sexta-feira, 31 de outubro de 2008
quinta-feira, 30 de outubro de 2008
"Filme em aula de Moral abre polémica"
.

O episódio não podia deixar de me recordar um outro em que uma certamente diferente motivação levou a uma situação algo parecida. No ano lectivo 1953/1954 as irrequietas turmas do 7º ano do Liceu de Alexandre Herculano do Porto (as tais que no ano anterior tinham fundado "O Prelúdio"), sob inspiração do então Professor de Moral Padre Alexandrino Brochado, participaram na constituição de um "clube de cinema" que utilizava para o efeito as magníficas instalações da ala poente do Liceu - desenvolvendo assim, para os alunos aderentes, uma actividade bem mais útil que o marchar à futrica, na lama ou na poeira do recreio, às 4ªs feiras à tarde. Obtido o amável apoio de um representante cinematográfico no Porto, que nos cedia as bobines por um preço a todos os títulos simbólico, se algum, e nos conferia os direitos de projecção, passamos películas interessantes e muito variadas - abrindo os olhos da "malta" para alguns dos aspectos da 7ª Arte. Foi assim que, sem problemas, passamos "Os Ladrões de Bicicletas", que já de si vinha censurado, e, algum tempo depois, "O Milagre de Milão". Tanto bastou para que um mui zeloso pai de um dos alunos aderentes fizesse sentir, por carta ao Reitor, que estava a haver uma preocupantemente exagerada inclinação pela corrosiva filmografia neo-realista italiana - o que imediatamente, e ao sabor da época (ainda que todos os filmes passados tivessem tido ampla permanência no circuito comercial), levou à extinção do meritório clube. [1]
Conclusão: nestas coisas de passar em escolas filmes de cunho realista, ponderando a diferença de conteúdos mas o que remanesce do "então como agora", há sempre a possibilidade de olho arguto descortinar a dedada de um alegado diabinho escondido, olé se há!!! Deve ser o "demónio de Maxwell", à falta de outro! Só que as coisas acontecem... e já nem escondidas estão. E, como no título de um outro filme, "Amanhã será tarde"...
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
[1] Já antes "O Prelúdio" tinha tido problemas por causa do cinema, ao publicar o texto de um aluno sobre a "lei do cinema" que tinha por essa altura saído e que era observada com inicial rigor. Comentava esse texto não a lei em si e sim os critérios de classificação dos filmes para acesso etário diferenciado - mas, mesmo nesse plano, deu chatice e da grossa - que o nosso esclarecido Reitor soube gerir bastante bem, inclusive "encomendando-nos" uma entrevista pre-fabricada para apaziguar os super-ultras que se excitaram com a prosa do moço. Isto ensinou-nos bastante, pois que além do cagaço que a solene chamada à reitoria nos causou - e dos aborrecimentos que o Professor Orientador, o sapiente Dr. Manuel da Cruz Malpique deve ter tido, mas que nunca nos disse palavra sobre isso e assumiu frontalmente a situação (constou-nos depois, por portas e travessas, que ameaçara demitir-se da função se a coisa trasbordasse) - verificamos por experiência própria como funcionava o "sistema". Essa lei do cinema deu origem a um episódio curiosos, de que fui protagonista: passava no Cinema Batalha (o tal onde tinham apagado uns "frescos" porque eram contrários "à ideologia do Estado Novo") o "Maria Walewska" - creio que com a Greta Garbo - mas o filme fora classificado para maiores de 18 anos (eram 17 ou 18 anos? não me lembro). Sucede, porém, e isso já me lembro, que eu tinha menos um ano que o limite imposto - e que queria ver o filme. Dirigi-me ao polícia que então estava à beira dos porteiros e disse-lhe: Senhor Guarda eu quero ver o filme, faltam-me só uns meses para ter a idade mas já conheço a história de cor e salteado!" (e conhecia de facto). O guarda olhou para mim, espigadote que eu já era, e só disse: "Vá lá comprar o bilhete!". E assim vi o filme.
.
.
quarta-feira, 29 de outubro de 2008
Os 3 Magalhães

Dos muitos Magalhães que conheci, vou destacar três.
A primeira é a atitude complacente e plasmada, passiva e indiferente, pantanosa em si mesmo, a do "Ai é? tenho mais que fazer que me preocupar com essas coisas!"
A terceira é corporativa. O dito maquinismo vai tomar o pouco tempo que ainda sobeja a uma série de gente (progenitores e profs), para que possam explicar aos putos como é que se mexe naquilo, como é que se usa aquilo, como é que se alimenta utilmente aquilo com exercícios, questões, textos, explicações da natureza - sendo evidente que esta natureza se deve entender num sentido restrito já que o dito Magalhães permite limitar certos acessos, que poderão ficar para a Mamã e o Papá em navegações fora de horas e nunca naquele equipamento. Esta é a posição, também nacional, do "não me lixes, não me lixes, não me lixes!" que sempre se diz quando a uma vida atarefada alguém tem o mau gosto de acrescer uma qualquer fracção de nova tarefa, uma delta-tarefa mesmo que pequenina.
Por estas e por outras eu sou por este Magalhães. Sou mesmo, baratinho que é. Porque acredito em desafios, Porque entendo que, mesmo aos encontrões,"o mundo pula e avança", como vem no poema dito ou cantado, ou no silvano "para trás mija a burra" - que são duas formas com distinta distinção para dizer a mesmíssima coisa.
.
terça-feira, 28 de outubro de 2008
Cantar de trabalhadores rurais (Aljustrel)
.
"Nós somos trabalhadores
Que no campo trabalhamos,
Trabalhamos ao rigor
E a pedir ao lavrador
Quando trabalho não temos.
À Cambra se dirigimos
A pedir ao Presidente
Que tenha dó desta gente
E nos dê algum destino.
E nos dê algum gasalho,
À Cambra se dirigimos
A dizer o que sentimos
Quando não temos trabalho."
Em LOBATO, Pe. João Rodrigues, Aljustrel - Monografia,
C.M. Aljustrel, 1983, pag.176
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
.
segunda-feira, 27 de outubro de 2008
Algumas notas
O dia merece algumas notas soltas.
E, por isso, começarei aqui a descarregar a vagona:
.
domingo, 26 de outubro de 2008
sábado, 25 de outubro de 2008
sexta-feira, 24 de outubro de 2008
Caçar fantasmas - 4 - A guerra das matérias-primas
.
A guerra das matérias-primas, a "guerra económica", que caracterizou a II Grande Guerra, teve inevitáveis reflexos em Portugal. Disso dá conta o soneto de Acácio de Paiva, com o significativo título "Petróleo e Ferro", publicado na secção "A Fita da Semana" de "O Século", de 22 de Abril de 1940:
"Como há petróleo e ferro no País
(Novidade que sei desde criança)
Vá de apregoar nas folhas a abastança!
Não se botam foguetes por um triz!
Que a Inglaterra, que a Alemanha e a França
Não tenham a menor desconfiança
De que somos um povo tão feliz!
Se eles souberem que durmo sobre um leito
De ferro e tenho duas lamparinas
Com petróleo, partidas, por sinal,
Carreguem os canhões, preparem minas,
Porque não tarda um cerco a Portugal."
quinta-feira, 23 de outubro de 2008
Jules Lefebvre... ou os riscos da "net"

Não era exactamente o que eu procurava, mas... ah, Jules, "pompier" que tenhas sido!
.
quarta-feira, 22 de outubro de 2008
Caçar fantasmas - 3 - Da beleza feminina... em 1940
O primeiro mostra como, já na época, as "mesdames" corriam atrás do tempo quais versões femininas do Doutor Fausto - neste caso à procura de "Margaridos". Explica tintim por tintim como uma senhora de 35 anos passou a perna a uma miúda de 19, limpando-lhe o noivo - aliás, e como convém nestes contos de encantar, um "rico industrial". O anúncio exibe as encadernações faciais duma e doutra, identificadas pelos respectivos números natalícios - como se fossem jogadores de futebol de hoje, prontos a entrar em campo. De facto não há dúvida... mas temos de concordar que ou a senhora de 35 anos tem 19 ou a loira (porquê loira?) de 19 anos não recebeu a mínima estimação por parte do desenhador. Vejam só, como dizia o comentador brasileiro de documentários Luís Jatobar (no tempo em que a sessão de cinema tinha dois intervalos, documentário e desenhos animados a acepipar o filme de fundo):
O segundo demonstra cabalmente como todas as coisas devem ser lidas no contexto e avaliadas no conhecimento da época, por muito deslocado que ele possa parecer ao tempo do observador, e assim o que hoje é branco amanhã pode ser, pelo menos, cinza-escuro (quem não lavou os dentes com o hoje banido hexaclorofene na pasta?). Pois leia-se o que está directamente por baixo dos boiões e frascos que limitam inferiormente o rosto da "madame". Mas, nisto duma "radioactividade benéfica comummente acessível" que era chic e marcou os anos 20, 30 e até 40, sendo esta já uma década serôdia a que a era atómica pôs definitivamente cobro, há mais casos. Oh se há!
terça-feira, 21 de outubro de 2008
Caçar fantasmas - 2 - Que bons alunos eles eram...
.
Título de notícia de primeira página, em "O Século", de 28 de Setembro de 1940:
"Mais de dois mil professores aclamaram o Sr. Ministro da Educação que pronunciou um primoroso discurso na recepção que lhes foi oferecida na Exposição do Mundo Português."
[*] cortesia a www.lionden.com/
segunda-feira, 20 de outubro de 2008
Caçar fantasmas -1 - O balão de Tabuaço
.
quadro no IWM, referido no artigo deAlice Kershaw "Witness 2 - The art
of WWII at Imperial War Museum North", de 2007.02.02, publicado em
http://www.24hourmuseum.org.uk/nwh_gfx_en/ART43403.html
Pois, dos balões que vieram e que mereceram notícia e foto, destacarei o "balão de Tabuaço". Não porque fosse maior, ou porque fosse diferente, mas porque a sua chegada rodeou-se de peripécias dignas de historieta bufa. Gostaria de ter tempo para a investigar e para a escrever, potencialmente em tons cómicos, tão desvairada me parece e de tal forma interfere com os localmente grados intervenientes de zelosas organizações da época, cumprimentando-se certamente "à romana" mas procurando dar-se caneladas por baixo da mesa como era então costume e levava o Chefe-mor a profundas reflexões do tipo: "Já há meses que em Vilar de Ordem [nome fictício, claro!] o Presidente da Câmara não me faz queixas do "leader" da União Nacional e que o "leader" da União Nacional não me faz queixas do Presidente da Câmara. Não auguro nada de bom! Temos de ir lá saber o que se passa!"
Mas o mais importante é que as controversas posições em torno do balão (balão e não barão!) de Tabuaço, e que envolvem situações mais que duvidosas, escaparam ao lápis azul da censura (este algo mais brando mas igualmente tão impertinente quanto o do D.Paco) - e só isso diz ou que o censor estava adormecido ou que, como se constatou noutros casos, a situação era insusceptível de se encobrir. Ao que eu sei a coisa começou com duas questões: os da terra queriam ficar com o balão (talvez para fazerem cuecas, como se fazia dos sacos de enxofre), as "austeridades" queriam entregar o balão, uma vez esvaziado, a quem de direito - havendo um imediato litígio de competências entre os poderes civis, os militares e, mais fortemente ainda, entre estes e a LP (Legião Portuguesa, para quem não saiba). Optaram por o levar para o centro administrativo mais próximo, a nível distrital, quando o "povo" já tinha esvaziado e dobrado o balão... mas, pelo caminho, outro povo se "alevantou", apossou-se do balão e meteu-o numa igreja - o que traduz a emergência picante de um outro poder: o clero.
Chamadas as autoridades policiais, estas vieram - mas gerou-se motim, e tiveram de vir mais autoridades policiais que acabaram por transportar o balão e aprisionar os cabecilhas (há sempre cabecilhas nestas coisas), sendo de crer que essas autoridades policiais fossem acompanhadas por outras menos fardamentadas mas igualmente policiais e metediças, como as que apareciam e apareceriam em vários quiproquós nortenhos, relacionados com manifestos agrícolas, mau-estar laboral, dúvidas eleitorais, escritos na parede ou questões de mineralogia aplicada. Tudo pela Nação, claro.
Por isto o balão de Tabuaço e os seus "desacatos" (é este o termo exacto pudicamente usado nas notícias) me atraem tanto. Não sei se terei tempo para me dedicar ao mesmo, mas deixo pistas - porque posso não ter. E o assunto merece, se merece! Que bela e divertida tese eu terei perdido!!!
Aí vão as ditas pistas: "O Século", 6 de Janeiro de 1941, pag. 6 coluna 7 e, pelo menos, 7 de Janeiro, última página, coluna 5 - mas creio haver breves referências anterior e posteriores. Também em 1940, no mesmo jornal, registara-se a chegada de outro gigantesco balão, já não a Tabuaço, mas com espectacular foto e tudo! A não perder!
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
NOTA DO BLOGUISTA: Com a conclusão das celebrações do Centenário das Fábricas da CUF no Barreiro, a que atentamente assisti, e uma posterior saída para a capital da Lusitãnia, tenho todo o expediente bloguista atrasado. Não é que seja muito denso, mas é atrasado - sobretudo no tocante a imagem. Como já sucedeu noutras vicissitudes, e até porque o material existe, recuperá-lo-ei lentamente. A quem gostar de ler este blogue, as minhas desculpas e o convite ao exercício recapitulativo a que obrigarei. Lamento, por isso!
domingo, 19 de outubro de 2008
sábado, 18 de outubro de 2008
sexta-feira, 17 de outubro de 2008
quinta-feira, 16 de outubro de 2008
quarta-feira, 15 de outubro de 2008
terça-feira, 14 de outubro de 2008
segunda-feira, 13 de outubro de 2008
O CD com os "Cadernos do Grupo de Trabalho do Arquivo da CUF/QUIMIGAL"
O CD está estruturado em 5 Secções – Secção I: Índices Gerais; Secção II: Índices Temáticos; e Secção III: Índices da revista “Indústria”; Secção IV: Cronologias CUF e QUIMIGAL; Secção V: Cronologias AP - Amoníaco Português e NP – Nitratos de Portugal.
Nas duas primeiras secções (Secção I e Secção II) cada sub-divisão corresponde, fisicamente, a um Caderno já elaborado pelo grupo. A estrutura “em livro” manteve-se, por isso cada Caderno tem a “folha” (ficheiro) correspondente à capa, a folha (ficheiro) correspondente à relação de fontes utilizadas, à introdução, etc.
Nas Secções IV e V, um ficheiro é um Caderno por inteiro. Na Secção III, o Caderno é o resultado dos ficheiros apresentados.
Cada Caderno é por sua vez, apresentado numa nota introdutória ou parte explicativa, que acompanha a sua edição, o que permitirá eventualmente, uma exploração mais eficaz das potencialidades do mesmo, por parte do utilizador. A bibliografia utilizada vem igualmente, detalhada para cada situação.
Assim, tem-se:
- Actas C.I.E. [Comissão Interna da Empresa] (Ficheiros: “Actas C.I.E. 1963 – 1974 _Capa”; “Actas C.I.E. 1963 – 1974 _ Introdução”; “Actas C.I.E. 1963 -1974”).
- Boletim CUF (Ficheiros: “Boletins CUF 1963 – 1979_Capa”; “Boletins CUF 1963 – 1979_Introdução”; “Boletins CUF 1963 – 1979”).
- QUIMIGAL Noticiário (Ficheiros: “QUIMIGAL Noticiário_Capa”; “QUIMIGAL Noticiário 1 – 135”).
- Caderno I : Produção: Ficheiros: “Produção _Capa (2.ª ed.)” “Produção Siglas”“Produção _Introd. (2.ª ed.)” “Produção_A – Z (2.ª ed.)” “Produção_ Fontes”
- Caderno II : Serviços e Estruturas: Ficheiros: “Serviços e Estruturas_Capa (2.ª ed.)”“Serviços e Estruturas_Introd. (2.ª ed.)” “Serviços e Estruturas_ A - Z (2.ª ed.)” “Serviços e Estruturas_ Fontes (2.ª ed.)”
- Caderno III : Pessoal Ficheiros: “Pessoal _1 (A – D) _Capa (2.ª ed.)”; “Pessoal _2 (E – M) _Capa (2.ª ed.)”: “Pessoal _3 (N – Z) _Capa (2.ª ed.)”; “Pessoal _ Introdução (2.ª ed.)”; “Pessoal _1 (A – D) (2.ª ed.)”; “Pessoal _2 (E – M) (2.ª ed.)”; “Pessoal _3 (N – Z) (2.ª ed.)”; “Pessoal _ Fontes (2.ª ed.)”.
- Caderno IV : Pessoal C.I.E. e CT’s [Comissão de Trabalhadores] Ficheiros:“Pessoal CIE – CT’s A – F Capa (rev 2008)”; “Pessoal CIE – CT’s G – Z Capa (rev 2008)”; “Pessoal CIE – CT’s A – F (rev 2008)”; “Pessoal CIE – CT’s G – Z (rev 2008)”; “Pessoal CIE – CT’s Introd. (rev 2008)”; “Pessoal CIE – CT’s Sinopse (rev 2008)”; “Pessoal CIE – CT’s Fontes (rev 2008)”
- Caderno Especial: Ficheiros: “Ao Serviço da Empresa _(A – I) _ Capa (rev 2008)”; “Ao Serviço da Empresa _(J – Z) _ Capa (rev 2008)”; “ Ao Serviço da Empresa _ Introd. (rev 2008)”;“Ao Serviço da Empresa _(A – I) (rev 2008)”; “Ao Serviço da Empresa _(J – Z) (rev 2008)”; “Ao Serviço da Empresa _ Fontes (rev 2008)
- Ficheiros: “Revista Indústria _ Índice por revista”; “Revista Indústria - Índice de títulos”; “Revista Indústria _ Índice por autores I”; “Revista Indústria _ Índice por autores II”; “Revista Indústria _ Índice de assuntos A – Z”.
- Ficheiros: “Cronologia I _ CUF Centenário (1865 – 1965)”; “Cronologia II _CUF (1965 – 1977)”; “Cronologia III _ QUIMIGAL (1977 – 1989)”; “Cronologia IV_ QUIMIGAL (1989 – 1997)”;
Secção V – Cronologias AP e NP
- Ficheiros: “Cronologia AP”; “Cronologia NP”
domingo, 12 de outubro de 2008
sábado, 11 de outubro de 2008
Do encerramento do Colóquio, a 10 de Outubro / A Exposição
A terceira peça que aqui trago a propósito do já referido Colóquio - que foi encerrado com um excelente discurso da Vereadora Dra. Regina Janeiro - é a intervenção de encerramento que produzi. E não maçarei mais, sobre este evento:
Não houve nem redução de perspectivas, nem rateio de participações. Todos os que se inscreveram puderam dizer o que se propunham dizer e, dentro da disciplina do tempo, que é um respeito por todos, puderam intervir no que se propunham intervir. Ninguém procurou convencer ninguém: apenas se levaram factos ao conhecimento e à reflexão e se fez História com H grande em que sobressaiu o muito que nos une, numa identidade barreirense que se não limita aos que aqui nasceram mas que acolhe e ouve os que para aqui vieram, e em que ressaltaram certamente os pontos de vista diferentes, como é normal nas comunidades que recordam o seu passado e nele revêem e preparam activamente o seu futuro.
Se não me fica bem cumprimentar por tudo isto a Comissão Científica na parte que me toca, não hesitarei em fazê-lo aos seus outros membros que não eu, e, por maioria de razão, aos moderadores dos painéis, aos comunicadores, aos assistentes, interventores ou não, e a todos os que integraram a estrutura competente com que a Universidade Autónoma de Lisboa organizou este colóquio, ou que, membros das entidades promotoras do evento – CMB, CUF SGPS, QP e JdM, na sua organização também intervieram. A estas entidades reitero, em nome da Comissão, os agradecimentos pelas facilidades conferidas.
O Barreiro, pelas dificuldades e titubeações da nossa industrialização, é uma comunidade singular, um caso de estudo, em que a indústria nasceu e marcou de forma decidida, em que ganhou alongado sentido a palavra produção. Valorizo essa palavra produção em todas as suas componentes, nomeadamente na criação de valor que efectivamente lhe assiste – num momento em que, à nossa volta, o mundo treme com a criação de valores balofos sem que a produção lhes tivesse dado o necessário substrato. Valorizo essa palavra produção nos termos em que muitos de nós os vivemos e com todos os custos que as comunidades industriais, daqui ao longínquo Japão, dando a volta ao mundo por qualquer dos sentidos, efectivamente os viveram e que, em qualquer latitude e longitude, devem ter em conta as componentes espaço e tempo e serem necessariamente interpretados no contexto.
Somos, repito, um caso singular. Assim o mostramos nestes animados dias em que mais uma vez nos encontramos e debatemos a nossa identidade. E isso sucede porque temos uma identidade a debater e temos uma identidade a preservar e temos uma identidade a transmitir mesmo quando o espaço das fábricas se reduziu, mesmo quando se verificaram os efeitos dissolventes da suburbanidade que é, sem dúvida, o nosso maior risco. O Barreiro deve ver-se e representar-se como Barreiro, procurando a excelência dos seus méritos, mostrando ou recuperando a capacidade invejada do seu paradigma industrial, mas sabendo sempre diferenciá-la. Assim foi o Barreiro histórico, assim o Barreiro deve ser se quiser atrair futuro. Como sentiu o criador das fábricas da CUF aqui, há 100 anos, o Barreiro tinha vantagens competitivas que ele adoptou e usou certamente em proveito da empresa que era a sua, sem nunca o ter escondido, já que não tinha papas na língua. E, incontornavelmente, através da Fábrica que celebramos, nisso envolveu e modificou o Barreiro, nos que aqui estavam e nos que aqui acorreram no anseio de algo melhor – em qualquer sentido - daquilo que tinham de onde vieram. Como eu próprio fiz em 1961, tomando o caminho do Barreiro, e orgulho-me disso. Mas como hoje sucede em qualquer sistema - repito: em qualquer sistema - temos de manter e desenvolver as nossas vantagens competitivas. E de potencializar, no melhor sentido, as novas oportunidades que encontrarmos, sem nos autoflagelarmos pelo caminho.
A produção traz em si o aumento da utilidade das coisas. É - no sector secundário da economia - uma relação do homem com a transformação e com a máquina. Entendi, talvez por erro meu, ter havido ligeiras reservas quanto à componente técnica deste encontro. Se existiram lamento profundamente esse mal-entendido - mas não escondo que consideraria irónico que os méritos técnicos da história industrial do Barreiro, em que todos os seus trabalhadores participaram – repito, em que todos os seus trabalhadores participaram e eu neles incluído – tenham de ser contados e ouvidos com interesse na Bélgica, ou na Alemanha ou em qualquer outra parte industrialmente habituada e possam ser minimizados ou ficar ignorados aqui. Já que se fizeram no Barreiro coisas únicas, que isso fique dito para aumento justificado da nossa auto-estima e afirmação concreta da nossa capacidade.
Estamos pois todos cientes de que muito se poderia dizer mais sobre esta terra e que muito ficou por dizer, para além dos valores e potenciais aqui expostos. Em nada se deixou de acolher, neste encontro, o que se quis nele referir sobre o valor das gentes, das pessoas, e sobre as suas múltiplas manifestações, sem inclusive olvidar a expressão artística em que o Barreiro tem também sido pródigo e o confronto com outras comunidades industriais estrangeiras. Mas, por isso mesmo, numa altura em que as estátuas nos comovem, eu ousaria repetir um repto que foi aqui ouvido e que nem original é, na sua imerecida demora. Quando veremos uma estátua dignificante do trabalhador barreirense? Não numa visão fraccionista que olhe especificamente o da CUF, ou o da CP, ou o da indústria da cortiça, ou o ratinho, ou o camarro nato. Não! O trabalhador barreirense, um só, num verdadeiro padrão da terra que somos e da história que partilhamos!. Isto à laia de reflexão conclusiva, mas necessária, para que na obra se materializem as palavras.
E concluo:
Podem as entidades que organizaram esta celebração estar felizes com o que aqui decorreu. Podem congratular-se e agradecer as presenças e contributos que marcaram este evento. E, quase deixando apagarem-se as velas dos 100 anos das fábricas da CUF no Barreiro, posso certamente apossar-me de uma frase conhecida, acutilante e útil porque traduz a obra feita e bem realizada: “Conseguiu-se. É o principal.”
Disse."
- - - « « « «» » » » - - -
A tempo 1: Encerrado o Colóquio, no AMAC, decorreram visitas dos Participantes a três pontos essenciais do património histórico-cultural na posse da QUIMIPARQUE (Bairro Velho, Casa-Museu Alfredo da Silva e Mausoléu de Alfredo da Silva). Antes da visita, os Participantes puderam levantar o CD intitulado "Cadernos do Grupo de Trabalho do Arquivo CUF/QUIMIGAL" que será referido com mais detalhe numa próxima oportunidade e que é um elemento de referência muito importante para quem estude a CUF/QUIMIGAL, as suas localizações fabris, o AP (Estarreja) e NP (Alverca).
A tempo 2: Horas depois, no Museu Industrial da Quimiparque, era inaugurada a Exposição Comemorativa do Centenário das Fábricas da CUF no Barreiro, que ficará patente até 20 de Dezembro. Esta Exposição, que tem como Comissário Rui Trindade e Arquitectura e Design da Arquitecta Joana Astolfi, representa, numa óptica moderna, o que ambos referiram como propósito no artigo "Expor - Inovar - Criar" do Jornal-Plano da mesma, que se transcreve com a devida vénia:
"Sendo o tema em questão [o Centenário das Fábricas da CUF no Barreiro] complexo, cheio de cruzamentos e contradições, optámos pela criação de atmosferas e ambiências que de algum modo traduzissem o espírito das várias épocas e permitissem aos visitantes uma vivência e uma relação com os objectos emocional e afectiva, algo que fosse motivador para futuras descobertas. Combinamos, por isso, as memórias e os imaginários, mesclámos os discursos e os objectos de modo a que se tornasse transparente como a preservação desse espólio industrial se pode transfigurar e dar a ver uma linguagem estética contemporânea, abrindo caminho, porventura, a novas abordagens na representação da História.
Esperamos que a possam disfrutar com olhar fresco e aberto ao futuro."
A não perder, já que é de ver, rever, sentir, recordar, pensar. Aos responsáveis pela Exposição aos colaboradores das entidades promotoras da Celebração e a todos os que nela intervieram e a ela deram o seu esforço, com a gana, o gosto e a delicadeza que uma Exposição requer, as minhas saudações pela obra relizada.
.
sexta-feira, 10 de outubro de 2008
Do paternalismo industrial: um comentário
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
[1] A utilidade dessa bi-focalização resulta inclusive da especificidade do tema e da sua leitura no adequado contexto: recolhi já protestos de quem considera esta designação técnica como depreciativa do esforço filantrópico do patrão, bem como de quem a considerar atentatória da dignidade do trabalhador. Existe mesmo um comentário que li , feito a um dos diversos textos-notícias do "Rostos on line" sobre o "caso da estátua" (e que lamento não ter registado), que, dentro da dinâmica da luta de classes, o considerava como que uma traição à sua classe por parte do patrão que o praticasse, como se o modelo liberal e desumano da revolução industrial pudesse ser um modelo natural, que deveria rigorosamente definir uma das margens dessa fractura social - e assim "evitar-se-iam confusões", como dizia o comentador. É evidente que a segurança social, integrada nas medidas reformistas que reforçam o papel do Estado, surge para prover a tais coisas, mas falamos de tempos e locais em que a segurança social estava no campo dos futuros (a menos das medidas de Bismarck, que - "junker" e conservador - não era decididamente um convertido ao social e que antes até o tinha contrariado, mas que finalmente legislou sobre o assunto) e em que o movimento sindical era vigorosamente contrariado (ainda que a Igreja timidamente o defendesse). Daí a frase do "mau-mau", que acentua o contra-senso. Coisas da vida!
quinta-feira, 9 de outubro de 2008
Novamente, sobre Stinville...
“Procurando Auguste Lucien Stinville (1868-1949) - Uma Presença Francesa no Início das Fábricas da CUF no Barreiro”: Um exercício de resumo em 15 minutos... ”
[1. O problema]
Foi com surpresa que, no dobrar do século, se constatou quão pouco se conhecia entre nós sobre A. L. Stinville, o engenheiro-construtor francês contratado por Alfredo da Silva para a realização global das Fábricas da CUF no Barreiro. Dele conheciam-se:
- as menções nas actas do Conselho de Administração da CUF,
- a fotografia no álbum do cinquentenário da Fábrica,
- desenhos e planos que trazem evidente a assinatura técnica do seu Autor;
- a menção toponímica no Bairro Velho da CUF
- o álbum da construção e as fotografias de época que dizem muito sobre a obra e menos sobre Stinville; e
- as referências contidas na única biografia integral de Alfredo da Silva então disponível, da autoria do Professor Dias Miguel., e que, embora não publicada, corria em cópias e citações.
Pouco mais se sabia, já que nem o mistério das duas iniciais A.L. da sua assinatura estava minimamente esclarecido.
Surgia assim um desafio tentador, com um objectivo preciso, que era: conhecer melhor Stinville, através de uma nota biográfica que, mesmo sumária, correspondesse aos perfis descritivos normais para homens de ciência ou da técnica.
Procurou-se responder a este desafio com uma investigação iniciada e prosseguida em Portugal, que - com exagerado optimismo – se admitia ser simples e breve.
Não foi nem simples, nem breve - mas enriquecedora:
- Enriquecedora em termos de ensaio metodológico para uma investigação à distância, explorando a “net”;
- Enriquecedora em termos de melhor se entenderem, também neste caso, as motivações quanto ao processo de escolha de agentes para o acesso a tecnologias trans-fronteiras na transição dos séculos XIX e XX;
- Enriquecedora em termos da valiosa confluência com um registo exemplar de memórias familiares e dos diversos apoios individuais que, aqui e em França, se foram encontrando;
- E, finalmente, “the last but never the least”., enriquecedora em termos do conhecimento e da colaboração que se estabeleceu entre os dois co-autores e com outros familiares de Stinville, aliás alguns presentes – e que permitiu chegar ao que chegamos e, sobretudo, o podermos trazer aqui.
[2. A pesquisa efectuada]
Três actas de reuniões dos conselhos de administração da CUF elucidam quanto à aproximação entre os interesses do empreendedor Alfredo da Silva e a capacidade e experiência de Stinville – e que, todas de 1907, têm as datas de 29 de Maio, 6 de Junho e 14 de Junho. Ou seja, em apenas 15 dias o projecto das Fábricas do Barreiro passa de concepturo a nascituro.
Na primeira o decidido Director-Gerente pugna pela construção das fábricas de ácido sulfúrico e de adubos fosfatados no Barreiro. Diz mesmo “a união dos productores estrangeiros faz pressão sobre os revendedores — qualidade que esta Companhia hoje tem — por forma a ser para aquelles o maior lucro e para estes o menor." Compreende-se pois como era necessária a obtenção de uma engenharia independentes para “furar” a cartelização da oferta , presente na tal “união dos productores estrangeiros”.
Mas, nessa primeira reunião, que é conjunta dos dois Conselhos, Alfredo da Silva, muito à sua maneira, traz já sob o braço a proposta e as condições de Stinville para realizar o trabalho. É deliberado chamar Stinville a Lisboa, mas – com lusitano aviso – escreve-se que a Empresa só custeará as despesas de viagem..
Na segunda reunião da Administração, esta singular, entra em cena um inesperado personagem ao dar como possível a fixação da terceira e decisiva reunião“visto já ter chegado a carta do sr. Jorge Lefebvre em resposta à que o sr. Alfredo da Silva lhe escreveu". Conclui-se que Alfredo da Silva escreveu a Lefebvre, como preparação do importante assunto – e a resposta deste surge como decisiva para uma reunião também decisiva. Mas quem é Lefebvre?
Num terceiro acto, que é a terceira acta, de 14 de Junho de 1907, em reunião novamente conjunta, é deliberado aprovar o projecto e conferir a Alfredo da Silva “plenos poderes para concluir com o sr. Stinville ou com quem melhor entendesse, todas as negociações para o fornecimento de projecto e estudo para a nova fabrica e bem assim para fazer as compras de todo o material e machinismos necessários, visto a decisão unanime dos Conselhos ser no sentido de se proceder à construção da fabrica, sem perda de tempo.”
As subsequentes actas abundam em referências a Stinville mas, após a designação,em 1910, do director residente por aquele apontado, o Engenheiro francês Castera, e, sobretudo, após a eclosão da I Grande Guerra, vão-se sucessivamente diluindo quanto a essa referência pessoal – por razões que se sugerem na comunicação escrita.
A última acta em que o nome de Stinville figura é já de Maio de 1925, com Alfredo da Silva voluntariamente exilado desde 1922, para aprovar a instalação duma fritagem de cinzas de pirite, “d’acordo com o estudo feito pelo nosso Administrador-Gerente e pelo Engenheiro Consultor da Companhia, Snr. Stinville”.. Depois disso, silêncio!
Silêncio que perpassa sobre três factos relevantes, no relativo ao engenheiro-construtor francês:
- Dois relacionam-se com a Société des Usines Chimiques CUF, a SIC-CUF, em que participam Stinville, Alfredo da Silva, D. Manuel de Mello e a Sociedade Geral, uma empresa nascente Grupo: trata-se da constituição da sociedade de direito francês em 1925 e da sua liquidação em 1933, com entrega de activos à Sociedade Geral;
- O terceiro, que é o segundo cronológicamente e já posterior ao regresso de Alfredo da Silva, é a designação, em 1927, do primeiro director técnico português das Fábricas do Barreiro, Eng. Eduardo Bravo Madaíl, que formalmente substitui Stinville nesse posto.
Não nos vamos alongar aqui na sucessão de processos que caracterizou a investigação feita e que será dissecada no texto escrito.
No essencial dir-se-á que, como objectivo, se procurou provocar uma “saturação qualificada dos balcões abertos na net” para temas correlativos ao procurado – e que fosse credora de repercussão pelos diversos motores de procura.
E foi assim que, em Novembro de 2005, uma das filhas do Sr. Jean Yollant, Mlle Corinne Yollant, estabeleceu a ponte que permitiu seguidamente, analisando as notícia e documentos na posse dos Familiares de Stinville - e com breves consultas nos Archives de Paris- resolver a questão dentro do objectivo imediato inicialmente traçado.– já que muito mais há a considerar quanto a uma personalidade tão rica quanto foi Auguste Stinville.
[3. Auguste Lucien Stinville: um perfil]
Stinville nasce em Paris aos 19 de Julho de 1868 com o nome de Auguste Lucien Lamouche – mas, por razões familiares e como seu pai já havia feito, adopta mais tarde o patronímico de Stinville. (Primeira dificuldade esta, para um investigador distante.)
Concluindo com distinção o secundário, no Colégio Colbert, em Paris, e rejeitado num concurso à Escola Naval por causa da sua miopia, emprega-se de 1885 a 1887 nos “Laboratoires de Paris”, onde, por influência de um antigo professor, é apresentado à comunidade química parisiense. Deste “abrir de olhos” num campo que realizava uma vocação anterior não-marinheira, dirá mais tarde que “saiu-me então a sorte grande!”
Isento do serviço militar em 1888, parte para a Inglaterra (ou País de Gales), em cuja indústria química faz um duro e intenso adestramento. Terá igualmente praticado nas instalações fabris da sociedade Maletra, na região de Bordéus.
Em 1890, com 22 anos, regressa a França. Nesse mesmo ano a adubeira “Compagnie du Guano Phosphate”, a cujo conselho de administração preside Jules Lefebvre (nome já nosso conhecido, embora como “Jorge”), decide construir uma unidade em Honfleur, na Normandia, para produzir ácido sulfúrico e superfosfatos, e procura tecnologia independente para esse projecto. Stinville candidata-se e, uma vez adjudicada a obra, realiza-a de 1890 a 1892, com plena satisfação da cliente. Antes porém, Stinville, receando que a sua juventude pudesse comprometer a sua proposta, antecipa o seu nascimento de 4 anos, ou seja, para 1864 – data que ficará a usar para sempre…(e que foi outro escolho para o investigador).
Porque “em equipe vencedora se não deve mexer”, a “Guano Phosphate” confere a Stinville a construção duma segunda e importante fábrica de adubos fosfatados, agora em La Pallisse – La Rochelle, na costa atlântica da França. Os trabalhos decorrem de 1896 a 1901. Stinville prepara intensamente um cunhado, Jules Yollant, para seu assistente na supervisão da obra e para ser seu “segundo” como director técnico da instalação.
Entendendo, em 1902, que a direcção técnica de La Pallisse lhe limita o horizonte profissional, renuncia ao cargo e faz a sua primeira viagem aos Estados Unidos. Jules Yollant ascende a director técnico de La Pallisse até 1906 e então, por permuta com o titular de idêntica função em Honfleur (de nome Castera), vai assumir a direcção técnica daquela fábrica até ao fim de 1918. Castera manter-se-á em La Palisse até 1910 e reencontrá-lo-emos, como já referido,… no Barreiro.
Segue-se, de 1905 a 1910, um importante trabalho para a “Société d’Eclairage, Chauffage et Force Motrice” (uma precursora da “Gaz de France”). Visa a remodelação da rede de gás de cidade na região de Paris, com três instalações de produção e de distribuição (de Gennevilliers, Alfortville e Boulogne sur Seine), respectivos serviços e anexos, incluindo uma importante ligação ferroviária e a construção dum porto fluvial no Sena – experiências que certamente serão úteis para o que vai realizar no Barreiro.
Casa em 1906 e, em 1907, o jovem casal vai mudar para uma espaçosa casa que fez construir em Versailles. O seu primeiro escritório parisiense, próximo da sua residência enquanto ainda em Paris, muda para maiores instalações em 1908 e, com nova mudança já durante a I Grande Guerra, instala-se finalmente no nº 14 da rua de Chauveau-Lagarde, onde se manterá até ao termo da actividade profissional, na transição dos anos 30-40.. Enviúva em 1916, sem que o casal tenha tido descendência.
Em 1907 Alfredo da Silva chama-o a Portugal para a realização global das Fábricas do Barreiro. Das memórias sobre Stinville, que um seu sobrinho deixou, destaca-se a seguinte nota: «Muitas outras fábricas foram obra sua. Entre estas, um certo «da SILVA», importante homem português, encarregou-o de construir uma fábrica de adubos semelhante às francesas. Situou-a «em Bareiro [sic], frente a Lisboa» . As fábricas serão construídas de 1907 a 1909, iniciando-se logo uma ampliação, e Stinville, que se mantém em Paris, recebe o cargo de Director Técnico das mesmas, cargo que mantém até 1927 e que exercerá através dos engenheiros residentes Pellet, na construção, e Castera, na operação fabril, este a partir de 1910.
Tendo compreendido, nas suas deslocações à América, a importância futura dos processos de filtração electrostática dos gases, é “editor científico”, em 1918, duma brochura sobre o assunto e, em exclusivo, introduz em França as patentes Cotrell – Mohler, o que lhe garante um continuado trabalho de engenharia. Patenteia aperfeiçoamentos nos fornos de andares para queima de pirite.
Em 1925 , com Alfredo da Silva, D. Manuel de Mello e a Sociedade Geral, é accionista fundador da já referida SIC-CUF, sociedade comercial com sede em Paris. Em 1937 responde a várias questões técnicas levantadas por Alfredo da Silva sobre o “processo Basset” para a co-produção de lupas de gusa e de cimento em fornos rotativos, (processo que chegou a funcionar em Alhandra, em 1940) – mas desaconselha o Industrial portugês quanto a essa primeira tentativa siderúrgica. Em 1948, já retirado, corresponde-se ainda com técnicos da CUF, do Barreiro, com os quais mantém um diálogo especializado.
Morre em Paris, a 7 de Agosto de 1949, vítima de pneumonia, em casa de sua irmã mais nova. Adèle, junto de quem passara a habitar quando abandonou Versailles, alguns anos antes. O funeral teve lugar no dia seguinte, para o túmulo da “Família Stinville” no cemitério velho de Colombes, nos arredores de Paris. Tinha 81 anos… ou melhor, 85.
[4. Os franceses no Barreiro]
Caberia aqui mencionar, sob o título de “Os Franceses no Barreiro”, o importante papel de Stinville relativamente à selecção e colocação de pessoal expatriado em Portugal, desde engenheiros residentes até encarregados, mestres e operadores especializados franceses (e não só) para apoiar as instalações na sua marcha regular e colaborar na formação do pessoal português. Existem várias fontes quanto a essa presença, sugerindo um oportuno aprofundamento. Enumeraremos, na comunicação escrita, as principais pistas para um eventual desenvolvimento do tema – que vai da enumeração e conhecimento de pessoas e entidades a ele ligadas até à utilidade de uma acção de emergência que procurasse reter a terminologia de origem francesa de que ainda possa haver memória no linguajar fabril barreirense , como "malaxagem, lessivagem, fritagem, cuperdino, igréco, bombardear, pompar (ou pompear)" e outras, de idêntica evidência. e que ainda se diziam no início dos anos 60.
Dão-se alguns exemplos de documentos presentes nos arquivos da CUF:
[5. Alfredo da Silva em França: a SIC CUF]
Voltando-nos agora para Alfredo da Silva. É sabido como, mesmo quando voluntariamente exilado, não deixou jamais de manifestar o seu permanente entusiasmo pela realização de indústria.
Uma destas iniciativas, partilhada com Stinville, foi a já referida SIC-CUF, com sede em Paris, no escritório deste, constituída em 1925 e liquidada em 1933. O seu objecto social é um prodígio de latitude ao mencionar “Exploração de minas e pedreiras. Compra e venda de corpos simples e compostos” que mal deixa adivinhar o alegado propósito de produzir alumínio, recorrendo à energia eléctrica gerada a baixo custo em aproveitamentos pirenaicos.
Outra instalação industrial realizada por Alfredo da Silva, já não em França mas em Espanha, que inclusive recebeu uma visita do então monarca espanhol, Afonso XIII, foi a tão pouco referida Fábrica de Adubos de Sevilha, posteriormente vendida, e de que seria muito interessante dela saber mais.
[6. Lucien Yollant (1894-1983) e o mérito das memórias familiares ]
Grande parte do conhecimento obtido sobre Auguste Lucien Stinville deve-se ao seu sobrinho Lucien Yollant, filho de Lucie Lamouche, a irmã mais velha de Auguste Stinville e de Jules Yollant - o já referido cunhado que acompanhou Stinville na construção e que lhe sucedeu na direcção técnica da fábrica de la Palisse.
Nascido em 1894, a mudança familiar para a Normandia leva Lucien a estudar no liceu de Caen. Os seus estudos são bruscamente interrompidos pela mobilização consequente à eclosão da I Grande Guerra e só serão retomados após o armistício - licenciando-se em engenharia na Centrale e fazendo toda a sua carreira profissional nos caminhos de ferro.
De Lucien e em relação a Stinville há duas notas importantes a reter:
- A primeira diz respeito ao périplo inspectivo que, durante a I Grande Guerra, o ministro Loucheur confiou a Stinville. Com esta designação, foi-lhe dada a possibilidade de designar um secretário que o acompanhasse. Stinville escolhe o sobrinho – mas Lucien, apesar da grande admiração que sempre teve pelo tio e da oportunidade que lhe é dada, recusou a designação e preferiu prosseguir a luta ao lado dos seus camaradas das trincheiras.
- A segunda nota diz respeito ao registo e preservação das memórias familiares. Já reformado, Lucien Yollant organizou, até à sua morte (em 1983), as memórias, registos e documentos de seu pai e do “tio Auguste”, notas essas que estão guardadas por seu filho, Jean Yollant, com quem tenho a honra da co-autoraria desta comunicação. Esse laborioso trabalho, de registo e de inventário permitiu a feliz confluência de duas linhas de investigação saídas de locais diferentes, em tempos diferentes, mas que felizmente se encontraram, Muito do que se aqui rapidamente se referiu traz a marca desse excelente exemplo que poderá inspirar acções idênticas, nomeadamente aqui. Há sempre muito de ainda-não-contado que procura as palavras e que morre se ninguém lhas encontra.
[As 12 pequenas projecções em "power-point" que se pensava fossem projectadas "em rajada" e praticamente sem palavras no fim da exposição, para ilustrar o texto, acabaram por ser projectadas à medida que a exposição prosseguia, com o posicionamento supra indicado]
quarta-feira, 8 de outubro de 2008
Ao menos...uma boa noticia