sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Feliz Dia-das-Bruxas


Francisco Goya
em Caprichos (61/80)
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quinta-feira, 30 de outubro de 2008

"Filme em aula de Moral abre polémica"

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É este um título de notícia na pag. 23 do JN de 25 deste mês. O assunto conta-se rapidamente e assemelha-se, sem componentes trágicas, ao episódio-chave do "Clube dos Poetas Mortos". Um Professor da aula de Religião e Moral duma escola da Figueira da Foz passou, numa turma de alunos do 9º ano, o filme "Kids" (classificado em Portugal para maiores de 16 anos), "que relata a história de um jovem de 17 anos, infectado pelo virus da Sida, cujo objectivo é ter relações sexuais desprotegidas com o maior número de raparigas virgens". Melhor explicando: o filme apresenta a vida de um grupo de adolescentes nova-iorquinos, não escondendo - de forma por muitos considerada brutal e por outros meramente realista - os riscos associados ao uso de drogas, a comportamentos violentos e a contactos sexuais desprotegidos num meio exposto à SIDA. Os pais de um dos dois alunos que objectaram a essa projecção formalizaram uma queixa à Direcção Regional de Educação do Centro. Penso não ser necessário fazer quaisquer comentários, bastando para clarificar a minha posição o facto, supra expresso, de ter escrito Professor com maiúscula.

O episódio não podia deixar de me recordar um outro em que uma certamente diferente motivação levou a uma situação algo parecida. No ano lectivo 1953/1954 as irrequietas turmas do 7º ano do Liceu de Alexandre Herculano do Porto (as tais que no ano anterior tinham fundado "O Prelúdio"), sob inspiração do então Professor de Moral Padre Alexandrino Brochado, participaram na constituição de um "clube de cinema" que utilizava para o efeito as magníficas instalações da ala poente do Liceu - desenvolvendo assim, para os alunos aderentes, uma actividade bem mais útil que o marchar à futrica, na lama ou na poeira do recreio, às 4ªs feiras à tarde. Obtido o amável apoio de um representante cinematográfico no Porto, que nos cedia as bobines por um preço a todos os títulos simbólico, se algum, e nos conferia os direitos de projecção, passamos películas interessantes e muito variadas - abrindo os olhos da "malta" para alguns dos aspectos da 7ª Arte. Foi assim que, sem problemas, passamos "Os Ladrões de Bicicletas", que já de si vinha censurado, e, algum tempo depois, "O Milagre de Milão". Tanto bastou para que um mui zeloso pai de um dos alunos aderentes fizesse sentir, por carta ao Reitor, que estava a haver uma preocupantemente exagerada inclinação pela corrosiva filmografia neo-realista italiana - o que imediatamente, e ao sabor da época (ainda que todos os filmes passados tivessem tido ampla permanência no circuito comercial), levou à extinção do meritório clube. [1]

Conclusão: nestas coisas de passar em escolas filmes de cunho realista, ponderando a diferença de conteúdos mas o que remanesce do "então como agora", há sempre a possibilidade de olho arguto descortinar a dedada de um alegado diabinho escondido, olé se há!!! Deve ser o "demónio de Maxwell", à falta de outro! Só que as coisas acontecem... e já nem escondidas estão. E, como no título de um outro filme, "Amanhã será tarde"...

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[1] Já antes "O Prelúdio" tinha tido problemas por causa do cinema, ao publicar o texto de um aluno sobre a "lei do cinema" que tinha por essa altura saído e que era observada com inicial rigor. Comentava esse texto não a lei em si e sim os critérios de classificação dos filmes para acesso etário diferenciado - mas, mesmo nesse plano, deu chatice e da grossa - que o nosso esclarecido Reitor soube gerir bastante bem, inclusive "encomendando-nos" uma entrevista pre-fabricada para apaziguar os super-ultras que se excitaram com a prosa do moço. Isto ensinou-nos bastante, pois que além do cagaço que a solene chamada à reitoria nos causou - e dos aborrecimentos que o Professor Orientador, o sapiente Dr. Manuel da Cruz Malpique deve ter tido, mas que nunca nos disse palavra sobre isso e assumiu frontalmente a situação (constou-nos depois, por portas e travessas, que ameaçara demitir-se da função se a coisa trasbordasse) - verificamos por experiência própria como funcionava o "sistema". Essa lei do cinema deu origem a um episódio curiosos, de que fui protagonista: passava no Cinema Batalha (o tal onde tinham apagado uns "frescos" porque eram contrários "à ideologia do Estado Novo") o "Maria Walewska" - creio que com a Greta Garbo - mas o filme fora classificado para maiores de 18 anos (eram 17 ou 18 anos? não me lembro). Sucede, porém, e isso já me lembro, que eu tinha menos um ano que o limite imposto - e que queria ver o filme. Dirigi-me ao polícia que então estava à beira dos porteiros e disse-lhe: Senhor Guarda eu quero ver o filme, faltam-me só uns meses para ter a idade mas já conheço a história de cor e salteado!" (e conhecia de facto). O guarda olhou para mim, espigadote que eu já era, e só disse: "Vá lá comprar o bilhete!". E assim vi o filme.
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quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Os 3 Magalhães


Dos muitos Magalhães que conheci, vou destacar três.

O primeiro é o Magalhães propriamente dito, aquele que teria dado a volta ao Mundo se uns desmancha-prazeres em recônditas paragens não tivessem tido opinião contrária.

O segundo é o meu colega Magalhães, da turma do Liceu, jeitoso no futebol, imprescindível nos desafios da Turma A contra a Turma B, o tal que começou a escrever um livro intitulado "Tratado das Fintas e Driblings" e que combinou comigo dar-mo a ler, com a condição de eu o ajudar na colocação das vírgulas. Recordo-me que só me trouxe o primeiro capítulo, que se chamava "Da finta à inglesa" - e, pelos vistos e ouvidos, a obra ficou por aí. Perguntei por ele no último almoço geral da "malta", sem ter tido grandes informações.

O terceiro é o Magalhães, o "nosso", o recente, o tal que o PM trouxe à liça e que já de tudo recebeu, desde trovas de escárnio e maldizer (aliás bem urdidas, umas que eu li) até um generalizado desprezo e minimização de valor, pois que elogios àquilo que fazemos, em Portugal, é deixado ao exclusivo cuidado dos que criaram ou paraninfaram a coisa, para poderem ser apodados de suspeitos, propagandistas, perdulários e outras atribuições de igual teor. Fosse aqui ao lado, com a inflacção de auto-estima que sempre os vizinhos sabem encontrar, teríamos para o Magalhães - na rádio, na TV, nos outros MCS e talvez até na Hola - um cagarim de se lhe tirar o sombrero y olé! Pode ser que apenas lhe mudassem o nome... e certamente seria para Sebastião del Cano.

Estas sucessivas reacções ao neófito Magalhães, que não aos outros dois, inserem-se em - pelo menos - quatro posições intelectuais diversas e tipificáveis.

A primeira é a atitude complacente e plasmada, passiva e indiferente, pantanosa em si mesmo, a do "Ai é? tenho mais que fazer que me preocupar com essas coisas!"

A segunda é política, ou seja, a do "tudo o que estes gajos fizerem não vale a ponta de uma antena parabólica (que não tem pontas)". Sendo activa, respeito essa atitude não na sua componente construtiva que encerra (?) mas na liberdade de pensar e dizer que contém, até porque com o revolver dos tempos - e os exemplos mostram-no - outros dirão o mesmo doutros e só é de lamentar que levemos tudo tão a sério nesta terra que nem sejamos capazes de manter um jornal humorístico para, pelo menos, o dizer com graça. Aqui os tais vizinhos têm o "Jueves" (o tal que, como primeira característica chistosa, sai ao "Miércoles") e, quanto a nós, tivemos "Os Ridículos", tivemos "O Sempre Fixe" (um dos quais acabou, creio eu, ainda no tempo do AOS, com a famosa capa dos "40 anos de pintura e sempre à brocha"), tivemos outras honrosas tentativas que todas deram em naufrágio. Somos um colectivo verdadeiramente sem graça.

A terceira é corporativa. O dito maquinismo vai tomar o pouco tempo que ainda sobeja a uma série de gente (progenitores e profs), para que possam explicar aos putos como é que se mexe naquilo, como é que se usa aquilo, como é que se alimenta utilmente aquilo com exercícios, questões, textos, explicações da natureza - sendo evidente que esta natureza se deve entender num sentido restrito já que o dito Magalhães permite limitar certos acessos, que poderão ficar para a Mamã e o Papá em navegações fora de horas e nunca naquele equipamento. Esta é a posição, também nacional, do "não me lixes, não me lixes, não me lixes!" que sempre se diz quando a uma vida atarefada alguém tem o mau gosto de acrescer uma qualquer fracção de nova tarefa, uma delta-tarefa mesmo que pequenina.

A quarta - e a mais preocupante - é a atávica recusa a tudo o que tenha um vaguíssimo cunho de tecnicismo. Felizmente que essa atitude não permanece em muita gente, mas por vezes subconscientemente ela lá está, num recôndito porão do sentimento, para fazer tocar as mais surpreendentes campainhas de alarme. Num País que achincalha "comissões de sábios" de todas as "cores" (sendo certo que eu embirro com a palavra "sábio") e em que um jurista escreve num jornal que sempre optou pelo processo (técnico) X em detrimento do processo (técnico) Y, num País que tem manifesto horror ao papel quadriculado, esta atitude pode revestir manifestações extremas realmente inquietantes. É o senhor administrador de empresa que diz, impante, "o meu computador é a meu cérebro" - mas que vai (ou ia, porque os tempos não estão agora para isso) logo de manhã ver o comportamento das bolsas (no seu próprio interesse, claro) ou é o "discurso do pobrezinho" como escutado um dia destes num transporte colectivo ("Era melhor que gastassem o dinheiro em hospitais, em vez de mandarem os miúdos comprar aquilo. No tempo de Nosso Senhor não havia computadores e as pessoas eram bem mais felizes!"). Resta saber a que "Nosso Senhor" se referia este discurso, mas de qualquer forma: Apre!!!

Por estas e por outras eu sou por este Magalhães. Sou mesmo, baratinho que é. Porque acredito em desafios, Porque entendo que, mesmo aos encontrões,"o mundo pula e avança", como vem no poema dito ou cantado, ou no silvano "para trás mija a burra" - que são duas formas com distinta distinção para dizer a mesmíssima coisa.
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terça-feira, 28 de outubro de 2008

Cantar de trabalhadores rurais (Aljustrel)

Cipriano Dourado (1921-1981): uma das capas que desenhou [1]
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"Nós somos trabalhadores
Que no campo trabalhamos,
Trabalhamos ao rigor
E a pedir ao lavrador
Quando trabalho não temos.

Quando trabalho não temos
À Cambra se dirigimos
A pedir ao Presidente
Que tenha dó desta gente
E nos dê algum destino.

E nos dê algum destino,
E nos dê algum gasalho,
À Cambra se dirigimos
A dizer o que sentimos
Quando não temos trabalho."


Em LOBATO, Pe. João Rodrigues, Aljustrel - Monografia,
C.M. Aljustrel, 1983, pag.176


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[1] Obras de Cipriano Dourado, incluindo as capas para a revista "Vértice", como a acima representada, e ainda muito e valioso "não só" podem (e devem) ser vistos em blogdaruanove.blogs.sapo.pt
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segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Algumas notas

O dia merece algumas notas soltas.
E, por isso, começarei aqui a descarregar a vagona:


Alguém disse um dia que os entendidos das economias mundiais têm o seu quê de médicos legistas: sabem (ou pretendem saber) como autopsiar uma crise passada, mas não sabem acautelar a seguinte. E por isso aí estamos, como se não se augurasse que nos "Stars and Stripes" se ia configurando aquilo a que se pode chamar a "economia do souflé": empola, empola sempre, mas se se aquece demais estraga-se o dito e se se retira o fogo inevitavelmente abate! Pois aí temos, não um souflé, mas um riquíssimo estrugido, que não cheira minimamente bem e que, curiosamente, até me faz concordar com algumas nuances da apreciação saramágica. Mas vamos ao que interessa: de entre as multiplas análises que surgem e das muitas análises que vão surgir, destaco o que hoje li na pag 4 e 5 do P2 do Público signé Teresa de Sousa sob o título "Marx está de regresso? Não, apenas Keynes". Confrontando erradamente um Marx "regressado do baú das velharias para o qual tinha sido remetido depois de 1989" com um John Maynard Keynes de quem eu, ainda não há muito tempo, ouvi também dizer cobras e lagartos, esboça-se uma falsa questão e omite-se um aspecto verdadeiramente essencial, que só é aflorado pela tangente: a negação, pela má-obra feita, "de uma forma de capitalismo, alimentada por uma teoria económica e por uma ideologia política que teve o seu zénite nos últimos trinta anos e a sua pátria na América" e que, exportável e exportada, teve, obviamente, os seus chicagantes cultores. Ora Marx escreveu no seu tempo (e para além do inegável mérito de ainda hoje criar manifestações alérgicas, mereceu entretanto leituras actualistas, como as de Jean-Marie Vincent, que não podem nem devem ser descartadas); Keynes preocupou-se com o social (e certamente calaria aqueles que ainda há pouco apodavam sarcásticamente a macro-economia de "má-economia"); a própria Igreja abordou o tema, pelo menos na sua doutrina social (por vezes tão manifestamente esquecida em cátedras próximas em que deveria ter lugar) - e todos estes , de uma forma ou de outra, realçaram uma COMPONENTE ÉTICA que é o que faltou aqui e que tem necessariamente de renascer. Existe, de facto, uma responsabilidade social, que acabou por ser deliberadamente afastada (e não esquecida, atenção!) por quem, guru ou escola, conspurcou este lado da barricada; não há que discutir ainda se, do outro lado, é X que prevalece sobre Y - quando, em leituras correntes, todos desaguam na mesma conclusão e se, como Keynes surgiu e foi novidade, outra leitura poderá surgir. Rejeita-se a simplificação ao simples "caso de endividamento", que não é, para concluir que algo morreu, de facto- e essa é a constatação básica. Mas, sendo necessário passar à construção, não se devem excluir, à partida, quaisquer vias que, sem perda da dimensão ética que fundamenta uma real democracia e da componente social que foi, essa sim, empurrada para detrás da estante, possam permitir "outras formas de vida".

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No mesmo "Público" - e agora em tema muito mais afável - encontrei uma referência à colecção "O Sentido do Gosto", com autoria de José Bento dos Santos, que aquele jornal vai editar (a título oneroso mas acessível) em 7 sucessivos livros + DVD, todas as segundas feiras, de hoje a 8 de Dezembro. Tendo trabalhado com José Bento dos Santos, em assuntos tão diversos ao tema a que esta breve nota se refere quanto pode ser um "wire-bar" de cobre (formato hoje já praticamente emprateleirado no domínio da arqueologia metalúrgica), conheço bem a sua preocupação pela excelência - não naquele conceito que andou por aí feito chavão mais político que técnico e que, por isso, desgastou a palavra - mas num sentido de "excelência excelente" que se procura e se compraz no valor que reside para além das coisas e na qualidade que se lhe deve associar e fruir. Daí que possa prever o dom e interesse deste lançamento. Faço esta referência como preito de admiração, sem quaisquer laivos de publicidade - porque não só a obra está pronta e lançada como, ademais, nem disso o mérito do Autor precisa.

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Uma terceira nota reflete uma contrariedade encontrada hoje na "baixa" lisboeta, naquela "venda de vistas de Lisboa" que caracteriza o troço sul da Rua Augusta, já próximo do arco. Admito que, para satisfazer os gostos e acompanhar as bolsas dos turistas, certas imagens de Lisboa sejam estilizadas e repetidas "ad nauseam", mas custa-me ver o que possa nelas faltar à verdade. Agrediram-me hoje, em dimensões diversas, perfis desta cidade (que não é a minha) em que a ponte, uma ponte híbrida 25 de Abril / Vasco da Gama, de convergente tabuleiro, quase vai fugar no Terreiro do Paço. Esta técnica do "dois em um" pode mostrar-se utilitária, pode até pretender simular, em perspectiva roubada futurista, o que virá a ser, na margem Norte, a agressão panorâmica da TTT (Terceira Travessia do Tejo) - mas definitivamente carece de pés e de cabeça. Eu não compraria! Apre!
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domingo, 26 de outubro de 2008

Caçar fantasmas - 5 - A minha primeira máquina fotográfica


Foi uma boa surpresa reencontrá-la aqui. Recebi-a uns 5 anos depois, quando dos meus exames de 4ª classe e admissão aos Liceus (então era assim!). Tirava fotos quadradas... e era só de escolher "instantâneo" ou "pose", enquadrar no visor e carregar no botão!

sábado, 25 de outubro de 2008

Forma possível de ver as coisas

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Este dizer "apanhei-o" no bar da Biblioteca Nacional, traduzindo uma forma de ver as coisas:

"Da chávena que se partiu está aqui tudo; não falta mesmo nada!
Só se perdeu o feitio!"

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sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Caçar fantasmas - 4 - A guerra das matérias-primas

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A guerra das matérias-primas, a "guerra económica", que caracterizou a II Grande Guerra, teve inevitáveis reflexos em Portugal. Disso dá conta o soneto de Acácio de Paiva, com o significativo título "Petróleo e Ferro", publicado na secção "A Fita da Semana" de "O Século", de 22 de Abril de 1940:

"Como há petróleo e ferro no País
(Novidade que sei desde criança)
Vá de apregoar nas folhas a abastança!
Não se botam foguetes por um triz!

Eternamente ingénuos e infantis!
Que a Inglaterra, que a Alemanha e a França
Não tenham a menor desconfiança
De que somos um povo tão feliz!

Se eles souberem que durmo sobre um leito
De ferro e tenho duas lamparinas
Com petróleo, partidas, por sinal,

Não é preciso mais, ponham-se a jeito,
Carreguem os canhões, preparem minas,
Porque não tarda um cerco a Portugal."

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Jules Lefebvre... ou os riscos da "net"

Procurava eu, na "net", Jules Lefebvre, administrador-presidente da sociedade adubeira francesa Société du Phosphoguano ao tempo da viragem dos séculos XIX e XX, com instalações industriais em Honfleur, Normandia, e la Pallice - La Rochelle. Saiu-me um homónimo, Jules Lefebvre (Jules-Joseph Lefebvre, melhor dizendo!) pintor académico francês, classicista (1836 - 1911) e que entre outras obras de idêntica e bem marcada preferência (para além dos seus trabalhos como retratista e gravurista - incluindo nesta especialidade uma famosa "Lady Godiva"), fez brotar em 1862, da cipriota espuma que o pincel permite, a "seguintemente" mostrada "Cloé":


Não era exactamente o que eu procurava, mas... ah, Jules, "pompier" que tenhas sido!
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quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Caçar fantasmas - 3 - Da beleza feminina... em 1940

Os dois seguintes anúncios foram repescados da pag. 7 de "O Século", de 11 de Março de 1940. Considero ambos exemplares e sumamente divertidos!

O primeiro mostra como, já na época, as "mesdames" corriam atrás do tempo quais versões femininas do Doutor Fausto - neste caso à procura de "Margaridos". Explica tintim por tintim como uma senhora de 35 anos passou a perna a uma miúda de 19, limpando-lhe o noivo - aliás, e como convém nestes contos de encantar, um "rico industrial". O anúncio exibe as encadernações faciais duma e doutra, identificadas pelos respectivos números natalícios - como se fossem jogadores de futebol de hoje, prontos a entrar em campo. De facto não há dúvida... mas temos de concordar que ou a senhora de 35 anos tem 19 ou a loira (porquê loira?) de 19 anos não recebeu a mínima estimação por parte do desenhador. Vejam só, como dizia o comentador brasileiro de documentários Luís Jatobar (no tempo em que a sessão de cinema tinha dois intervalos, documentário e desenhos animados a acepipar o filme de fundo):


O segundo demonstra cabalmente como todas as coisas devem ser lidas no contexto e avaliadas no conhecimento da época, por muito deslocado que ele possa parecer ao tempo do observador, e assim o que hoje é branco amanhã pode ser, pelo menos, cinza-escuro (quem não lavou os dentes com o hoje banido hexaclorofene na pasta?). Pois leia-se o que está directamente por baixo dos boiões e frascos que limitam inferiormente o rosto da "madame". Mas, nisto duma "radioactividade benéfica comummente acessível" que era chic e marcou os anos 20, 30 e até 40, sendo esta já uma década serôdia a que a era atómica pôs definitivamente cobro, há mais casos. Oh se há!

(para ver ampliado, clicar uma vez, do lado esquerdo do rato, sobre a imagem)



terça-feira, 21 de outubro de 2008

Caçar fantasmas - 2 - Que bons alunos eles eram...

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Uma lição de anatomia na Idade Média (*)

Título de notícia de primeira página, em "O Século", de 28 de Setembro de 1940:

"Mais de dois mil professores aclamaram o Sr. Ministro da Educação que pronunciou um primoroso discurso na recepção que lhes foi oferecida na Exposição do Mundo Português."

Pudera não...

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[*] cortesia a www.lionden.com/ap1out-intro.htm

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Caçar fantasmas -1 - O balão de Tabuaço

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Dame Laura Knight, Um posto de balões de barragem, Coventry, 1943,
quadro no IWM, referido no artigo deAlice Kershaw "Witness 2 - The art
of WWII at Imperial War Museum North", de 2007.02.02, publicado em
http://www.24hourmuseum.org.uk/nwh_gfx_en/ART43403.html


Era um destes! Aí por voltas de 1940-1941 alguns gigantescos balões de barragem da defesa antiaérea de Londres ou de outras cidades inglesas cansavam-se de ser cativos, soltavam-se das amarras e vinham por aí abaixo, em busca de terras mais quentes e sobretudo mais pacíficas. Uns foram parar a Espanha, que arrefecia dos calores da Guerra-Civil, com o lápis azul de D.Francisco Franco a assinalar quem deveria morrer e quem deveria viver, outros vieram a esta terra sorumbática em que os próceres do regime ainda esfregavam as mãos ao ver como o Adolfo comia a terra dos outros e o Benito sonhava com glórias a que, brevemente, os gregos iriam pôr travão - obrigando o Adolfo a correr para "safar" o Benito nos Balcãs e, por isso, atrasar de forma irrecuperável as suas cócegas ao Zé, com quem andara antes metido na malandrice de dividir Polónias e a quem deixara cir no papo, de mão beijada, esquecendo a Hansa e os "corpos-francos", uma republicas pequeninas que estavam na costa do Báltico e que não faziam mal a ninguém salvo o estarem, por azar delas, na costa do Báltico. Tudo bons rapazes!

Pois, dos balões que vieram e que mereceram notícia e foto, destacarei o "balão de Tabuaço". Não porque fosse maior, ou porque fosse diferente, mas porque a sua chegada rodeou-se de peripécias dignas de historieta bufa. Gostaria de ter tempo para a investigar e para a escrever, potencialmente em tons cómicos, tão desvairada me parece e de tal forma interfere com os localmente grados intervenientes de zelosas organizações da época, cumprimentando-se certamente "à romana" mas procurando dar-se caneladas por baixo da mesa como era então costume e levava o Chefe-mor a profundas reflexões do tipo: "Já há meses que em Vilar de Ordem [nome fictício, claro!] o Presidente da Câmara não me faz queixas do "leader" da União Nacional e que o "leader" da União Nacional não me faz queixas do Presidente da Câmara. Não auguro nada de bom! Temos de ir lá saber o que se passa!"

Mas o mais importante é que as controversas posições em torno do balão (balão e não barão!) de Tabuaço, e que envolvem situações mais que duvidosas, escaparam ao lápis azul da censura (este algo mais brando mas igualmente tão impertinente quanto o do D.Paco) - e só isso diz ou que o censor estava adormecido ou que, como se constatou noutros casos, a situação era insusceptível de se encobrir. Ao que eu sei a coisa começou com duas questões: os da terra queriam ficar com o balão (talvez para fazerem cuecas, como se fazia dos sacos de enxofre), as "austeridades" queriam entregar o balão, uma vez esvaziado, a quem de direito - havendo um imediato litígio de competências entre os poderes civis, os militares e, mais fortemente ainda, entre estes e a LP (Legião Portuguesa, para quem não saiba). Optaram por o levar para o centro administrativo mais próximo, a nível distrital, quando o "povo" já tinha esvaziado e dobrado o balão... mas, pelo caminho, outro povo se "alevantou", apossou-se do balão e meteu-o numa igreja - o que traduz a emergência picante de um outro poder: o clero.

Chamadas as autoridades policiais, estas vieram - mas gerou-se motim, e tiveram de vir mais autoridades policiais que acabaram por transportar o balão e aprisionar os cabecilhas (há sempre cabecilhas nestas coisas), sendo de crer que essas autoridades policiais fossem acompanhadas por outras menos fardamentadas mas igualmente policiais e metediças, como as que apareciam e apareceriam em vários quiproquós nortenhos, relacionados com manifestos agrícolas, mau-estar laboral, dúvidas eleitorais, escritos na parede ou questões de mineralogia aplicada. Tudo pela Nação, claro.

Por isto o balão de Tabuaço e os seus "desacatos" (é este o termo exacto pudicamente usado nas notícias) me atraem tanto. Não sei se terei tempo para me dedicar ao mesmo, mas deixo pistas - porque posso não ter. E o assunto merece, se merece! Que bela e divertida tese eu terei perdido!!!

Aí vão as ditas pistas: "O Século", 6 de Janeiro de 1941, pag. 6 coluna 7 e, pelo menos, 7 de Janeiro, última página, coluna 5 - mas creio haver breves referências anterior e posteriores. Também em 1940, no mesmo jornal, registara-se a chegada de outro gigantesco balão, já não a Tabuaço, mas com espectacular foto e tudo! A não perder!

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NOTA DO BLOGUISTA: Com a conclusão das celebrações do Centenário das Fábricas da CUF no Barreiro, a que atentamente assisti, e uma posterior saída para a capital da Lusitãnia, tenho todo o expediente bloguista atrasado. Não é que seja muito denso, mas é atrasado - sobretudo no tocante a imagem. Como já sucedeu noutras vicissitudes, e até porque o material existe, recuperá-lo-ei lentamente. A quem gostar de ler este blogue, as minhas desculpas e o convite ao exercício recapitulativo a que obrigarei. Lamento, por isso!

domingo, 19 de outubro de 2008

O que faltava ver - 2 - Barragem romana de Proserpina



Mérida

sábado, 18 de outubro de 2008

O que faltava ver - 1 - Ermida de Nª Sra de Antigua

Mérida

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Chegada tardia

A ponte na "via rápida" para Olisipo

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quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Tejomasoquismo [1]

de Jeroen van Aeken (~1450 - 1576)


É o que se pode chamar a certas escolhas...

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[1] Se fosse para Setúbal seria sadomasoquismo.


quarta-feira, 15 de outubro de 2008

100 palavras

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De: http://www.quarterhorsecav.org/NewOneDollar.jpg

NOTA: A semelhança da postura das mãos com a segunda foto da "miss" da postagem anterior é fortuita coincidência! Nada mais...
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terça-feira, 14 de outubro de 2008

Centenários

Foto: Globo

Celebrar centenários cansa muito: sempre são cem anos decorridos. E, além disso, na lista de comemorações possíveis fica sempre algo que valeria a pena não se ter esquecido.

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

O CD com os "Cadernos do Grupo de Trabalho do Arquivo da CUF/QUIMIGAL"


Referiu-se a 11 de Outubro a distribuição deste CD aos participantes do Colóquio Internacional "A Industrialização em Portugal no Sec. XX - O Caso do Barreiro", chamando a atenção para o seu conteúdo que se dizia então ser "um elemento de referência muito importante para quem estude a CUF/QUIMIGAL, as suas localizações fabris, o AP (Estarreja) e/ou os NP (Alverca)". E é mesmo! Para que se avalie a utilidade desse conteúdo, transcreve-se seguidamente, com a devida vénia, a respectiva "Apresentação do CD" tal como nele contida:

"Apresentação do CD
“Cadernos do Grupo de Trabalho do Arquivo da CUF/QUIMIGAL”

O presente CD reúne um número considerável de trabalhos que têm sido elaborados e compilados (transcritos, no caso dos Cadernos da Secção V) desde há alguns anos a esta data, por elementos do Grupo de Trabalho do Arquivo da CUF/QUIMIGAL.

O intuito foi sempre procurar melhorar as condições de acesso a uma história que se conhece rica e bem diversificada, numa perspectiva de optimização da informação bibliográfica elaborada no passado pelas duas empresas CUF e QUIMIGAL, e felizmente ainda hoje existente em arquivo.

O CD está estruturado em 5 Secções – Secção I: Índices Gerais; Secção II: Índices Temáticos; e Secção III: Índices da revista “Indústria”; Secção IV: Cronologias CUF e QUIMIGAL; Secção V: Cronologias AP - Amoníaco Português e NP – Nitratos de Portugal.

Nas duas primeiras secções (Secção I e Secção II) cada sub-divisão corresponde, fisicamente, a um Caderno já elaborado pelo grupo. A estrutura “em livro” manteve-se, por isso cada Caderno tem a “folha” (ficheiro) correspondente à capa, a folha (ficheiro) correspondente à relação de fontes utilizadas, à introdução, etc.

Nas Secções IV e V, um ficheiro é um Caderno por inteiro. Na Secção III, o Caderno é o resultado dos ficheiros apresentados.

Cada Caderno é por sua vez, apresentado numa nota introdutória ou parte explicativa, que acompanha a sua edição, o que permitirá eventualmente, uma exploração mais eficaz das potencialidades do mesmo, por parte do utilizador. A bibliografia utilizada vem igualmente, detalhada para cada situação.

Assim, tem-se:

Secção I – Índices Gerais:
  • Actas C.I.E. [Comissão Interna da Empresa] (Ficheiros: “Actas C.I.E. 1963 – 1974 _Capa”; “Actas C.I.E. 1963 – 1974 _ Introdução”; “Actas C.I.E. 1963 -1974”).
  • Boletim CUF (Ficheiros: “Boletins CUF 1963 – 1979_Capa”; “Boletins CUF 1963 – 1979_Introdução”; “Boletins CUF 1963 – 1979”).
  • QUIMIGAL Noticiário (Ficheiros: “QUIMIGAL Noticiário_Capa”; “QUIMIGAL Noticiário 1 – 135”).
Secção II – Índices Temáticos:
  • Caderno I : Produção: Ficheiros: “Produção _Capa (2.ª ed.)” “Produção Siglas”“Produção _Introd. (2.ª ed.)” “Produção_A – Z (2.ª ed.)” “Produção_ Fontes”
  • Caderno II : Serviços e Estruturas: Ficheiros: “Serviços e Estruturas_Capa (2.ª ed.)”“Serviços e Estruturas_Introd. (2.ª ed.)” “Serviços e Estruturas_ A - Z (2.ª ed.)” “Serviços e Estruturas_ Fontes (2.ª ed.)”
  • Caderno III : Pessoal Ficheiros: “Pessoal _1 (A – D) _Capa (2.ª ed.)”; “Pessoal _2 (E – M) _Capa (2.ª ed.)”: “Pessoal _3 (N – Z) _Capa (2.ª ed.)”; “Pessoal _ Introdução (2.ª ed.)”; “Pessoal _1 (A – D) (2.ª ed.)”; “Pessoal _2 (E – M) (2.ª ed.)”; “Pessoal _3 (N – Z) (2.ª ed.)”; “Pessoal _ Fontes (2.ª ed.)”.
  • Caderno IV : Pessoal C.I.E. e CT’s [Comissão de Trabalhadores] Ficheiros:“Pessoal CIE – CT’s A – F Capa (rev 2008)”; “Pessoal CIE – CT’s G – Z Capa (rev 2008)”; “Pessoal CIE – CT’s A – F (rev 2008)”; “Pessoal CIE – CT’s G – Z (rev 2008)”; “Pessoal CIE – CT’s Introd. (rev 2008)”; “Pessoal CIE – CT’s Sinopse (rev 2008)”; “Pessoal CIE – CT’s Fontes (rev 2008)”
  • Caderno Especial: Ficheiros: “Ao Serviço da Empresa _(A – I) _ Capa (rev 2008)”; “Ao Serviço da Empresa _(J – Z) _ Capa (rev 2008)”; “ Ao Serviço da Empresa _ Introd. (rev 2008)”;“Ao Serviço da Empresa _(A – I) (rev 2008)”; “Ao Serviço da Empresa _(J – Z) (rev 2008)”; “Ao Serviço da Empresa _ Fontes (rev 2008)

Secção III – Índices da revista “Indústria”

  • Ficheiros: “Revista Indústria _ Índice por revista”; “Revista Indústria - Índice de títulos”; “Revista Indústria _ Índice por autores I”; “Revista Indústria _ Índice por autores II”; “Revista Indústria _ Índice de assuntos A – Z”.

Secção IV – Cronologias CUF e QUIMIGAL

  • Ficheiros: “Cronologia I _ CUF Centenário (1865 – 1965)”; “Cronologia II _CUF (1965 – 1977)”; “Cronologia III _ QUIMIGAL (1977 – 1989)”; “Cronologia IV_ QUIMIGAL (1989 – 1997)”;

Secção V – Cronologias AP e NP

  • Ficheiros: “Cronologia AP”; “Cronologia NP”
Fica aberto o apetite...

domingo, 12 de outubro de 2008

LAH - 54 anos depois, em Santa Maria da Feira

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Castelo da Feira - Mesmo com névoa é bonito!

sábado, 11 de outubro de 2008

Do encerramento do Colóquio, a 10 de Outubro / A Exposição


A terceira peça que aqui trago a propósito do já referido Colóquio - que foi encerrado com um excelente discurso da Vereadora Dra. Regina Janeiro - é a intervenção de encerramento que produzi. E não maçarei mais, sobre este evento:

"A realização de um colóquio como o que agora se encerra foi uma tarefa ambiciosa mas há muito merecida pelo Barreiro. Na concretização do Centenário das Fábricas da CUF no Barreiro, que não foi o centenário da CUF, celebrado em 1965, nem o centenário de Alfredo da Silva, celebrado em 1971, estabeleceu-se um painel alargado e ambicioso que, reunindo perspectivas e opiniões diversas e enriquecido com os debates que suscitou, vai constituir um acréscimo de valor na historicidade barreirense e ser motivo de referência para as gerações vindouras.

Não houve nem redução de perspectivas, nem rateio de participações. Todos os que se inscreveram puderam dizer o que se propunham dizer e, dentro da disciplina do tempo, que é um respeito por todos, puderam intervir no que se propunham intervir. Ninguém procurou convencer ninguém: apenas se levaram factos ao conhecimento e à reflexão e se fez História com H grande em que sobressaiu o muito que nos une, numa identidade barreirense que se não limita aos que aqui nasceram mas que acolhe e ouve os que para aqui vieram, e em que ressaltaram certamente os pontos de vista diferentes, como é normal nas comunidades que recordam o seu passado e nele revêem e preparam activamente o seu futuro.

Se não me fica bem cumprimentar por tudo isto a Comissão Científica na parte que me toca, não hesitarei em fazê-lo aos seus outros membros que não eu, e, por maioria de razão, aos moderadores dos painéis, aos comunicadores, aos assistentes, interventores ou não, e a todos os que integraram a estrutura competente com que a Universidade Autónoma de Lisboa organizou este colóquio, ou que, membros das entidades promotoras do evento – CMB, CUF SGPS, QP e JdM, na sua organização também intervieram. A estas entidades reitero, em nome da Comissão, os agradecimentos pelas facilidades conferidas.

O Barreiro, pelas dificuldades e titubeações da nossa industrialização, é uma comunidade singular, um caso de estudo, em que a indústria nasceu e marcou de forma decidida, em que ganhou alongado sentido a palavra produção. Valorizo essa palavra produção em todas as suas componentes, nomeadamente na criação de valor que efectivamente lhe assiste – num momento em que, à nossa volta, o mundo treme com a criação de valores balofos sem que a produção lhes tivesse dado o necessário substrato. Valorizo essa palavra produção nos termos em que muitos de nós os vivemos e com todos os custos que as comunidades industriais, daqui ao longínquo Japão, dando a volta ao mundo por qualquer dos sentidos, efectivamente os viveram e que, em qualquer latitude e longitude, devem ter em conta as componentes espaço e tempo e serem necessariamente interpretados no contexto.

Somos, repito, um caso singular. Assim o mostramos nestes animados dias em que mais uma vez nos encontramos e debatemos a nossa identidade. E isso sucede porque temos uma identidade a debater e temos uma identidade a preservar e temos uma identidade a transmitir mesmo quando o espaço das fábricas se reduziu, mesmo quando se verificaram os efeitos dissolventes da suburbanidade que é, sem dúvida, o nosso maior risco. O Barreiro deve ver-se e representar-se como Barreiro, procurando a excelência dos seus méritos, mostrando ou recuperando a capacidade invejada do seu paradigma industrial, mas sabendo sempre diferenciá-la. Assim foi o Barreiro histórico, assim o Barreiro deve ser se quiser atrair futuro. Como sentiu o criador das fábricas da CUF aqui, há 100 anos, o Barreiro tinha vantagens competitivas que ele adoptou e usou certamente em proveito da empresa que era a sua, sem nunca o ter escondido, já que não tinha papas na língua. E, incontornavelmente, através da Fábrica que celebramos, nisso envolveu e modificou o Barreiro, nos que aqui estavam e nos que aqui acorreram no anseio de algo melhor – em qualquer sentido - daquilo que tinham de onde vieram. Como eu próprio fiz em 1961, tomando o caminho do Barreiro, e orgulho-me disso. Mas como hoje sucede em qualquer sistema - repito: em qualquer sistema - temos de manter e desenvolver as nossas vantagens competitivas. E de potencializar, no melhor sentido, as novas oportunidades que encontrarmos, sem nos autoflagelarmos pelo caminho.

A produção traz em si o aumento da utilidade das coisas. É - no sector secundário da economia - uma relação do homem com a transformação e com a máquina. Entendi, talvez por erro meu, ter havido ligeiras reservas quanto à componente técnica deste encontro. Se existiram lamento profundamente esse mal-entendido - mas não escondo que consideraria irónico que os méritos técnicos da história industrial do Barreiro, em que todos os seus trabalhadores participaram – repito, em que todos os seus trabalhadores participaram e eu neles incluído – tenham de ser contados e ouvidos com interesse na Bélgica, ou na Alemanha ou em qualquer outra parte industrialmente habituada e possam ser minimizados ou ficar ignorados aqui. Já que se fizeram no Barreiro coisas únicas, que isso fique dito para aumento justificado da nossa auto-estima e afirmação concreta da nossa capacidade.

Estamos pois todos cientes de que muito se poderia dizer mais sobre esta terra e que muito ficou por dizer, para além dos valores e potenciais aqui expostos. Em nada se deixou de acolher, neste encontro, o que se quis nele referir sobre o valor das gentes, das pessoas, e sobre as suas múltiplas manifestações, sem inclusive olvidar a expressão artística em que o Barreiro tem também sido pródigo e o confronto com outras comunidades industriais estrangeiras. Mas, por isso mesmo, numa altura em que as estátuas nos comovem, eu ousaria repetir um repto que foi aqui ouvido e que nem original é, na sua imerecida demora. Quando veremos uma estátua dignificante do trabalhador barreirense? Não numa visão fraccionista que olhe especificamente o da CUF, ou o da CP, ou o da indústria da cortiça, ou o ratinho, ou o camarro nato. Não! O trabalhador barreirense, um só, num verdadeiro padrão da terra que somos e da história que partilhamos!. Isto à laia de reflexão conclusiva, mas necessária, para que na obra se materializem as palavras.

E concluo:

Podem as entidades que organizaram esta celebração estar felizes com o que aqui decorreu. Podem congratular-se e agradecer as presenças e contributos que marcaram este evento. E, quase deixando apagarem-se as velas dos 100 anos das fábricas da CUF no Barreiro, posso certamente apossar-me de uma frase conhecida, acutilante e útil porque traduz a obra feita e bem realizada: “Conseguiu-se. É o principal.

Disse."

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A tempo 1: Encerrado o Colóquio, no AMAC, decorreram visitas dos Participantes a três pontos essenciais do património histórico-cultural na posse da QUIMIPARQUE (Bairro Velho, Casa-Museu Alfredo da Silva e Mausoléu de Alfredo da Silva). Antes da visita, os Participantes puderam levantar o CD intitulado "Cadernos do Grupo de Trabalho do Arquivo CUF/QUIMIGAL" que será referido com mais detalhe numa próxima oportunidade e que é um elemento de referência muito importante para quem estude a CUF/QUIMIGAL, as suas localizações fabris, o AP (Estarreja) e NP (Alverca).

A tempo 2: Horas depois, no Museu Industrial da Quimiparque, era inaugurada a Exposição Comemorativa do Centenário das Fábricas da CUF no Barreiro, que ficará patente até 20 de Dezembro. Esta Exposição, que tem como Comissário Rui Trindade e Arquitectura e Design da Arquitecta Joana Astolfi, representa, numa óptica moderna, o que ambos referiram como propósito no artigo "Expor - Inovar - Criar" do Jornal-Plano da mesma, que se transcreve com a devida vénia:

"Sendo o tema em questão [o Centenário das Fábricas da CUF no Barreiro] complexo, cheio de cruzamentos e contradições, optámos pela criação de atmosferas e ambiências que de algum modo traduzissem o espírito das várias épocas e permitissem aos visitantes uma vivência e uma relação com os objectos emocional e afectiva, algo que fosse motivador para futuras descobertas. Combinamos, por isso, as memórias e os imaginários, mesclámos os discursos e os objectos de modo a que se tornasse transparente como a preservação desse espólio industrial se pode transfigurar e dar a ver uma linguagem estética contemporânea, abrindo caminho, porventura, a novas abordagens na representação da História.

Esperamos que a possam disfrutar com olhar fresco e aberto ao futuro."

A não perder, já que é de ver, rever, sentir, recordar, pensar. Aos responsáveis pela Exposição aos colaboradores das entidades promotoras da Celebração e a todos os que nela intervieram e a ela deram o seu esforço, com a gana, o gosto e a delicadeza que uma Exposição requer, as minhas saudações pela obra relizada.

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sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Do paternalismo industrial: um comentário

Retomando uma intervenção na sessão da tarde de ante-ontem, 8, no já referido Colóquio "Industrialização em Portugal no Sec. XX:

"[...] E saúdo também o ouvir-lhe que o paternalismo industrial tem se ser visto de ambos os lados. Sem o que poderia conduzir à irónica figura de levar a dizer, do patrão que naquele contexto o praticava, que : Era tão mau, tão mau, que era só por mal todo o muito bem que fazia." [1]

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[1] A utilidade dessa bi-focalização resulta inclusive da especificidade do tema e da sua leitura no adequado contexto: recolhi já protestos de quem considera esta designação técnica como depreciativa do esforço filantrópico do patrão, bem como de quem a considerar atentatória da dignidade do trabalhador. Existe mesmo um comentário que li , feito a um dos diversos textos-notícias do "Rostos on line" sobre o "caso da estátua" (e que lamento não ter registado), que, dentro da dinâmica da luta de classes, o considerava como que uma traição à sua classe por parte do patrão que o praticasse, como se o modelo liberal e desumano da revolução industrial pudesse ser um modelo natural, que deveria rigorosamente definir uma das margens dessa fractura social - e assim "evitar-se-iam confusões", como dizia o comentador. É evidente que a segurança social, integrada nas medidas reformistas que reforçam o papel do Estado, surge para prover a tais coisas, mas falamos de tempos e locais em que a segurança social estava no campo dos futuros (a menos das medidas de Bismarck, que - "junker" e conservador - não era decididamente um convertido ao social e que antes até o tinha contrariado, mas que finalmente legislou sobre o assunto) e em que o movimento sindical era vigorosamente contrariado (ainda que a Igreja timidamente o defendesse). Daí a frase do "mau-mau", que acentua o contra-senso. Coisas da vida!

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Novamente, sobre Stinville...

Transcrição da exposição feita na sessão da manhã de ontem, dia 8, no Colóquio "Industrialização em Portugal no Século XX" realizado no Barreiro e integrado nas Comemorações do Centenário das Fábricas da CUF no Barreiro. Esta exposição não é a comunicação que constará do volume de comunicações do referido Colóquio, a editar no próximo ano. Trata-se apenas de um resumo dessa comunicação, com a duração de 15 minutos, que foi nele apresentado:

“Procurando Auguste Lucien Stinville (1868-1949) - Uma Presença Francesa no Início das Fábricas da CUF no Barreiro”: Um exercício de resumo em 15 minutos... ”

Por José Miguel Leal da Silva e Jean Yollant

[Começarei por, em meu nome e no do Sr. Jean Yollant, apresentar os protocolares cumprimentos em que reúno a coordenação e a assistência, mais saudando a realização e o motivo deste colóquio]

[1. O problema]



Foi com surpresa que, no dobrar do século, se constatou quão pouco se conhecia entre nós sobre A. L. Stinville, o engenheiro-construtor francês contratado por Alfredo da Silva para a realização global das Fábricas da CUF no Barreiro. Dele conheciam-se:
  • as menções nas actas do Conselho de Administração da CUF,
  • a fotografia no álbum do cinquentenário da Fábrica,
  • desenhos e planos que trazem evidente a assinatura técnica do seu Autor;
  • a menção toponímica no Bairro Velho da CUF
  • o álbum da construção e as fotografias de época que dizem muito sobre a obra e menos sobre Stinville; e
  • as referências contidas na única biografia integral de Alfredo da Silva então disponível, da autoria do Professor Dias Miguel., e que, embora não publicada, corria em cópias e citações.



Pouco mais se sabia, já que nem o mistério das duas iniciais A.L. da sua assinatura estava minimamente esclarecido.

Surgia assim um desafio tentador, com um objectivo preciso, que era: conhecer melhor Stinville, através de uma nota biográfica que, mesmo sumária, correspondesse aos perfis descritivos normais para homens de ciência ou da técnica.

Procurou-se responder a este desafio com uma investigação iniciada e prosseguida em Portugal, que - com exagerado optimismo – se admitia ser simples e breve.

Não foi nem simples, nem breve - mas enriquecedora:
  • Enriquecedora em termos de ensaio metodológico para uma investigação à distância, explorando a “net”;
  • Enriquecedora em termos de melhor se entenderem, também neste caso, as motivações quanto ao processo de escolha de agentes para o acesso a tecnologias trans-fronteiras na transição dos séculos XIX e XX;
  • Enriquecedora em termos da valiosa confluência com um registo exemplar de memórias familiares e dos diversos apoios individuais que, aqui e em França, se foram encontrando;
  • E, finalmente, “the last but never the least”., enriquecedora em termos do conhecimento e da colaboração que se estabeleceu entre os dois co-autores e com outros familiares de Stinville, aliás alguns presentes – e que permitiu chegar ao que chegamos e, sobretudo, o podermos trazer aqui.

[2. A pesquisa efectuada]

Três actas de reuniões dos conselhos de administração da CUF elucidam quanto à aproximação entre os interesses do empreendedor Alfredo da Silva e a capacidade e experiência de Stinville – e que, todas de 1907, têm as datas de 29 de Maio, 6 de Junho e 14 de Junho. Ou seja, em apenas 15 dias o projecto das Fábricas do Barreiro passa de concepturo a nascituro.

Na primeira o decidido Director-Gerente pugna pela construção das fábricas de ácido sulfúrico e de adubos fosfatados no Barreiro. Diz mesmo “a união dos productores estrangeiros faz pressão sobre os revendedores — qualidade que esta Companhia hoje tem — por forma a ser para aquelles o maior lucro e para estes o menor." Compreende-se pois como era necessária a obtenção de uma engenharia independentes para “furar” a cartelização da oferta , presente na tal “união dos productores estrangeiros”.

Mas, nessa primeira reunião, que é conjunta dos dois Conselhos, Alfredo da Silva, muito à sua maneira, traz já sob o braço a proposta e as condições de Stinville para realizar o trabalho. É deliberado chamar Stinville a Lisboa, mas – com lusitano aviso – escreve-se que a Empresa só custeará as despesas de viagem..


Na segunda reunião da Administração, esta singular, entra em cena um inesperado personagem ao dar como possível a fixação da terceira e decisiva reunião“visto já ter chegado a carta do sr. Jorge Lefebvre em resposta à que o sr. Alfredo da Silva lhe escreveu". Conclui-se que Alfredo da Silva escreveu a Lefebvre, como preparação do importante assunto – e a resposta deste surge como decisiva para uma reunião também decisiva. Mas quem é Lefebvre?

Num terceiro acto, que é a terceira acta, de 14 de Junho de 1907, em reunião novamente conjunta, é deliberado aprovar o projecto e conferir a Alfredo da Silva “plenos poderes para concluir com o sr. Stinville ou com quem melhor entendesse, todas as negociações para o fornecimento de projecto e estudo para a nova fabrica e bem assim para fazer as compras de todo o material e machinismos necessários, visto a decisão unanime dos Conselhos ser no sentido de se proceder à construção da fabrica, sem perda de tempo.”


As subsequentes actas abundam em referências a Stinville mas, após a designação,em 1910, do director residente por aquele apontado, o Engenheiro francês Castera, e, sobretudo, após a eclosão da I Grande Guerra, vão-se sucessivamente diluindo quanto a essa referência pessoal – por razões que se sugerem na comunicação escrita.

A última acta em que o nome de Stinville figura é já de Maio de 1925, com Alfredo da Silva voluntariamente exilado desde 1922, para aprovar a instalação duma fritagem de cinzas de pirite, “d’acordo com o estudo feito pelo nosso Administrador-Gerente e pelo Engenheiro Consultor da Companhia, Snr. Stinville”.. Depois disso, silêncio!

Silêncio que perpassa sobre três factos relevantes, no relativo ao engenheiro-construtor francês:
  • Dois relacionam-se com a Société des Usines Chimiques CUF, a SIC-CUF, em que participam Stinville, Alfredo da Silva, D. Manuel de Mello e a Sociedade Geral, uma empresa nascente Grupo: trata-se da constituição da sociedade de direito francês em 1925 e da sua liquidação em 1933, com entrega de activos à Sociedade Geral;
  • O terceiro, que é o segundo cronológicamente e já posterior ao regresso de Alfredo da Silva, é a designação, em 1927, do primeiro director técnico português das Fábricas do Barreiro, Eng. Eduardo Bravo Madaíl, que formalmente substitui Stinville nesse posto.

Não nos vamos alongar aqui na sucessão de processos que caracterizou a investigação feita e que será dissecada no texto escrito.

No essencial dir-se-á que, como objectivo, se procurou provocar uma “saturação qualificada dos balcões abertos na net” para temas correlativos ao procurado – e que fosse credora de repercussão pelos diversos motores de procura.

E foi assim que, em Novembro de 2005, uma das filhas do Sr. Jean Yollant, Mlle Corinne Yollant, estabeleceu a ponte que permitiu seguidamente, analisando as notícia e documentos na posse dos Familiares de Stinville - e com breves consultas nos Archives de Paris- resolver a questão dentro do objectivo imediato inicialmente traçado.– já que muito mais há a considerar quanto a uma personalidade tão rica quanto foi Auguste Stinville.

[3. Auguste Lucien Stinville: um perfil]

Stinville nasce em Paris aos 19 de Julho de 1868 com o nome de Auguste Lucien Lamouche – mas, por razões familiares e como seu pai já havia feito, adopta mais tarde o patronímico de Stinville. (Primeira dificuldade esta, para um investigador distante.)

Concluindo com distinção o secundário, no Colégio Colbert, em Paris, e rejeitado num concurso à Escola Naval por causa da sua miopia, emprega-se de 1885 a 1887 nos “Laboratoires de Paris”, onde, por influência de um antigo professor, é apresentado à comunidade química parisiense. Deste “abrir de olhos” num campo que realizava uma vocação anterior não-marinheira, dirá mais tarde que “saiu-me então a sorte grande!”

Isento do serviço militar em 1888, parte para a Inglaterra (ou País de Gales), em cuja indústria química faz um duro e intenso adestramento. Terá igualmente praticado nas instalações fabris da sociedade Maletra, na região de Bordéus.

Em 1890, com 22 anos, regressa a França. Nesse mesmo ano a adubeira “Compagnie du Guano Phosphate”, a cujo conselho de administração preside Jules Lefebvre (nome já nosso conhecido, embora como “Jorge”), decide construir uma unidade em Honfleur, na Normandia, para produzir ácido sulfúrico e superfosfatos, e procura tecnologia independente para esse projecto. Stinville candidata-se e, uma vez adjudicada a obra, realiza-a de 1890 a 1892, com plena satisfação da cliente. Antes porém, Stinville, receando que a sua juventude pudesse comprometer a sua proposta, antecipa o seu nascimento de 4 anos, ou seja, para 1864 – data que ficará a usar para sempre…(e que foi outro escolho para o investigador).


Porque “em equipe vencedora se não deve mexer”, a “Guano Phosphate” confere a Stinville a construção duma segunda e importante fábrica de adubos fosfatados, agora em La Pallisse – La Rochelle, na costa atlântica da França. Os trabalhos decorrem de 1896 a 1901. Stinville prepara intensamente um cunhado, Jules Yollant, para seu assistente na supervisão da obra e para ser seu “segundo” como director técnico da instalação.


Entendendo, em 1902, que a direcção técnica de La Pallisse lhe limita o horizonte profissional, renuncia ao cargo e faz a sua primeira viagem aos Estados Unidos. Jules Yollant ascende a director técnico de La Pallisse até 1906 e então, por permuta com o titular de idêntica função em Honfleur (de nome Castera), vai assumir a direcção técnica daquela fábrica até ao fim de 1918. Castera manter-se-á em La Palisse até 1910 e reencontrá-lo-emos, como já referido,… no Barreiro.

Segue-se, de 1905 a 1910, um importante trabalho para a “Société d’Eclairage, Chauffage et Force Motrice” (uma precursora da “Gaz de France”). Visa a remodelação da rede de gás de cidade na região de Paris, com três instalações de produção e de distribuição (de Gennevilliers, Alfortville e Boulogne sur Seine), respectivos serviços e anexos, incluindo uma importante ligação ferroviária e a construção dum porto fluvial no Sena – experiências que certamente serão úteis para o que vai realizar no Barreiro.


Casa em 1906 e, em 1907, o jovem casal vai mudar para uma espaçosa casa que fez construir em Versailles. O seu primeiro escritório parisiense, próximo da sua residência enquanto ainda em Paris, muda para maiores instalações em 1908 e, com nova mudança já durante a I Grande Guerra, instala-se finalmente no nº 14 da rua de Chauveau-Lagarde, onde se manterá até ao termo da actividade profissional, na transição dos anos 30-40.. Enviúva em 1916, sem que o casal tenha tido descendência.

Em 1907 Alfredo da Silva chama-o a Portugal para a realização global das Fábricas do Barreiro. Das memórias sobre Stinville, que um seu sobrinho deixou, destaca-se a seguinte nota: «Muitas outras fábricas foram obra sua. Entre estas, um certo «da SILVA», importante homem português, encarregou-o de construir uma fábrica de adubos semelhante às francesas. Situou-a «em Bareiro [sic], frente a Lisboa» . As fábricas serão construídas de 1907 a 1909, iniciando-se logo uma ampliação, e Stinville, que se mantém em Paris, recebe o cargo de Director Técnico das mesmas, cargo que mantém até 1927 e que exercerá através dos engenheiros residentes Pellet, na construção, e Castera, na operação fabril, este a partir de 1910.

De 1914 a 1918, a Europa está em guerra. Em 1916 Louis Loucheur, membro do Governo na sensível área dos armamentos, nomeia Stinville para, inspeccionar vários estabelecimentos espalhados pelo Mundo que trabalham para o esforço de guerra francês. Esta verdadeira “circum-navegação”ocupá-lo-á até 1918. Recusa qualquer distinção honorífica pelos serviços prestados.

Tendo compreendido, nas suas deslocações à América, a importância futura dos processos de filtração electrostática dos gases, é “editor científico”, em 1918, duma brochura sobre o assunto e, em exclusivo, introduz em França as patentes Cotrell – Mohler, o que lhe garante um continuado trabalho de engenharia. Patenteia aperfeiçoamentos nos fornos de andares para queima de pirite.

Em 1925 , com Alfredo da Silva, D. Manuel de Mello e a Sociedade Geral, é accionista fundador da já referida SIC-CUF, sociedade comercial com sede em Paris. Em 1937 responde a várias questões técnicas levantadas por Alfredo da Silva sobre o “processo Basset” para a co-produção de lupas de gusa e de cimento em fornos rotativos, (processo que chegou a funcionar em Alhandra, em 1940) – mas desaconselha o Industrial portugês quanto a essa primeira tentativa siderúrgica. Em 1948, já retirado, corresponde-se ainda com técnicos da CUF, do Barreiro, com os quais mantém um diálogo especializado.

Morre em Paris, a 7 de Agosto de 1949, vítima de pneumonia, em casa de sua irmã mais nova. Adèle, junto de quem passara a habitar quando abandonou Versailles, alguns anos antes. O funeral teve lugar no dia seguinte, para o túmulo da “Família Stinville” no cemitério velho de Colombes, nos arredores de Paris. Tinha 81 anos… ou melhor, 85.

Receia-se que todos os documentos e informações eventualmente na posse de Stinville quando da sua morte não tenham sido recuperados e, portanto, estejam perdidos.

[4. Os franceses no Barreiro]

Caberia aqui mencionar, sob o título de “Os Franceses no Barreiro”, o importante papel de Stinville relativamente à selecção e colocação de pessoal expatriado em Portugal, desde engenheiros residentes até encarregados, mestres e operadores especializados franceses (e não só) para apoiar as instalações na sua marcha regular e colaborar na formação do pessoal português. Existem várias fontes quanto a essa presença, sugerindo um oportuno aprofundamento. Enumeraremos, na comunicação escrita, as principais pistas para um eventual desenvolvimento do tema – que vai da enumeração e conhecimento de pessoas e entidades a ele ligadas até à utilidade de uma acção de emergência que procurasse reter a terminologia de origem francesa de que ainda possa haver memória no linguajar fabril barreirense , como "malaxagem, lessivagem, fritagem, cuperdino, igréco, bombardear, pompar (ou pompear)" e outras, de idêntica evidência. e que ainda se diziam no início dos anos 60.

Dão-se alguns exemplos de documentos presentes nos arquivos da CUF:




[5. Alfredo da Silva em França: a SIC CUF]

Voltando-nos agora para Alfredo da Silva. É sabido como, mesmo quando voluntariamente exilado, não deixou jamais de manifestar o seu permanente entusiasmo pela realização de indústria.

Uma destas iniciativas, partilhada com Stinville, foi a já referida SIC-CUF, com sede em Paris, no escritório deste, constituída em 1925 e liquidada em 1933. O seu objecto social é um prodígio de latitude ao mencionar “Exploração de minas e pedreiras. Compra e venda de corpos simples e compostos” que mal deixa adivinhar o alegado propósito de produzir alumínio, recorrendo à energia eléctrica gerada a baixo custo em aproveitamentos pirenaicos.

Outra instalação industrial realizada por Alfredo da Silva, já não em França mas em Espanha, que inclusive recebeu uma visita do então monarca espanhol, Afonso XIII, foi a tão pouco referida Fábrica de Adubos de Sevilha, posteriormente vendida, e de que seria muito interessante dela saber mais.

[6. Lucien Yollant (1894-1983) e o mérito das memórias familiares ]

Grande parte do conhecimento obtido sobre Auguste Lucien Stinville deve-se ao seu sobrinho Lucien Yollant, filho de Lucie Lamouche, a irmã mais velha de Auguste Stinville e de Jules Yollant - o já referido cunhado que acompanhou Stinville na construção e que lhe sucedeu na direcção técnica da fábrica de la Palisse.

Nascido em 1894, a mudança familiar para a Normandia leva Lucien a estudar no liceu de Caen. Os seus estudos são bruscamente interrompidos pela mobilização consequente à eclosão da I Grande Guerra e só serão retomados após o armistício - licenciando-se em engenharia na Centrale e fazendo toda a sua carreira profissional nos caminhos de ferro.

De Lucien e em relação a Stinville há duas notas importantes a reter:

  • A primeira diz respeito ao périplo inspectivo que, durante a I Grande Guerra, o ministro Loucheur confiou a Stinville. Com esta designação, foi-lhe dada a possibilidade de designar um secretário que o acompanhasse. Stinville escolhe o sobrinho – mas Lucien, apesar da grande admiração que sempre teve pelo tio e da oportunidade que lhe é dada, recusou a designação e preferiu prosseguir a luta ao lado dos seus camaradas das trincheiras.
  • A segunda nota diz respeito ao registo e preservação das memórias familiares. Já reformado, Lucien Yollant organizou, até à sua morte (em 1983), as memórias, registos e documentos de seu pai e do “tio Auguste”, notas essas que estão guardadas por seu filho, Jean Yollant, com quem tenho a honra da co-autoraria desta comunicação. Esse laborioso trabalho, de registo e de inventário permitiu a feliz confluência de duas linhas de investigação saídas de locais diferentes, em tempos diferentes, mas que felizmente se encontraram, Muito do que se aqui rapidamente se referiu traz a marca desse excelente exemplo que poderá inspirar acções idênticas, nomeadamente aqui. Há sempre muito de ainda-não-contado que procura as palavras e que morre se ninguém lhas encontra.

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[As 12 pequenas projecções em "power-point" que se pensava fossem projectadas "em rajada" e praticamente sem palavras no fim da exposição, para ilustrar o texto, acabaram por ser projectadas à medida que a exposição prosseguia, com o posicionamento supra indicado]

Estatística do texto: 20081008 // Pag 9 Paragr 63 Linhas 279 Palavras 2775 Caracteres TNR 12 s/ esp 14626 c/esp 17430: leitura 15'

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Ao menos...uma boa noticia

Cabeças de flamingo [1]

Domingo à tarde, flamingos na Ilha do Rato e numa língua de areia frente ao Bico da Passadeira. Juntos às gaivotas. E não era o "um ou dois", era um bando já considerável!

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[1] De: http://spot.colorado.edu/~humphrey/fact%20sheets/flamingo_caribbean/images/flamingo_head.gif
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terça-feira, 7 de outubro de 2008

A Exposição comemorativa dos 100 anos da CUF no Barreiro: o Convite

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segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Do colóquio de 8, 9 e 10 no Barreiro: o programa

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Com o atraso de um dia, graças à RP, cumpre-se o prometido...E para ampliar e tornar legível o programa, já se sabe: clicar sobre a imagem!