando o extrato, descobri uma outra taxa de R$ 7,90 "para a manutenção da conta" - semelhante àquela "taxa pela existência da padaria na esquina da rua".

- A surpresa não acabou: descobri outra taxa de R$ 22,00 a cada trimestre - uma taxa para manter um limite especial que não me dá nenhum direito. Se eu utilizar o limite especial vou pagar os juros (preços) mais altos do mundo. Semelhante àquela "taxa por guardar o pão quentinho".

Mas, os senhores são insaciáveis. A gentil funcionária que me atendeu, me entregou um caderninho onde sou informado que me cobrarão taxas por toda e qualquer movimentação que eu fizer.

Cordialmente, retribuindo tanta gentileza, gostaria de alertar que os senhores esqueceram de me cobrar o ar que respirei enquanto estive nas instalações de seu Banco.

Por favor, me esclareçam uma dúvida: até agora não sei se comprei um financiamento ou se vendi a alma?

Depois que eu pagar as taxas correspondentes, talvez os senhores me respondam informando, muito cordial e profissionalmente, que um serviço bancário é muito diferente de uma padaria. Que sua responsabilidade é muito grande, que existem inúmeras exigências governamentais, que os riscos do negócio são muito elevados etc e tal. E, ademais, tudo o que estão cobrando está devidamente coberto por lei, regulamentado e autorizado pelo Banco Central.

Sei disso.

Como sei, também, que existem seguros e garantias legais que protegem seu negócio de todo e qualquer risco. Presumo que os riscos de uma padaria, que não conta com o poder de influência dos senhores, talvez sejam muito mais elevados.

Sei que são legais.

Mas, também sei que são imorais. Por mais que estejam garantidas em lei, tais taxas são uma imoralidade.

Brasília, 30 de maio de 2006. *

Delman Ferreira
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delman@senado.gov.br"

E pronto. Esta carta recordou-me uma outra, famosa, do Eça, quando lhe cortaram a água. Talvez um dia a traga aqui.
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sábado, 28 de junho de 2008

Apontamento fotográfico - 4 (O mochinho desastrado)

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Chegou devidamente confinado, com guia e tudo, sob escolta da GNR. Tinha caído do ninho, na tentativa desastrada dos primeiros voos, e, embora a mãe o pudesse alimentar, o risco dos predadores que por aí andam, quadrúpedes e bípedes, justificou avisadamente que fosse transportado ao Parque Biológico de Gaia (local a visitar!), para ser assistido no respectivo Centro de Recuperação de Animais, onde diariamente "desaguam" acidentados de várias espécies e feitios. Vinha certamente amedrontado, naquela caixa incómoda de cartão, mantendo muito embora o olhar inteligente que caracteriza todos os mochos, mesmo quando bébés e aflitos. Mas a aventura não acabará mal: dentro de dias voará e retomará a Natureza. Será mocho adulto. Registe-se que esta minha curiosidade e entusiasmo se justifica: quanto a mochos e não só, sou - de há muito - reconhecidamente parcial.

sexta-feira, 27 de junho de 2008

Apontamento fotográfico - 3 (Saramagos)

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Local: Mora

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quinta-feira, 26 de junho de 2008

Apontamento fotográfico - 2 (Lírio dos campos)

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Local: Mora

quarta-feira, 25 de junho de 2008

Apontamento fotográfico - 1

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Local: Lavradio
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terça-feira, 24 de junho de 2008

A S. João Baptista

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A quadra que se segue, de homenagem ao Santo, consta do artigo "O Folclore", da autoria de L.M., a pag. 2 do jornal "Defesa de Arouca" nº 459, de 6 de Junho de 1964; a sua autoria é aí atribuída ao "poeta de Coimbra, analfabeto e sem pão":
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"S. João, reparem nisto,
Teve este grande condão:
Ao baptizar Jesus Cristo
Foi quem fez Cristo cristão."
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Imagem de: www.terrabrasileira.net/folclore/manifesto/cantores/s-joao.jpg
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segunda-feira, 23 de junho de 2008

Noite de S.João no Porto... há quantos anos!

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Foto: já histórica, em http://galerias.escritacomluz.com/cromao/albums/CidadeSurpreendente/ahm.jpg
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domingo, 22 de junho de 2008

Ainda os "nanotubos": o elevador espacial

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O elevador espacial [1]

Para além do documentado comentário de "Denudado", identificado a tempo na respectiva postagem, devo e agradeço a um anónimo visitante deste "blogue" um outro contributo valioso relativamente à postagem de 24 de Maio de 2008, intitulada "Da bola de futebol aos nanotubos". Assim, a 13 do corrente, esse visitante anónimo inseriu em comentário, e sem mais palavra, o endereço do local
http://www.seed.slb.com/pt/scictr/watch/elevator/build.htm .

Esta remissão tem um duplo interesse: o primeiro é dar a conhecer o local de origem
http://www.seed.slb.com/pt/scictr/watch/index.htm
privativo do "SEED - Um programa Schlumberger de desenvolvimento comunitário sem fins lucrativos" no seu apartado "De Olho na Ciência: A ciência utilizada no mundo real por pessoas reais". Logo aí se encontram interessantes rubricas a explorar (e também acesso a rubricas anteriores), repartidas por 5 secções permanentes. Cito, neste momento: "Pensando como um computador" (na secção "Inventando o Nosso Mundo"), "Ciência na Casa de Banho" (na secção "Ciência Dia a Dia"), "O Caminho de Santiago de Compostela" (na secção "O Homem em Movimento"), "Energia e Mudança de Clima Global" (na secção "De Olho na Terra") e "Elevador Espacial: Imagine..." (na secção "De Olho no Ar e no Espaço"). Resumindo: um cardápio bem recheado e um "local" certamente a inventariar entre os muitos caminhos úteis que a "net" permite percorrer.

É precisamente neste último artigo que reaparecem os nanotubos. Explique-se sumariamente: pense-se, por muito fantástica que possa parecer, a possibilidade de estabelecer um cabo permanente entre um ponto na superfície da terra e um satélite geoestacionário inicialmente a 35000 km de altitude, mas podendo chegar a 100000 km. Utilidade: base espacial acessível, centro permanente de investigação, localização... turística. Segundo o artigo, a primeira forma deste "sonho" remontará ao pioneiro russo da exploração espacial, Konstantin Tsiolkolvski, que em 1895 se "impressionou" com a construção da torre Eiffel. A ideia ressuscita em 1975 com um artigo do americano Jerome Pearson que, por sua vez, inspira o autor de FC Arthur C. Clark a escrever a obra "The Fountains of Paradise" (1978) [2]. Júlio Verne ficaria encantado!

É evidente a dificuldade actual de, em termos de materiais correntes, conceber o cabo resistente, flexível e leve que permitisse concretizar um tal sonho. E é assim que, numa segunda página do mesmo artigo ("Construa o elevador espacial"), surge a referência aos nanotubos, descobertos em 1991. Citando a elevada resistência que estes podem permitir ["um fio de nanotubo de cerca de metade do diâmetro de um lápis é capaz de suportar o peso de 20 carros (40.000 kg)"], o artigo aponta-os como um "material possível" para uma tal cavalgada no futuro. Não escondendo que a produção de nanotubos em massa está ainda longe, aceita porém a ideia de um "rápido progresso" nesta matéria. O artigo prossegue com a sugestão construtiva - nada susceptível de realizar na varanda, mas que permite olhar o céu.

Na verdade, com todas as reservas que naturalmente se podem pôr a esta concepção imaginativa, o essencial da mensagem está na noção das excepcionais propriedades que são admitidas para estes novos materiais. Aí - e como se procurou já figurar na postagem de 24 de Maio último - está a abrir-se uma porta para um futuro insondável, que legitima viajar na dimensão do sonho.

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[1] A publicação desta postagem foi prevista e anunciada algures para 20 de Junho, mas por razões técnicas de chuta-na-bola-que-já-fostes e do astro-rei andar acima e abaixo só agora sai.

[2] "Fontes do Paraíso", editado em Portugal em 1990 pelas Edições 70 como nº 1 da sua "colecção Orion - FC". O "romance" conta a história de um empreendedor que concebe o "elevador espacial", estabelecido sobre a Taprobana (ah, Luís Vaz!!!) ao longo de um "fio de diamante" (não estamos mal... carbono é carbono) mas que, para a realização do mesmo, com uma equipe diversificada a seu lado, tem de afrontar a encarniçada resistência de políticos, militares, religiosos e da própria natureza.
Imagem: do site SMS referido
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sábado, 21 de junho de 2008

Num restaurante suburbano... com referência ao solstício

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Arroz! Se for mesmo aqui, vai ser preciso empurrar o autocarro mais um bocadinho! [1]

Assistência empolgada pelo arrasador Turquia-Croácia, num écran enorme de plasma. É a noite do arrefecimento de todas as comidas, enquanto as bojecas essas vão avançando no alinhar de garrafas - com a nota positiva de, pelo menos ali e para aquela assistência, o Euro 2008 não estar ainda acabado. Entra um sócio, pelos vistos desambientado ainda, e dirige-se para a turma que, numa mesa, esbugalha os olhos:
- Eh, Manel, como é isto?
- Não tem que saber! Está tudo ainda empatado e são todos Bês: os turcos estão à Benfica e os croatas são uma mistura de Belenenses com o Boavista! Senta-te aí!

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A propósito ou a despropósito, tanto faz: hoje, dia 21, às 0 horas e 59 minutos para Portugal, o Sol (onde estiver nessa altura...) interrompe o seu movimento ascendente - e os dias começam a diminuir. É o solstício de Verão [2]. Como já se disse aqui algures, mas que (felizmente) permanece como ciclicamente renovada verdade verdadinha, vem aí outra vez o Natal - agarrado esse ao outro solstício. Falta só meio-ano! O tempo é mesmo a maior vingança para aqueles que pensam enganá-lo!
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[1] E animem-se as hostes, porque entretanto há um Mundial cujo largo processo, segundo creio, começa a tramitar-se já daqui a um mês ou à volta disso - ou, para nós, mesmo antes, dada a nossa melindrosa e scolaríssima situação de sede vacante.
[2] O presente rodapé é um acréscimo feito "a tempo", à laia de actualização. Uma das minhas fieis Leitoras (e salutarmente crítica) assinala-me que eu deveria explicitar melhor que "aqui começa o Verão". É verdade! Mas convém salientar, para quem me conheça menos bem quanto a preferências sasonais, que para mim o Verão preferido é mesmo o do Vivaldi.
Imagem: apud http://wroclawzwyboru.blox.pl/resource/euro2012PU.jpg
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sexta-feira, 20 de junho de 2008

A armação ruiu...


... voltemos ao real.
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quinta-feira, 19 de junho de 2008

Que transporte público de X para Y?

Não vou referir-me à recente experiência com o transporte rodoviário de mercadorias: o precedente chileno existiu e não deve ser esquecido na Europa [1]. Vou, antes, registar aqui quão surpreendente é a dificuldade que se defronta ao pretender estudar a melhor forma de, em Portugal, chegar de X a Y usando transportes rodoviários regulares de passageiros - nomeadamente quando existem todas as razões actuais e futuras para se valorizar, inclusive em termos de turismo, um aumento do transporte colectivo relativamente ao uso do "carrinho" próprio. Procure-se resolver essas questões através do instrumento actual que é a "net" e, salvo óbvias excepções bem sucedidas, facilmente se encontram inesperados "buracos negros" de informação - e, por vezes, onde menos se espera. Essencialmente falta:
  • Da parte de muitas transportadoras rodoviárias regulares: a publicitação em portal próprio e se possível com conteúdos homogéneos, dos horários, das condições do transporte (preços, locais de embarque e outros dados), para já não falar na gradual possibilidade de aquisição pela "net" de bilhetes de viagem, que nem todas as transportadoras estarão em condições de imediatamente montar [2];
  • Da parte dos portais das localidades, em especial no referente aos portais autárquicos: a publicitação dos transportes (aéreo doméstico, ferroviário ou rodoviário regular que servem a localidade descrita e de "links" aos respectivos portais;
  • Da parte das autoridades licenciadoras de transportes públicos (ao nível nacional, regional ou distrital): "montagem" de um local interactivo que permita, localizando o local de partida e o de chegada, indicar quais as modalidades de transporte público (aéreo doméstico, ferroviário, rodoviário regular , etc.) mais eficazes para fazer essas ligações. [3]
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[1] Relembro aqui a frase de Comte que especialmente aprecio e que, por isso, já trouxe a este blog pelo menos a 2 de Junho de 2006: "science d'où prevoyance; prevoyance d' où action"
[2] Não se inclui, em especial, o caso dos transportes ferroviários porque o portal da CP é, de facto, um excelente exemplo.
[3] Um rápido inquérito a algumas pessoas amigas e viajadas e uma busca na "net" (nomeadamente no conceito "what bus?") demonstra que, como em tudo, há países organizados e países desorganizados, regiões organizadas e regiões desorganizadas. Há inclusive "jogos de autocarro" ("bus games") que - numa das modalidades possíveis - correspondem a estabelecer itinerários!
Imagem: cortesia a fumosh.files.wordpress.com

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quarta-feira, 18 de junho de 2008

Apenas passeando...

No correio electrónico do ultimo fim de semana recebi três surpresas. Compartilho-as.


Lamento só agora ter abordado com interesse a expressão artística quer de Vladimir Kush, um artista russo actualmente radicado nos EUA (que aliás já vi algures confundido com outros surrealistas), quer de Michael Parkes (convém explorar completamente o portal aberto pela ligação); quanto às esculturas de metal, não consegui aprofundar a sua autoria - mas a apresentação pps é deveras interessante (incluindo a música).

terça-feira, 17 de junho de 2008

Memória de Indústria: 13 - As duas chaminés-viúvas do Barreiro (área Norte)

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Foto: 080613

segunda-feira, 16 de junho de 2008

A uma flor anódina (a caminho do supermercado)


Philip Jose Farmer, autor de FC, divertiu-se na descrição de formas estranhas de amor no Cosmos dentro do princípio de que uma afeição é uma expressão de vida. São Francisco de Assis dava irmandade às feras. Nós temos afecto a um gato, a um cão, a uma árvore. Por vezes mais sólido que a um semelhante, já que desse esperamos entendimento. Se nos animais essa manifestação pode ser retribuída, pouco sobre isso nos diz o que sabemos da vida das plantas. Porque não registar na memória uma flor pequena, que é a expressão de uma planta anual que nasceu há um escasso mês e que, cumprida humildemente a sua missão, vai para sempre fechar-se dentro de dias - entrando no "never more" que acompanha especificamente cada um de cada um dos seres vivos? Vale a pena. Nunca saberemos se a planta disso por qualquer forma saberá e se isso por qualquer forma agradece. Seja um acto unilateral, como uma mirada. Para o ano virão outras. Iguais, mas não as mesmas.

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domingo, 15 de junho de 2008

Quando o telefone toca...

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Nunca vi tanto interesse como ultimamente em me fazerem estranhas chamadas telefónicas - que mantém praticamente um perfil idêntico, ainda que com algumas diferenças estruturais. Todos me vêm oferecer coisas, todos me vêm trazer vantagens, todos se preocupam com a extensão do meu agregado familiar, se me desloco ou não em automóvel, se viajo ou se compro livros. Mas, de entre estas, existe um primeiro tipo que provém de "entidades-chagas" habituais, através de pessoas colocadas num "call center" e a que eu respondo com uma total reserva, mas em que pretendo guardar um mínimo de simpatia recordando que aquelas vozes traduzem necessidades precárias de "fazer o deles", muitas das vezes provindo de jovens que - após um curso prometidamente prometedor - verificaram que isso para nada lhes servia, outras vezes de pessoas igualmente necessitadas que neste universo de desclassificação laboral (e depois queixem-se!) só encontraram aquela porta aberta. Esse tipo de interlocutores corresponde, frequentemente, a campanhas por qualquer forma publicitadas e, portanto, expectáveis. Despacho-os simpaticamente, não dou dados nenhuns... e disse. São pacíficos.

Mas eis que agora aparece uma nova modalidade, mais agressiva. Telefona um senhor X, bem falante, que no seu palrar não denuncia o debitar qualquer formulário escrito ou encornado, e que começa por afirmar que participa numa importante campanha nacional para a prevenção de doenças do foro Y (campanha de que nunca ouvi falar) e que dentro desse programa me vem oferecer, inteiramente gratuito, um equipamento que não identifica mas que me acompanhará como meio preventivo ou anunciador de associados males. Pausa no discurso. Se o interlocutor, neste caso eu, toma a palavra e pergunta exactamente o que é e donde vem, o dito sujeito diz que vai já explicar mas que, antes, precisa de coligir alguns dados: nome, idade, profissão, composição do agregado familiar... e mais não disse, porque foi-lhe então liminarmente cortado o pio com a afirmação peremptória de "não dou qualquer dessas informações a entidades que não conheço e muito menos pelo telefone."

Aqui cai o Carmo e a Trindade: o cavalheiro, falando de cima da burra, recorda estar acreditado para participar numa campanha nacional destinada a afastar uma importante causa de morte na Europa (e, claro, entre nós...), anuncia a minha imediata perda do direito ao aparelho (que continua a não mencionar o que é, mas que lhe faça bom proveito o anúncio!) e lamenta acusatoriamente a minha manifesta recusa de colaboração - num discurso todo ele de pretensa autoridade. Vai pela fresca! Eu afirmo acompanhar o seu lamento, ponho "ponto final" com um também peremptório "É assim e mais nada!" e - educadamente, para não lhe sugerir possíveis localizações para o misterioso e gratuito aparelho ou uma visita ao cesto da gávea - corto cerce a chamada!

Ainda na semana que passou os jornais, relatando a detenção de activos autores de rentáveis burlas informáticas, informavam detalhadamente o que é "phishing" (e tanto que esta modalidade já por aí andou), o "pharming" e o "vishing", a que se deve acrescentar o "smishing" [1] - modernas sacanices para vitimizar quem anda na web (ou, quanto às duas ultimas, quem tem telefone). É da mais salutar profilaxia ir à "Wikipedia" ler os detalhados artigos descritivos que, sobre estas, lá se encontram. Podendo não caber exactamente em nenhuma das referidas modalidades telefónicas, mas podendo vir a sê-lo, quaisquer ofensivas telefónicas de acesso a dados pessoais por parte de remetentes não credíveis (uma voz de interlocutor que se desconhece e que se identifica com um incontrolável nome não é certamente uma forma credível) trazendo o engodo de programas de saúde ou de viagens ou de outros propósitos, apregoando "valiosas ofertas" não solicitadas e sugerindo contactos urgentes para o número de telefone Z ou o endereço electrónico T são de frontalmente rejeitar porque cheiram imediata e fortemente a esturro.

Ó se cheiram!

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[1] Para demonstrar o nosso relativo atraso nestas matérias, o que não é bom pois permite-nos constituir (como noutras coisas) "amplo terreno de engodo", faltava enunciar nessas notícias o tal "smishing" i.e. um idêntico mecanismo de burla que recorre a mensagens sms. Veja-se também a Wikipedia quanto a este tipo de malandragem.
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Imagem
: cortesia a www.indigo.com.mx

sábado, 14 de junho de 2008

E, já que estamos em maré de parabéns....

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... faria hoje 8o anos!

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sexta-feira, 13 de junho de 2008

Parabéns, Engenheiro Álvaro de Campos: 120 anos é obra! Pêsames, Europa!

Álvaro de Campos, por Almada Negreiros (fragmento)
Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (1958).


Álvaro de Campos: "Ultimatum"


"Mandado de despejo aos mandarins da Europa! Fora.
Fora tu, Anatole-France, Epicuro de farmacopeia-homeopática, ténia-Jaurès do Ancien-Régime, salada de Renan-Flaubert em louça do século dezassete, falsificada!
Fora tu, Maurice-Barrès, feminista da Acção, Chateaubriand de paredes nuas, alcoviteiro de palco da pátria de cartaz, bolor da Lorena, algibebe dos mortos dos outros, vestindo do seu comércio!
Fora tu, Bourget das almas, lamparineiro das partículas alheias, psicólogo de tampa de brasão, reles snob plebeu, sublinhando a régua de lascas os mandamentos da lei da Igreja!
Fora tu, mercadoria Kipling, homem-prático do verso, imperialista das sucatas, épico para Majuba e Colenso, Empire-Day do calão das fardas, tramp-steamer da baixa imortalidade!
Fora! Fora!
Fora tu, George-Bernard-Shaw, vegetariano do paradoxo, charlatão da sinceridade, tumor frio do ibsenismo, arranjista da intelectualidade inesperada, Kilkenny-Cat de ti próprio, Irish-Melody calvinista com letra da Origem-das-Espécies!
Fora tu, H. G. Wells, ideativo de gesso, saca-rolhas de papelão para a garrafa da Complexidade!
Fora tu, G. K. Chesterton, cristianismo para uso de prestidigitadores, barril de cerveja ao pé do altar, adiposidade da dialéctica cockney com o horror ao sabão influindo na limpeza dos raciocínios!
Fora tu, Yeats da céltica-bruma à roda de poste sem indicações, saco de podres que veio à praia do naufrágio do simbolismo inglês!
Fora! Fora!
Fora tu, Rapagnetta-Annunzio, banalidade em caracteres gregos, «D. Juan em Pathmos» (solo de trombone)!
E tu, Maeterlinck, fogão do Mistério apagado!
E tu Loti, sopa salgada fria!
E finalmente tu, Rostand-tand-tand-tand-tand-tand-tand-tand!
Fora! Fora! Fora!
E se houver outros que faltem, procurem-nos por aí pra um canto!
Tirem isso tudo da minha frente!
Fora com isso tudo! Fora!
Ai! que fazes tu na celebridade, Guilherme-Segundo da Alemanha, canhoto maneta do braço esquerdo, Bismarck sem tampa a estorvar o lume?!
Quem és tu, tu da juba socialista, David-Lloyd-George, bobo de barrete frígio feito de Union Jacks?!
E tu, Venizelos, fatia de Péricles com manteiga, caída no chão de manteiga para baixo?
E tu, qualquer outro, todos os outros, açorda Briand-Dato. Boselli da incompetência ante os factos todos os estadistas pão-de-guerra que datam de muito antes da guerra! Todos! todos! todos! Lixo, cisco, choldra provinciana, safardanagem intelectual!
E todos os chefes de estado, incompetentes ao léu, barris de lixo virados para baixo à porta da Insuficiência da Época!
Tirem isso tudo da minha frente!
Arranjem feixes de palha e ponham-nos a fingir gente que seja outra!
Tudo daqui para fora! Tudo daqui para fora!
Ultimatum a eles todos, e a todos os outros que sejam como eles todos!
Senão querem sair, fiquem e lavem-se.
Falência geral de tudo por causa de todos!
Falência geral de todos por causa de tudo!
Falência dos povos e dos destinos — falência total!
Desfile das nações para o meu Desprezo!
Tu, ambição italiana, cão de colo chamado César!
Tu, «esforço francês», galo depenado com a pele pintada de penas! (Não lhe dêem muita corda senão parte-se!)
Tu, organização britânica, com Kitchener no fundo do mar mesmo desde o princípio da guerra!
(It 's a long, long way to Tipperary and a jolly sight longer way to Berlin!)
Tu, cultura alemã, Esparta podre com azeite de cristismo e vinagre de nietzschização, colmeia de lata, transbordamento imperialóide de servilismo engatado!
Tu, Áustria-súbdita, mistura de sub-raças, batente de porta tipo K!
Tu, Von Bélgica, heróica à força, limpa a mão à parede que foste!
Tu, escravatura russa, Europa de malaios, libertação de mola desoprimida porque se partiu!
Tu, «imperialismo» espanhol, salero em política, com toureiros de sambenito nas almas ao voltar da esquina e qualidades guerreiras enterradas em Marrocos!
Tu, Estados Unidos da América, síntese-bastardia da baixa-Europa, alho da açorda transatlântica nasal do modernismo inestético!
E tu, Portugal-centavos, resto da Monarquia a apodrecer República, extremaunção-enxovalho da Desgraça, colaboração artificial na guerra com vergonhas naturais em África!
E tu, Brasil, «república irmã», blague de Pedro-Álvares-Cabral, que nem te queria descobrir!
Ponham-me um pano por cima de tudo isso!
Fechem-me isso à chave e deitem a chave fora!
Onde estão os antigos, as forças, os homens, os guias, os guardas?
Vão aos cemitérios, que hoje são só nomes nas lápides!
Agora a filosofia é o ter morrido Fouillée!
Agora a arte é o ter ficado Rodin!
Agora a literatura é Barrès significar!
Agora a crítica é haver bestas que não chamam besta ao Bourget!
Agora a política é a degeneração gordurosa da organização da incompetência!
Agora a religião é o catolicismo militante dos taberneiros da fé, o entusiasmo cozinha-francesa dos Maurras de razão-descascada, é a espectaculite dos pragmatistas cristãos, dos intuicionistas católicos, dos ritualistas nirvânicos, angariadores de anúncios para Deus!
Agora é a guerra, jogo do empurra do lado de cá e jogo de porta do lado de lá!
Sufoco de ter só isto à minha volta!
Deixem-me respirar!
Abram todas as janelas!
Abram mais janelas do que todas as janelas que há no mundo!"

Álvaro de Campos [Fernando Pessoa, claro...]
in "Portugal Futurista", nº único, 1917

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Um "a tempo" europeu do bloguista (e ao gosto do dia!):

A "verde Erin" deixou a Europa lívida. E isso porque muitos preferiram ficar em casa, claro (ao menos votassem contra, mas aparecessem). "Personalidade forte!", dirão uns. "O tanas!", dirão outros". "Eu sempre disse que os olhinhos deles estão do outro lado do Atlântico e é daí que veio o tal milagre!", dirão terceiros. "Gangs de New York ou do pitról a esfregarem as manápulas, por trás disto tudo", dirão quartos. "Mas eles nem estão a jogar!" - dirá o mais confundido com o verde dos estádios. Esta Europa, de auto-fustigação em auto-fustigação, faz cada vez mais recordar as cidades gregas, Alexandre dixit. Chiça! Muita razão tinha o Engenheiro ao escrever tudo aquilo que aqui está em cima, em 1917, entre a Cova e o Smolny e em plena "mãe de todas as guerras" (Saddam não patenteou a frase e, ainda por cima, errou no tempo! Mas até teve uma "associação de amigos" que hoje, portuguêsmente, assobiam para o ar.)
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quinta-feira, 12 de junho de 2008

Um aviso!

Igreja de Santo António em Lisboa, na homónima praça:
para celebrar a véspera do Santo e dizer que a pichagem estava no lado fronteiro desta

Em 1975 ou 1976, cartaz num cunhal da Calçada do Correio Velho, à Praça de Santo António, em Lisboa, a propósito duma anunciada greve dos padeiros:

"Senhores Padeiros,
Com o pão não se brinca
e muito menos com o Povo!"

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quarta-feira, 11 de junho de 2008

"Adubai com Nitrato do Chile"

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Era o que havia antes da síntese do amoníaco e da produção de cianamida cálcica... e das nitreiras. Deu origem a uma guerra na América do Sul, já aqui falada. O seu anúncio, por vezes em azulejos, ainda se encontra por aí. E o nitrato não servia apenas para adubos...
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Por isso, quando Haber e Bosch conseguiram combinar o azoto e o hidrogénio para formar amoníaco, a pressões e temperaturas elevadas e na presença de um catalisador de ferro, (1909-1910), a Alemanha deixou de estar dependente dos carregamentos de nitrato, explorado no Chile por interesses ingleses e transportado em navios que dobravam o Cabo Horn e exibiam a sua vulnerabilidade numa longuíssima rota atlântica. [1]
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A solução para a dependência e os seus riscos passa muitas vezes pela inovação, como no presente caso, mas obriga sobretudo a um rigoroso e completo planeamento - que necessariamente incluirá os transportes. Uma sociedade nacional não pode dormir na forma, nem ser apanhada com as calças na mão em matéria de abastecimentos críticos, nem deixar de inventariar todas as vulnerabilidades - reais ou e/ou potenciais - internas e externas.
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Fica-lhe mal e acaba por pagar caro, se assim não for. "Urbi et orbi!"
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Que aprendamos!
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[1] A vitória sobre a dependência tem também a sua face negativa: dada a necessidade de nitratos para a indústia de explosivos e a via independente de obtenção destes que o processo Haber-Bosch vinha permitir, há quem opine que - sem esse processo - nunca os Impérios Centrais se teriam aventurado a desencadear a grande hecatombe que foi a 1ª Guerra Mundial (1914-1918).
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terça-feira, 10 de junho de 2008

Memória de Indústria: 12 - Mina do Lousal

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Depósito de Ar Comprimido - Construção Rebitada

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segunda-feira, 9 de junho de 2008

Ilustradores famosos dos EUA: 17. Rockwell Kent (1882-1971)

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Rockwell Kent, "O início de Novembro no Norte da Groenlândia"

Rockwell Kent (1882-1971): gravador, ilustrador de obras relativas a viagens e também às próprias e múltiplas viagens, pintor, muralista. As suas opções políticas declaradamente de esquerda numa sociedade estruturalmente tão conservadora quanto a americana, no ambiente em que se moveu, determinaram da parte desta as respostas e atitudes que caracterizam as sociedades conservantistas, seja de que bandeira ou cor forem. Prémio Lenine da Paz em 1967. Veja-se a desenvolvida biografia divulgada pela Universidade Estadual de Nova Iorque em:

domingo, 8 de junho de 2008

Oito (e "noves fora, oito")

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Centaurea cyanus (como sempre)

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sábado, 7 de junho de 2008

António Machado: "Del Pasado Efímero"

António Machado[1]

DEL PASADO EFÍMERO

Este hombre del casino provinciano
que vio a Carancha recibir un día,
tiene mustia la tez, el pelo cano,
ojos velados por melancolía;
bajo el bigote gris, labios de hastío,
y una triste expresión, que no es tristeza,
sino algo más y menos: el vacío
del mundo en la oquedad de su cabeza.

Aún luce de corinto terciopelo
chaqueta y pantalón abotinado,
y un cordobés color de caramelo,
pulido y torneado.
Tres veces heredó; tres ha perdido
al monte su caudal; dos ha enviudado.

Sólo se anima ante el azar prohibido,
sobre el verde tapete reclinado,
o al evocar la tarde de un torero,
la suerte de un tahúr, o si alguien cuenta
la hazaña de un gallardo bandolero,
o la proeza de un matón, sangrienta.

Bosteza de política banales
dicterios al gobierno reaccionario,
y augura que vendrán los liberales,
cual torna la cigüeña al campanario.

Un poco labrador, del cielo aguarda
y al cielo teme; alguna vez suspira,
pensando en su olivar, y al cielo mira
con ojo inquieto, si la lluvia tarda.

Lo demás, taciturno, hipocondriaco,
prisionero en la Arcadia del presente,
le aburre; sólo el humo del tabaco
simula algunas sombras en su frente.

Este hombre no es de ayer ni es de mañana,
sino de nunca; de la cepa hispana
no es el fruto maduro ni podrido,
es una fruta vana
de aquella España que pasó y no ha sido,
esa que hoy tiene la cabeza cana.

António Machado
(Sevilha, 1875; Collioure, no exílio, 1939)

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[1] foto em http://www.poesia-inter.net/machado.htm

sexta-feira, 6 de junho de 2008

Um texto de Leonardo Boff: "Quatro "erres" contra o consumismo "

Da escritora brasileira Urda Alice Klueger, recebi o seguinte texto do teólogo Leonardo Boff (ambos já aqui referidos), que aborda um problema crucial do mundo de hoje. Caracterizando cruelmente a "alienação pelo objecto", que Marx havia já denunciado (e que está presente em muitos ensinamentos filosóficos e religiosos anteriores), LeBoff atinge uma questão extremamente séria da nossa vida: muitos de nós têm muito, muitos de nós querem constantemente ter mais, muitos de nós não são felizes na contínua ganância do ter, muitíssimos de nós não são felizes porque absolutamente não tem.

Quatro “erres” contra o consumismo

A fome é uma constante em todas as sociedades históricas. Hoje, entretanto, ela assume dimensões vergonhosas e simplesmente cruéis. Revela uma humanidade que perdeu a compaixão e a piedade. Erradicar a fome é um imperativo humanístico, ético, social e ambiental. Uma pré-condição mais imediata e possível de ser posta logo em prática é um novo padrão de consumo.

A sociedade dominante é notoriamente consumista. Dá centralidade ao consumo privado, sem auto-limite, como objetivo da própria sociedade e da vida das pessoas. Consome não apenas o necessário, o que é justificável, mas o supérfluo, o que questionavel. Esse consumismo só é possível porque as políticas econômicas que produzem os bens supérfluos são continuamente alimentadas, apoiadas e justificadas. Grande parte da produção se destina a gerar o que, na realidade, não precisamos para viver decentemente.

Como se trata do supérfluo, recorrem-se a mecanismos de propaganda, de marketing e de persuasão para induzir as pessoas a consumir e a fazê-las crer que o supérfluo é necessário e fonte secreta da felicidade.

O fundamental para este tipo de marketing é criar hábitos nos consumidores a tal ponto que se crie neles uma cultura consumista e a necessidade imperiosa de consumir. Mais e mais se suscitam necessidades artificiais e em função delas se monta a engrenagem da produção e da distribuição. As necessidades são ilimitadas, por estarem ancoradas no desejo que, por natureza, é ilimitado. Em razão disso, a produção tende a ser também ilimitada. Surge então uma sociedade, já denunciada por Marx, marcada por fetiches, albarrotada de bens supérfluos, pontilhada de shoppings, verdadeiros santuários do consumo, com altares cheios de ídolos milagreiros, mas ídolos, e, no termo, uma sociedade insatisfeita e vazia porque nada a sacia. Por isso, o consumo é crescente e nervoso, sem sabermos até quando a Terra finita aguentará essa exploração infinita de seus recursos.

Não causa espanto o fato de o Presidente Bush conclamar a população para consumir mais e mais e assim salvar a economia em crise, lógico, à custa da sustentabilidade do planeta e de seus ecossistemas. Contra isso, cabe recordar as palavras de Robert Kennedy, em 18 de março de 1968: ”Não encontraremos um ideal para a nação nem uma satisfação pessoal na mera acumulação e no mero consumo de bens materiais. O PIB não contempla a beleza de nossa poesia, nem a solidez dos valores familiares, não mede nossa argúcia, nem a nossa coragem, nem a nossa compaixão, nem a nossa devoção à pátria. Mede tudo menos aquilo que torna a vida verdadeiramente digna de ser vivida”. Três meses depois foi assassinado.

Para enfrentar o consumismo urge sermos conscientemente anti-cultura vigente. Há que se incorporar na vida cotidiana os quatro “erres”reduzir os objetos de consumo, reutilizar os que já temos usado, reciclar os produtos dando-lhes outro fim e finalmente rejeitar o que é oferecido pelo marketing com fúria ou sutilmente para ser consumido.

Sem este espírito de rebeldia consequente contra todo tipo de manipulação do desejo e com a vontade de seguir outros caminhos ditados pela moderação, pela justa medida e pelo consumo responsável e solidário, corremos o risco de cairmos nas insídias do consumismo, aumentando o número de famintos e empobrecendo o planeta já devastado.

Leonardo Boff
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quinta-feira, 5 de junho de 2008

Há 110 anos nasceu Federico Garcia Lorca...

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... e, trinta e oito anos depois, mataram-no. É dele o pema que segue:

Arbolé Arbolé

Arbolé, arbolé
seco y verdé.

La niña del bello rostro

está cogiendo aceituna.

El viento, galán de torres,

la prende por la cintura.
Pasaron cuatro jinetes
sobre jacas andaluzas
con trajes de azul y verde,
con largas capas oscuras.
«Vente a Córdoba, muchacha».
La niña no los escucha.
Pasaron tres torerillos
delgaditos de cintura,

con trajes color naranja

y espadas de plata antigua.
«Vente a Sevilla, muchacha».
La niña no los escucha.
Cuando la tarde se puso
morada, con luz difusa,
pasó un joven que llevaba

rosas y mirtos de luna.

«Vente a Granada, muchacha».

Y la niña no lo escucha.

La niña del bello rostro

sigue cogiendo aceituna,

con el brazo gris del viento

ceñido por la cintura.


Arbolé arbolé

seco y verdé.

Federico Garcia Lorca


quarta-feira, 4 de junho de 2008

Italia: eles como nós

Siena

País mais ao sul no Tratado de Roma (e não foi por acaso que foi "de Roma"), os italianos introduziram na União Europeia a colorida e animada forma de estar mediterrânica, que também encontra cromossomas em França mas que é radicalmente diferente dos então parceiros dos mais-ao-Norte, frios, austeros, organizados. Depois vieram os helénicos e nós, com os vizinhos do lado, acrescentar o ramalhete obelixiano que crescendo vai. Mas, pela sua própria maneira de ser, esses nossos confrades latinos, que tiveram mais que muitas ligações connosco sem necessidade de se invocar como razão preponderante a localização selecta do omnipresente Vaticano (basta recordar que eram italianas, mesmo no primeiro caso "avant la lettre", as rainhas que D.Afonso Henriques, o primeiro, e D.Luís, o antepenúltimo, trouxeram para cá), fazem frequentemente autocríticas humorísticas como a que Bruno Bozzetto, com arranjo musical de Roberto Frattini, graficou e colocou em
e que, já não sendo muito fresca, continua a ser exemplar.
E tão exemplar é que, em muitos dos comportamentos ali representados, poderíamos retirar o branco da bandeira transalpina e ficar na fotografia, modificando levemente o tom do verde, na afirmação bicolor de áreas desiguais [1], que à nossa bandeira dá uma expressão assaz rara entre todas. Reconhecer-nos-íamos, certamente - e sem dificuldade. Teríamos apenas que sugerir uma alternativa à "pizza" final [2] - mas, se foram os italianos que criaram a "pizza", não foram os americanos que a "globalizaram" como uma das expressões típicas e das mais preferíveis do "fast food"? Pelo menos o "Canal História", em apontamento recente, assim pretende!

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[1] "Mais sangue que terra" ? Ou ainda tem razão de ser a leitura do Sempé em 1974?

[2] E não somente: no que toca aos sinais de trânsito teríamos de contrapor à profusão italiana o nosso vazio, sobretudo se de alumínio - com esses tantos "mitras" (e respectivos receptadores, tão bons como eles) que andam pelas auto-estradas e vias nacionais a criminosamente encontrar mina no metal indicativo que aos outros faz falta . Mas, na terra do "salve-se quem e como puder", os outros que se forneçam - certamente que com razões para enfrentar os factos.
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terça-feira, 3 de junho de 2008

Do amor platónico

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Duas historietas (short stories) que ofereço, como motes ou sugestões literárias, a quem qualificou de "inapropriada" a primeira nota da postagem de 24 de Maio p.p., mas que embrulho numa pergunta de muito curioso que sou: por que razão prefere o "número não identificado" a deixar aqui um comentário "anónimo"? Não é o mesmo?

1.
"Platínico, pode ser, mas - não se esqueça - com diamantes!"

2.
"Amavam-se tanto, tanto que só após terem casado (não, certamente, entre si) descobriram finalmente quão bom era irem ambos para a cama... cuidadosamente preservando o padrão de fidelidade austera que lhes era atribuído pelas respectivas famílias e pela sociedade em que viviam"
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[1] Imagem, com a devida vénia, de www.marriedtothesea.com/030306/gracious.jpg

segunda-feira, 2 de junho de 2008

O mistério de Fermat ("La Habitación de Fermat"); a conjectura de Goldbach

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Goldbach segundo http://ssz.com
(Solar Soyuz Zaibatsu. Personal Resources)


Dirigido e escrito por Luis Piedrahita e Rodrigo Sopeña e galardoado no Fantasporto do presente ano e na Semana Internacional de Cinema Fantástico 2007, em Málaga, este filme passa, actualmente, em Lisboa. O aparecimento do nome de Fermat no seu título levou-me naturalmente a procurar uma breve lacuna na minha confusa agenda para partilhar uma sala quase vazia com um um número limitado de outros espectadores e sair nem quente nem frio, antes pelo contrário. Vi, não posso dizer que desgostei, mas manifesto-me nesse sentido sem entusiasmo (quer cinematografica quer matematicamente). O filme relata um mistério, e um "mistério de quarto fechado" - para usar a terminologia dos solucionistas de problemas policiários - com a particularidade singular de que as paredes se vão sucessivamente deslocando no sentido de esmagar todos (ou quase todos) os "enclausurados" - interrompendo-se o movimento compressor sempre que é resolvido um enigma lógico-matemático corrente que àqueles é proposto via telemóvel [1]. Os atraídos a tão sabuja armadilha, através do misterioso convite de um auto-denominado Fermat, são quatro matemáticos em princípio desconhecidos entre si, mas que o desenrolar da história, como no Expresso do Oriente da mestre Agatha, demonstra afinal não serem entre si tão desconhecidos quanto isso. E acompanhando todo aquele embróglio subjaz uma questão da prioridade na resolução (aliás ainda não conseguida) da conjectura de Goldbach, proposta em 1742 por este matemático alemão a Euler (mas, ao que dizem, já conhecida de Descartes): "qualquer multiplo de dois superior a quatro pode representar-se como a soma de dois números primos". Assim parece de facto constatar-se (16 = 3 + 13; 116 = 19 + 97; ... etc) até onde o cálculo permite hoje chegar - e é muito longe - mas não se demonstrou ainda que o seja, em abstracto, para todo o conjunto de múltiplos de 2.
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Aliás a conjectura de Goldbach, independentemente da sua exposição matemática (ver a propósito:
http://mathworld.wolfram.com/GoldbachConjecture.html )
e de tudo o que tem sido feito para chegar a demonstração - e que a mantém na lista dos enunciados ainda não demonstrados - tem merecido uma certa atenção artística, não apenas no cinema mas também na literatura. Quanto ao cinema, além do supra referido filme, inspirou "Proof" (2005), também denominado "Proof - Entre o Génio e a Loucura", um filme norteamericano com Gwyneth Paltrow e Anthony Hopkins, entre outros, que se baseia na peça de teatro homónima de David Auburn, vencedora do prémio Pulitzer, e que se integra nos chamados "filmes matemáticos" (ou, melhor dizendo, "sobre a matemática") segundo a referência de:
cinerama.blogs.sapo.pt/18181.html [2].
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Mas o que terá dado mais notoriedade à Conjectura foi o lançamento, no ano 2000, da obra do escritor grego Apostolos Doxiadis (nascido na Austrália e, ele próprio, já autor de outros "romances matemáticos") "Uncle Petros and Goldbach's Conjecture" ( que traduzo por "O Tio Pedro e a Conjectura de Goldbach") em que relata as aventuras e desventuras de um Tio que decidiu dedicar toda a sua vida a afrontar a referida conjectura... até demonstrá-la. Pois o mundialmente conhecido editor Fraser & Fraser, para lançar o livro, decidiu oferecer o prémio de 1 milhão de dólares a quem, nos dois anos seguintes, demonstrasse a referida conjectura. Isto deu origem a um certo entusiasmo, que se chegou a chamar "the Goldbach rush", mas, quanto a resultados... nikles! E assim, embora caducado o prémio, a conjectura continua conjectural!
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[1] Critica-se, por vezes, a simplicidade dos enigmas - que se consideram mais de almanaque e menos de poderem ser propostos a conceituados matemáticos, trazidos ao estranho quarto com o "isco" de participarem na solução de um alto problema matemático. Mas tem que se ver que o filme é para uma plateia, que não vai suportar grandes locubrações científicas. Assim sendo, esses diversos enigmas têm de ser simples e compreensíveis. Um exemplo (aliás o primeiro): Há três caixas opacas. Na primeira há bolas todas verdes, na segunda bolas todas vermelhas e na terceira bolas verdes e vermelhas. As caixas tinham três etiquetas: "VERDES", "VERMELHAS" e "MISTURA", mas as etiquetas foram tiradas da sua posição correcta e colocadas junto às caixas... mas nenhuma está agora certa! Qual o número mínimo de bolas que devem ser extraídas para reordenar correctamente as etiquetas?" Solução nos comentários.
[2] Onde, em termos recentes, acompanha, segundo a mesma fonte, “Good Will Hunting” (Gus Van Sant, 1997), “Pi” (Darren Aronofsky, 1998) e “A Beautiful Mind” (Ron Howard, 2001). Uma das coisas que me divertiu imenso nesta excursão foi descobrir a história e as razões de se designar como "e" a base dos logaritmos neperianos (ou seja a constante irracional 2.71828 18284 59045 23536...): veja-se, entre muitas outras fontes,
en.wikipedia.org/wiki/E_(mathematical_constant).

domingo, 1 de junho de 2008

Junho, nas "Les Très Riches Heures du Duc de Berry"

A colheita
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